29/03/2019

Estou vivendo ou

Será que estou vivendo ou apenas recarregando o celular todas as noites? Será que estou vivendo ou apenas dando os últimos grãos de ração pra Melissa antes de chavear as portas dos fundos de casa? Será que estou vivendo ou apenas roubando 1,6 segundo do motorista ao mostrar minha carteira estudantil do transporte de apoio da universidade, para estar apto a embarcar?

Será que estou vivendo ou apenas reaquecendo o almoço pra combinar com algo pra janta? Será que estou vivendo ou apenas trocando as músicas do celular de mês em mês pra caminhar as mesmas ruas?

Será que estou vivendo ou apenas contabilizando quanto de internet tenho e quanto mês falta? Será que estou vivendo ou apenas observando panoramicamente a quantidade de maluco que nos cerca e não se pergunta se está vivendo ou apenas...

Dois litros do mesmo suco cheio de corante pra consumir em até 3 dias e ninguém me acompanha e se eu tomar tudo deve até ser ruim pra saúde e se não tomar tudo, vai fora.
Típico dilema da vida entre se ferrar de um jeito ou de outro.

Será que estou vivendo ou apenas produzindo lixo? Separando os reciclados, ao menos. Será que estou vivendo ou ocupando lugar na fila, na poltrona ou em pé no corredor do ônibus? Será que estou vivendo ou só reparando nas pichações dos banheiros e das paredes externas dos prédios? Mas será que eu estou vivendo ou apenas lendo autores pra dizer que li, pra não lembrar mais do que um resumo bem detalhado possa trazer. Horas e horas compenetrado em leitura para o quê?

Será que estou vivendo ou somando horas em jogos online? Como me disse, um companheiro de curso em uma das voltas para casa, em que, criando coragem no assunto, revelou uma somatória de horas para cada vídeo game diferente que ele pratica no mundo virtual. Quantas horas frente à tela, ganhando ou perdendo? Ganhando ou perdendo no jogo e no tempo, na experiência, no estresse ou desestresse? Quanto vale tudo isso?

Será que estou vivendo ou somente somando decepções diariamente? Será que estou vivendo ou apenas desistindo antes de entrar nas filas? Será que estou vivendo ou apenas repetindo a pronúncia nas aulas de língua estrangeira? Será que estou vivendo ou apenas reparando nos rostos quando as nucas que estão à minha frente se cambiam defronte ou em ângulos quase de frente a mim? Será que estou vivendo ou virando os olhos quando enxergaria vida neles?

Será que estou vivendo ou apenas contando as moedas de xerox? Contando as moedas no raro tempo que me sobra a degustar a semanal cerveja? Contando que alguma vaga de emprego me surja para ser efetivado. Vivendo ou bicando de bico em bico para arrumar mais uns trocos para trocar por mais almoços-jantas, xerox e cerveja.

Será que estou vivendo ou apenas me preocupando com os gatos de rua, que, na minha visão nada empírica, se multiplicaram no fim da Gonçalves Chaves? Eu estou vivendo ou apenas questionando como seria a interrogação invertida no início e a interrogação final no meio das frases, assim como é no Espanhol. Estou vivendo ou tirando seu tempo em conversas informais e de assuntos aleatoriamente não selecionados previamente? Estou, nisso tudo, vivendo ou somente me questionando se viver é tudo isso? E será que é mais um pouco? Um texto sobre vivendo.

24/03/2019

perdi muito tempo

perdi muito tempo
agora acelero os processos
sei que o fogo às vezes é lento
nos manifestos desses decretos

mas entenda que perdi muito tempo
e não o compro de volta nessa venda
estava com os olhos vendados
e o tempo vendido cobra seu prazo

entenda que perdi muito tempo
e escrevo isso com naturalidade
porque acostumei meus dedos
com essa que é da poucas verdades

entenda que perdi meu tempo
como um cachorro a dar saudade
que saudade é difícil traduzir
em outras linguagens

perdi muito tempo
como um funcionário
a esperar aumento
de seu salário

perdi muito tempo
como um rosário
espera
os dedos a roçá-lo

perdi muito tempo
como um diabo
com o inferno aberto
e ninguém a visitá-lo

selos

verifique meus versos
veja e fique imersa
nesse universo
nessa conversa

chegue aqui mais perto
dentro da minha meta
sem ficar obsoleto
dessa ideia neta
de outras ideias

seu seio
me anseia
seu selo
sela
seu cabelo
me pela
pela pele
elo
meu
com ela
belo e quente
como cera de vela
serpente que atrela
pertencente
à nossa aquarela
vermelho escuro
amarela
luz do poste
da rua dela

domingos

acordei tarde. descobri que havia visita e não quis almoçar. fingi um pouco dormir e depois peguei o celular. e depois fingi dormir e depois peguei o celular. e as visitas não ficaram muito tempo. meio que notam sua ausência e depois esquecem e conversam alto e se empolgam e lembram de sua ausência e depois esquecem e conversam alto. e segui ali, pensei em ler, mas a cabeça ainda doía, aí penso que a leitura vai avançar como se fosse uma pedra se movimentando no rim e talvez eu tenha mais dificuldade de gravar as informações, o que torna a leitura ainda mais inútil, porque, pra quê ela serve se não armazenarmos? só para dizer que leu? não li. e, sim, minha memória piora, são meus péssimos hábitos noturnos. ponto ou interrogação? ponto, porque é uma afirmativa, são meus péssimos hábitos noturnos, sim.

esperei saírem e esperei mais uns minutos pra não ficar tão evidente meu desejo que saíssem e então saí do quarto. só voltei a mexer nos lençóis para ajeitá-los após a refeição. não senti vontade de me higienizar. um dos poucos amigos jogou na timeline um texto sobre a relação entre saúde mental e saúde bucal. faz sentido, eu devia ter percebido a relação havia algum tempo.

tive que aquecer o almoço que há tão pouco era uma refeição familiar. o arroz estava empedrado, ou seja como chamem, mas o pouco de água quente ajudou a esvair esse processo de solidificação excessiva. era arroz com massa, muita gente tem preconceito com arroz com massa, porque é muito, como que chamam? carboidratos. é, carboidratos. mas eu até como. aqueci tudo novamente, menos os bifes. se havia salada, não sobrou pra mim. normal. uma alface me deixaria 5 ou 6% mais feliz. não comi muito. achei que esperar até às 14 pra me levantar me daria fome, mas não deu. um outro cara de porto alegre coloca na timeline que está com vergonha do quanto emagreceu e nem consegue mais usar bermuda, outro fruto da doença aquela. aquela maldita, vitimiza gente muito boa. eu considero muito boa. nem é me juntar ao grupo, mas é uma espécie de consciência de que ela atinge muita gente inteligente, ou muito sensível, ou na somatória, aquela inteligência perspicaz, e é gente decepcionada, decepcionada com as demais, com o mundo em volta, com a incapacidade de mudar as coisas, quiçá sua própria vida, imagina o mundo, cara, moçambique, zimbábue, esses eu conhecia os nomes desde que explorei o mapa-múndi aos 5 anos, mas tem um terceiro, malawi, creio que é malawi. se não for, vai ficar assim, porque é a sinceridade de quem não pesquisou durante a elaboração disso aqui, sacas?

é minha mente trabalhando tal qual o desenho de um mapa em carbono, o mais fiel e fidedigno possível. enfim, não almocei muito, não tenho exatamente vergonha de usar bermuda, embora me incomode a quantidade de pelos e as pernas por vezes muito finas também. tirei uns pelos esses dias e o púbis segue coçando, já deveria ter passado a sensação pela minha experiência nisso. ainda uso a mesma espuma de barbear da adolescência. pensava que precisaria renovar e gastar com isso seguidamente, mas que nada, ela ainda está ali, ainda é cheirosa e resolve na hora de aparar a barba. quando a gente é jovem pensa muita coisa errada, falta a vivência e a malícia e hoje que tu adquire um pouco disso, adquire o que não devia também e segue fudido dos pensamentos.

não tenho problema em lavar a louça, tenho lavado seguido até, verdade pura. mas a cuba, a pia levantou um cheiro horrível. aquele detergente amarelo já não me agrada, mas hoje foi péssimo. e só precisava lavar o que sujei, porque o que eles sujaram já havia sido limpo e seco e guardado. mas foi uma péssima sensação, logo depois do almoço, que não foi grande coisa. almocei, mas terminei sem vontade e despejei um pouco do arroz que sobrou para o balde que alimentava nossas galinhas, mas elas morreram. só sobrou uma, a mais moribunda de outros tempos, que meu pai chegou a dar remédio e comida no bico e a bicha velha sobreviveu, de forma inacreditável mesmo. tá lá agora, manca e solitária, esperando a morte chegar. as pombas em volta, aqueles bichos malditos, comem tudo e parece que troçam depois. as pessoas são como as pombas, se juntam nas praças, fazem merda e cagam por sobre as outras se for o caso.

agora pude retornar os afazeres, mandei as poucas mensagens que precisava, preciso me readequar ao calendário acadêmico, enquanto escrevo isso, lembro que posso utilizar a carteira estudantil pra ganhar descontos, pra rever pombas e tentar desviar delas. assim a gente segue. meu celular estava com quase nenhuma bateria, mas agora está na tomada, carregando no mais pleno dos gerúndios, a barrinha subindo. e assim tento subir a minha barrinha de energia também. meu time tem desfalques, mas é bem superior, o céu está bem azul. vai ser um dia legal pra muita gente. bom domingo a todos e todas.

21/03/2019

Chicletes e cigarros

A morte me invita a um tango. Uma milonga estendida, que se desenrola como um comprido tapete vermelho. Um pouco mais escuro, um pouco mais bordô. Ela me convida como escassas vezes sou convidado. Me tira do canto daquele baile onde não danço. Me tira daquele balcão em que o barman só se demonstra gentil para comigo porque estou consumindo. Logo que ele pare de encher meu copo e eu, indiretamente, seus bolsos, ele vai zangar-se.

Mas a morte retira meu olhar daquela pista de dança tão próxima em metros e tão distante espiritualmente. Minha alma velha já não sente-se interessada em misturar-se a esses corpos jovens. A música de edições eletrônicas para o formato final, inicialmente inatingível para os cantores e cantoras e com sons possíveis somente pelo remix, essa música paira distante. Não me invade mais aos ouvidos, não estimula mais meu cérebro e tampouco me revolto por não acessá-la como os demais.

A morte me conduz pelo braço aos fundos do salão, ao pátio para os fumantes. Ela sempre tem os cigarros para dividir. Nunca a encontrarás sem que ela esteja com os bolsos internos equipados por diferentes marcas. Com um estilo e todo o charme que lhe é delegado, ela vai sacar o isqueiro e terminar de acender a chama entre vocês. Os cigarros vão se beijar antes de vocês. O dela já estará aceso sem que tenhas visto, enquanto estava no salão. O seu será aceso a partir do dela, que está semi-consumido.

Ela ignora os acontecimentos em volta e estabelece seu próprio ritmo, o mais arrastado e capturante que pensas e talvez nem possas imaginar. É preciso ser sensível para conhecê-la e muitos se vão dessa vida sem notá-la anteriormente. Para quem a ignora, ela pode até deixar o tempo passar, mas será vingadora e voraz quando lhe der na telha. Mas para nós, sensíveis, ela faz parte da trama. Ela te encontra em bares rústicos com portas de vai-e-vem, seja lá como se escreve isso. Ela te fita no meio de uma festa de musicalidade proporcionada por djs. Enquanto todos saltam com os braços para cima e deixam o corpo entrar em stand by enquanto as canções todas, em todas as caixas de som, te cercam dessa forma, lá está ela, mirando-te, olhos penetrantes.

Ela joga seu charme do jeito que aprendeu em milhares de episódios. Maquiagem caprichada, olhos negros, pele clara, cabelos negros, pupilas certeiras, pistoleira de uma só bala, que ela sabe ser suficiente para derrubá-lo. Ela sabe que é irresistível. Tem o capricho demoníaco de saber que pode fazer o que quiser. É a pior mulher de todas. É a melhor mulher de todas. Justamente por ser a melhor se torna a pior de todas, como não raramente.

Por ser a melhor ali contigo será a pior de todas quando não estiver. Você pensará nela finitas noites, enquanto ela permitir. O serviço que ela começou, ela mesma acaba. Vocês marcarão encontros e será divertido de início. Ela te fornecerá os vícios mais inconsequentes, você estará atiçado pelas mais simples e complexas armadilhas dela. Você vai ignorar seus amigos, porque quer estar junto dela. Você notará aos poucos que se encontra com ela sempre de noite. Talvez em uma ou outra tarde ela surja, como uma adolescente rebelde próxima das escolas, mas nunca em aula. Ela não assiste às aulas, ela te espera nos corredores ou na fila do ônibus. Ela masca chiclete com facilidade e faz bolas grandes que logo estouram, que logo explodem como o relacionamento.

Você desconfia que ela te trai. Mas é verdade que ela tem muitos trabalhos por aí. Você não gosta das roupas negras e depressivas que ela utiliza, mas você não consegue se livrar dela. Ela sempre sabe o que fazer e sempre faz o que quer. Você não sabe o que fazer e nem faz o que quer.

Por vezes você quer se livrar dela, mas não há mais como. Chegará a hora em que ela te mastigou tanto tempo como um chiclete que perde o gosto, e será tarde demais. Você, ou o seu coração, será o chiclete que ela vai descartar. Pode ser prudente e descartá-lo a um lugar discreto, uma lixeira próxima, ou pode deixar ali à exposição, embaixo de uma classe, no chão, ou em qualquer lugar não propício ao descarte.

Vai chegar a hora em que você percebe que não consegue se livrar dela, perseguidora, obsessiva. Ela vai se livrar de você. É o papel dela antes de se arrumar novamente, sorrir maliciosamente ao espelho, com seu piercing no smiley (ela nunca te ensinou o nome certo disso), o sorriso mais diabólico e inquisidor da história. E ela vai repeti-lo, sádica e criminosa. Você era o chiclete, mas está tão sem gosto que deve ser um restolho de nicotina. Apagado e pisoteado nos fundos de uma festa com isolante acústico. E ninguém ouve seu último suspiro.

hasta cuando

se escondendo da morte
logo ela vem
lá vem ela no bote

se escondendo do azar
mas que sorte!
outra vez não me viu
e a noite vai passar

até quando?
até quando ela deixar
deixar pra lá deixando

08/03/2019

surtos

O surto é uma bomba relógio
Se for só um susto é um privilégio
Se der em nada demais

O cuco é aquele relógio de parede
Com sede ele sai na hora programada
Enquanto o surto é surpreendente
Pode vir do nada

O surto é um curto circuito
De uma tomada congestionada
Pode ser um surto veloz
E depois sobrar nada

O surto é um episódio
Marcante em quem ouve e quem tem
O surto é uma bomba relógio
Qualquer hora refém


acordes

desculpa por ter roubado
os seus acordes
por ter iniciado sem saber
se pode

desculpa por ter roubado
as suas noites
por ter iniciado sem saber
que fode

a mente que um dia foi
o teu suporte
a gente que um dia foi
uma estrada pro norte

boa sorte

05/03/2019

Palafitas Paliativas

Espero que tu seja feliz
Não sei o que isso significa
Espero que feche essa cicatriz
Sempre lembro onde fica
Dos tempos que tu era minha atriz
Era a mais bonita
Dos tempos que tu era tudo que eu quis
Dessa era infinita

Meus versos eram o seu chamariz
E o silêncio hoje grita
Sentimentos gozam como um chafariz
Que inunda minhas palafitas

04/03/2019

Melissa tá mais alaranjada

Melissa me olha
Mia alto para mim
Não sei o que ela fala
Acho que é melhor assim

Melissa tá mais laranja
Tá igual ao governo
Mas o pelo dela é massa
E aqueles cornos usam terno

Melissa é subversiva
Minha gata comunista
Ela caça rato e quer
Nos dividir a comida

Melissa é minha gata
Caça rato e caça rata
Acho que ela não distingue
O gênero da sua caça

Melissa tem medo
De yorkshire e de vassoura
Mas Melissa não é caça
Melissa é caçadora

Melissa é educada
Ela não caga no quintal
Ela sai aos domingos
Pra dar banda no Areal

03/03/2019

A vida é uma toalha estendida no varal

A vida é uma toalha estendida no varal
A vida é uma navalha que não corta só o mal
A vida é uma tralha no sistema nervoso central
A vida é uma batalha do começo até o final
A vida é uma calha que inunda o quintal
A vida é uma canalha num boteco filosofal
A vida é uma falha inevitável e vital


Inspirada em
Wander Wildner - A vida é uma toalha estendida no varal

10/12/2018

Pablo Neruda

Pablo Neruda 
Muda o jogo 
Tudo muda Neruda 
Leio mudo
Imagino o som da murga
No ouvido que não ouve
Ou no olvido de uma memória surda
Pablo Neruda 
Poeta chileno 
Lleno de semillas e mudas

Compito

Compito 
Com ou sem pito
Competência com ou sem petulância 
Competir 
Com petit versinhos 
Conversar com verso 
Concorrer corando 
Andando ou parado
Num ponto do universo 

07/2018

Parnasiano

Parnasiano 
Teu par marciano 
De outro planeta 
De outro poeta veio o invento
Que eu tento modificar 
Reinvento acento, verbo e complemento
Não aceito acabar insatisfeito
Nesse jogo sobrevivente
Aos austeros tempos

Te

Obrigado em cada verso que inspiraste
Em cada frase que indiretamente escreveste 
Em cada roupa, cada soma, cada poema que vestiste
Em cada adjetivo que estiveste 
Em cada vestíbulo povoaste 
Em cada vestibular meu passaste
A cada "basta" meu, caçaste-me
A cada taça de vinho, caçoaste
Do caminho até aqui, não mais te
O oblíquo para usar: te
Não mais te
Não mais instigar 
Não mais mastigar 
Não mais te
Te não 
Te são... passado

30/08/2018

inédito

inédito é o que escrevo
talvez patético
cético, manicômio magnético
mas cabe um crédito
pelo quê? por ser inédito

entrelaços

escrevi este verso
de outros versos
no lado inverso
contaminando outro universo
escrevi este disperso
de outros apreços
contaminando estes versos
em que apareço
fazendo um entrelaço
entre dois começos

007

julho, mês de número sete
ouça o barulho da mente
antes do sete virar oito
antes da gente se conhecer
era outro ritmo, som e até cores
outros timbres, nuances, holofotes
refletores
batimentos, sofrimentos, resplendores
eram outros
éramos outros
erramos outros
eram outros pores e repores do sol
eram outros navios a vapores e farol
eram outros contra e outros prol
éramos outros
antes de sermos um só

insônias

se te perguntavas
ser a insônia de alguém
não te perguntes mais
não que sejas a minha
mas quando estou com a insônia
me fazes companhia

constelação

na constelação de tuas costelas
o mundo se desenha
as mais perfeitas tels, perfeição
missão que me venha as veias

na constelação de tuas costelas
sou astrounauta
falta oxigênio, me falta
nas verdadeiras estrelas

na constelação de tuas costelas
o verdadeiro ouro do planeta
que se esfrega ao couro da pele
nesse prazer por horas tê-las

Idiota

Faço coisas idiotas
Sabendo que elas são
Assim sou mais ou menos idiota?

Todo mundo o tempo todo

Prometi, ao publicar o volume 1, um volume 2 sobre coisas, eventos, atividades extremamente importantes a nosotros, sejam comemorações ou rituais fúnebres, e que são ignorados pelo restante da população.
Outro pensamento formulado é sobre o distanciamento que as cidades provocam. As cidades grandes. É só tentar associar aos funerais indígenas e como as aldeias entram em estado de luto e de respeito, ou mesmo de choque para os próximos da vítima. Situação não vivenciada nas anônimas ocorrências do cotidiano dos maiores centros. Mal conhecemos nossos vizinhos, novos comerciantes de nossas zonas, pessoas de nosso bairro. Apartamentos ocultam e guardam as mais diferentes e inexploradas personalidades. Talvez apenas notamos, se é que notamos, a ausência após longos períodos, para aí sim descobrir que Fulano se mudou de endereço ou Ciclano faleceu de alguma causa desconhecida.

Percorro aqui a continuidade de episódios que ilustram o desconhecimento ou a ignorância (de não ligar, ignorar no modo mais grosseiro da palavra!) dos acontecimentos que muito significam a nós. Após a relatada conquista do Farroupilha e o exemplo do cemitério, que inclusive fica nas proximidades da sede do clube, vamos a outros exemplos: formaturas.

Na cidade interiorana que habito, é bem possível que os transeuntes ou motoristas espiem para o Theatro que recebe muitas das cerimônias. Apontar o nariz e procurar por conhecidos nas togas e capelos é quase uma obrigação. Procurar ao menos distinguir qual o curso que está recebendo novos profissionais em solene noite de completude.

Porém, ao depararmos com esse exemplo de formatura em capitais, o panorama pode ser outro. A preparação em tal dia especial começa muito cedo. Para as e os necessitadas(os) de mais tempo de preparação, escolhas de look, definição de esmaltes, maquiagens, penteados com tamanha antecedência. Dias ou até meses antes para diminuir a sempre presente margem de erro. Uma formatura tem lá seu preço e o investimento precisa colher de retorno na data da festividade. As parcelas que servem para decoração, produtora, fotografias, coquetéis e as mais diversas imagens querem uma exigente troca, uma recompensa no estimado dia que chega. Parece distante à certa altura do calendário, porém sempre se apresenta.

Quando a data entra no holofote do X da questão, não só o formando vai estar preparando-se para momento importante de sua passagem vital, mas os familiares e amigos também arrumam seus visuais, procurando aquela caixa de sapato que estava ao fundo do guarda-roupas ou conferindo se o vestido de festa de aniversário ainda está digno de novo uso. Consulta de preços para maquiagem ou a desistência do trabalho de terceiros para dedicar uma hora em casa nessa atividade.

As pessoas se dirigem rumo ao local do evento, que, como citado acima, pode ser distante em cidades maiores. E este é um dia que leva a cabeça a pensar em tantas coisas podendo gerar uma virtuosa introspecção, situação a qual eu mesmo me propus a quebrar o gelo, como se diz na linguagem popular. E assim acionei mais vozes a serem escutadas no carro enquanto nos aproximávamos da cerimônia. Um bom passatempo para esquecer minhas mãos que suam constantemente ao contato do tecido dos ternos e que me fazem utilizar quantidades (quanto mais melhor!) de lenços de papel e de algodão. 100% algodão sempre que possível.

Eis que a viagem, demorada que foi, também fala muito sobre talvez o principal aspecto que me deixa reflexivo sobre essas situações de oásis ou trevas de luto em meio ao caos alrededor. Cada nave ocupada por motoristas com ou sem tripulantes tem uma história diferente, um ponto de vista distinto e uma opinião diversificada a respeito do dia. Pode ser só mais um sábado qualquer - como o nome daquele site de tirinhas. Pode se tratar de um sábado difícil pelas dívidas, aluguel atrasado, problemas com um carro recém batido, com uma pensão não paga, com um relacionamento descarrilando, com um parente próximo enfermo. Ou pode ser o grande sábado de uma formatura aguardada faz anos. Mas entre veículos que aqui dobram ou ali seguem, não fazemos ideia de quem ocupa os bancos ao lado. Abastecido da leitura de Medo e Confiança na Cidade do polonês Zygmunt Bauman, faz mais sentido entendermos o desconhecimento e a ignorância que temos em relação aos ocupantes próximos. Não sabemos com quem pegamos ônibus, trens e trânsito em geral. Perdemos oportunidades de contatos que possam ser importantes, mas nos sentimos protegidos de potenciais agressores, maníacos, dependentes químicos e outras formas de sentir-nos ameaçados.

Assim como nada sabemos dos outros Fox, Hyundai, Gol, Peugeot, Mercedes, Fiat, nada sabem de nossa expectativa pela formatura. Beira-nos a dúvida também outra possibilidade. Caso soubessem da importância referente ao dia, dariam passagem, estimariam bom proveito, presenteariam com mensagens de incentivo? Ou apenas diriam e eu com isso, tenho nada que ver, tenho meus próprios problemas, tô com mais pressa que vocês.

Enfim, em meio a encontros e desencontros citadinos, pessoas mais ou menos gentis, em dias mais prazerosos ou penosos, concluem-se essas missões repletas de cláusulas, barreiras, infortúnios, imprevistos, desvios e diferenças no que se pensa e no que se faz.

Continuamos caminhando anonimamente, cumprindo apostas de caminhar 20 quilômetros, rodando em carros fabricados pós-2011 como motoristas de uber, recebendo e cruzando por trabalhadores e desempregados, mães, pais, filhos e filhas, eleitores de esquerda ou de direita, pugilistas de nossas próprias e desconhecidas batalhas. Como em canção interpretada por Ney Matogrosso, todo mundo o tempo todo - mas sem você ver.

24/08/2018

algures

Povoados, aldeias, comunidades, organizações. O interior e a falta de conectividade, de ligação com o mundo estrangeiro. Estrangeiro no sentido de ser exterior a essas comunidades, não necessariamente de outro país. Quanto mais isolados esses povoados, maiores fenômenos como a xenofobia: aversão, medo, pânico, ansiedade, dúvida, desconcerto em relação ao que é de fora.

Numa dessas viagens, num desses passeios pelo interior brasileiro, encontramos ao Sul uma cidade com essas características logo de entrada. Por mais que cocem os dedos para revelar a localização, dar nomes aos bois, como diz o ditado, manteremos em sigilo. Vistam a carapuça as cidades assim assimiladas por seus moradores ou visitadores.

As entradas desses locais são muito enfeitadas, a grama cortada e, se possível, cheirando à grama cortada - sempre. Pórticos de bem-vindo na escritura de um lado e de volte sempre nos dizeres do outro. Flores, como se as tulipas holandesas nem pudessem competir com tamanha harmonia e animosidade. Não há no mundo formação mais mimosa.

Avenidas de entrada muito convidativas, rótula de acesso com o nome da cidade em letras em pedra. Mais algum monumento, de toda a preferência, que seja marcante aos olhos para o visitador informar a seus parentes, aos colegas de trabalho ou enquanto corta o cabelo em um salão ou barbearia.

Ali estão os pequenos estabelecimentos bem cuidados, tintura em dia, organização nas vitrines e vendedores atenciosos à espera de uma calorosa entrada de potenciais clientes. Pelas rotas principais que ligam ao centro - rapidamente, em menos de dois minutos pelo tamanho da localidade -, uma carreata ajuda na recepção. É uma carreata da saúde, mas em nada surpreenderia se o personagem apelidado de Zé Gotinha fosse, na verdade, um usuário do capuz da Ku Klux Klan.

As suspeitas aumentam-se com uma marcha para Jesus, logo na sequência. Grupo de jovens, comuns nas igrejas pelo interior, vestidos prioritariamente de branco. Violão nas mãos de uns e cânticos para louvar logo pela manhã. Abordagens em alguns estabelecimentos e transeuntes, dos quais faço questão de me certificar ao outro lado da calçada. Nada contra essa devoção e diálogos sobre o tema, mas não queria atrapalhar minha ligeira rota turística. Veja bem, não tinha muito tempo para visitar a arquitetura e opções do lugar e as passeatas joviais das igrejas são comuns país a dentro, país a fora ou afora, nunca sei a grafia nessa horas.

Exemplos para se sentir estranhamente acolhido num povoado de limpeza nas ruas, jardins organizados, sombras de árvores, monumentos conservados, mesas distribuídas em frente a um café, lojas com vendedores dispostos e trânsito pacato. Ao mesmo tempo, a dificuldade comum a muitos para sentir a noção do pertencimento. Qualquer estrangeiro ali deve ser notado, questionado, indagado, mesmo que seja apenas através de olhares atravessados, inquisidores talvez.

Por trás de uma manhã ensolarada e cumprimentos de senhores aposentados, quanto preconceito e aversão a estrangeiros podem estar escondidos? Necessitaria de mais tempo no local, passar no concurso público de repente, para uma maior noção dos acontecimentos. A intolerância, palavra que me fugiu ao início do texto, mas está devidamente agora pescada e resgatada ao bote, a intolerância é um dos padrões naturalizados nessas comunidades. São muito amáveis e respeitosos com quem os ajuda, mas vá saber a ira e o ódio que os desperta gente com qualquer intuito de escorar-se ou prejudicar-lhes no fim das contas.

Muitos ali, a maioria dos componentes da cidade, são descendentes de italianos ou alemães. Se os mais velhos não são diretamente desses países, ao menos filhos e netos dos europeus estão presentes. Como esses imigrantes ou descendentes de imigrantes do passado tratam aos imigrantes do presente? Haitianos, senegaleses, angolanos e de outros países, representando outras etnias. Questionamentos.

Na saída, após fotos com relógios no centro, uma fonte que espirra água longe e mais algumas bonitas arquiteturas bem desenhas e devidamente distribuídas, me deparo com outro aviso. Outdoors do pior candidato à presidência. Estes sinalizadores na estrada estando intactos, sem sofrer represálias de pessoas mais conscientizadas. Sem sofrer ataques de quem sabe o mal que ele representa, que pode atingir a diferentes culturas, a diferentes pessoas. Mais uma vez escancara-se o problema das comunidades, das organizações muito fechadas. Desconhecedoras das origens, dos lados de outrem, dos problemas sociais e suas causas país adentro ou afora ou à fora. Identifico essas potenciais xenofobias, mas sigo desconhecendo essa grafia.

22/08/2018

mais um pouco sobre shoppings

Shopping Center não aparece pela primeira vez como assunto de texto aqui. Até vou procurar, ao finalizar este texto, se o shopping está presente nas hashtags de meu histórico. Relembrando as aventuras e peripécias da última viagem realizada, mais uma vez um ponto 'seguro' para realizar refeições e compras foi um centro das compras.

Isso havia acontecido em excursões passadas durante minha graduação. Joinville, Curitiba e Rio de Janeiro nos destinos. Acredito que o de Criciúma tenha nascido a partir de uma rede de supermercados, que foi se moldando para ocupar as necessidades humanas modernas e urbanas. Academia, pet shop, fast foods nos cardápios aos sentidos.

Shopping tem a ver com padronização, conforto, comodidade e facilidade. O modus operandi sendo comum em todas essas cidades e em quase todas as cidades do mundo que contam com eles. A cultura ocidental suprimida, repetida, dividida como se estivesse em cápsulas para o consumo. Lojas semelhantes, restaurantes semelhantes, banheiros que lavam e secam suas mãos de forma automática e facilitam o acerto no lixo no arremesso final do papel higiênico.

Existe o lado duplo dos avanços tecnológicos. O incluir e facilitar e acomodar aos mais jovens pode se misturar ao excluir os mais velhos. Mas meus familiares mais antiquados e desacostumados conseguiram jantar com um pouco de compreensão dos atendentes. Aliás, consegui ser atendido de péssimo modo na noite seguinte, quando a atendente demonstrava insatisfação com seu trabalho, ou seria com os clientes? Espero que nada pessoal contra a minha pessoa.

Pois bem, eis outra contradição desses avanços tecnológicos. Atendentes podem ser mais pacientes e explicativos com públicos mais velhos, mas realmente esperam que todos os jovens, seja lá de que interior vieram, saibam manusear as tecnologias, os aplicativos, as ordens e regras. Qualquer comportamento anormal quanto a isso causa estranhamento. Se você tiver menos de 45 anos. Ou seja lá qual idade você queira delimitar para esse tópico, mas espero que tenha entendido.

O elogio que tenho ao centro das compras de Criciúma é mera coincidência, um erro, um equívoco, ou simplesmente um acerto em cheio aos meus gostos. Por ser grande demais ao público que se apresentou, preferi os atendimentos feitos nesse shopping. Estacionamento fácil, com várias vagas disponíveis, literalmente vagas. Sem congestionamento nas lojas ou na hora de pedir comida. Ou mesmo nas filas do supermercado. Ou, a mais elogiável, várias e várias e várias mesas vagas para aproveitar o lanche, o almoço, a refeição, enfim. Comer com apenas a música ambiente e quase nenhum burburinho, quase nenhum barulho de motor, de tão indecifráveis as conversas que se somam até me esgotarem a resistência. Foram refeições tranquilas.

Foi uma passagem por shopping muito menos dolorosa do que em outras oportunidades. Consegui visualizar e trocar palavras para as responsáveis pela limpeza das bandejas. Consegui trocar comunicação com uma vendedora atenciosa. Consegui ser atendido sem o sentimento de estar atrapalhando aos subsequentes da fila. E tudo isso, sobre shoppings, não é pouca coisa.

21/08/2018

combina

essa aleatoriedade
combina contigo
porque tu não combina
com o mundo

essa insanidade
seria um abrigo
por que não seria
abrigo de tudo?

15/08/2018

estava ali o tempo todo só você não viu

Entalado aquele texto que não escrevo, mas jamais enlatado. Liberto de minhas próprias jaulas, ponho-me a escrevê-lo. Duas ocasiões, mesmo mês e os ingredientes dessas linhas postos diante de mim. Missão dada é missão cumprida era um dito do Coronel Ewaldo Poeta, ex-presidente e eterno presidente do Grêmio Atlético Farroupilha, falecido aos mais de 90 anos em aproximadamente meia vida dedicada ao clube fragatense.

É do Fragata que vem a primeira exemplificação do que pretendo aqui. O Farroupilha subiu da mais baixa das divisões do futebol profissional gaúcho ao eliminar o Guarany da cidade de Bagé na fase semifinal, na soma de empates e na sorte e competência, competência e sorte de marcar o chamado gol qualificado, que é o feito fora de sua casa. Na volta, ao atingir o objetivo da heroica e histórica classificação, os guerreiros, juntamente com a comissão técnica e com quem, como num instrumento musical afinado, literalmente toca futebol naquelas bandas da cidade, tiveram o acesso em tremenda festa deles registrada sobre o empréstimo de um caminhão do Corpo de Bombeiros.

Animados e registrando o máximo possível desse sublime momento, os jogadores e membros da comissão transitaram pelas ruas da cidade, saindo da sede em estádio do clube tricolor pelas ruas mais centrais pelotenses. Tudo me parecia um pouco estranho, mas não sabia exatamente apontar o porquê. Eis que um comentário noturno em rede social, marcando a postagem sobre a comemoração me abriu aos olhos. A verdade é que a comemoração era muito mais dos atletas e dos participantes ativos da conquista do que da cidade. Embora buscamos incansavelmente a imagem de que o Farroupilha é o mais querido do município, situações das mais diversas ao cotidiano fizeram com que motoristas, pedestres e demais ocupantes das vias nem entendessem do que se tratava o evento, a carreata (que contou, sim, com alguns carros a seguí-los).

Por algumas fotos, foi possível ver ao redor um cenário inerte à importante conquista, a mais importante da maioria dos componentes do grupo dos tricolores. Carros que se sentiam presos em um trânsito já naturalmente caótico, pedestres de observações instantaneamente curiosas, por serem surpreendidos ou pela própria curiosidade ter morrido tão depressa quanto nasceu em brotáveis interrogações.

Detalhes talvez muito corriqueiros, que espero tenham passado batido pelos próprios celebradores. Mereciam e merecem grande reconhecimento e aclamação. Uma parcela limitada de torcedores apaixonados e ovacionais ao clube Farroupilha, alguns admiradores do futebol local e mais outros rapidamente inteirados ou saudosos de outros tempos mais gloriosos à instituição quase centenária da Avenida Duque de Caxias, Fragata. Estes estiveram juntos aplaudindo, incentivando e, com nada muito ensaiado, talvez cantando ao acompanhar o histórico e lendário torcedor Trem, no alto de seus mais de 70 anos apaixonados pelo Tricolor. Porém, os demais cidadãos, a esmagadora e ampla maioria nada ligavam e seguiam sua rotinas normalmente. Se nem no próprio Fragata o Farroupilha é unanimidade ou mesmo maioria, pouco sobra de prestígio às áreas mais centrais ou afastadas daquele reduto. Poderia ser uma celebração saborosa e partilhada.

Seria a logística, como um todo, uma escolha correta pelos planos de fundo pouco inerentes e predominantemente desconexos ao contexto? Será que a confusão de uma segunda-feira à tarde no trânsito complicou a programação? Ganhariam maior destaque e reconhecimento num fim de semana, atrapalhando menos vidas aceleradamente urbanas? Questões desse primeiro exemplo que espero tenham entendido.

Recapitulando a ideia central dessa descrição, considero digno de mágoas grandes conquistas pouco importadas e acolhidas pelos demais em volta. Outro ligeiro e rasteiro exemplo seria o respeito não apropriado ao luto alheio. Na mesma Avenida Duque de Caxias decorre a existência do maior cemitério local. Quantas vezes passamos ali em frente com N outros motivos e vemos pessoas debulhadas no mais profundo luto? Elas tendo que conviver com a passagem externa de pessoas tocando normalmente suas vidas. Vendedores de flores mais acostumados logo defronte aos portões de entrada, ok. Mas pessoas pegando o ônibus como fazem diariamente. Vendedores de lotéricas, carros, armazéns, farmácias e os demais comércios em volta no mais normal funcionamento. Até uma sorveteria - vejam só - abriu quase ao lado do cemitério. Toda oportunidade é capturada em busca da sobrevivência e dos lucros. Dos lucros para a sobrevivência, vejam bem.

Me estendendo sobre essa nem tão breve explicação sobre as ignorâncias - no ato de ignorar! - do dia a dia, sejam as mais brilhantes conquistas ou os mais pesarosos lutos, me despeço por ora nessa introdução. Vou reservar o outro exemplo ao outro texto, de acordo? Bom, apesar de tudo que foi listado, entendo que não há como estarmos a par de todos esses acontecimentos. Constantemente navegam críticas nos mares das redes sociais e do boca a boca no dia a dia sobre como ignoramos a ciência, as conquistas da física, da matemática, da química ou grandes literários. Tudo isso é verdade, ignoramos mesmo, ignorantes que somos por não conhecer, não nos interessar ou mesmo simplesmente não saber e não buscarmos saber. Erramos nós e erramos a mídia.

Curioso fato se desenrolou a partir de uma postagem falsa com atores do cinema pornográfico interpretando na manchete e no breve texto a estudantes brasileiros vencedores de prêmios internacionalmente aceitos. Muitos compartilharam sem saber que se tratava de uma notícia mais falsa do que nota de três pila. Acontece. Paladinos e justiceiros, como os defensores audaciosos do futebol no âmbito feminino em período de grandes disputas masculinas, como finais nacionais, europeias ou de copas mundiais. Eles também são pegos de surpresa compartilhando informações falsas a respeito de salários, de conquistas da seleção brasileira feminina ou outras tratativas mal averiguadas, mal apuradas ou de caráter negativo pela disseminação de informações falsas.

Ponto. Nova folha.

encolhas e escolhas

encolho-me de frio, de vergonha, de surdez para ouvir os mais baixos do que eu, falando-me ao pé do ouvido. encolho-me de pura e insensata má postura. e má postura gerada por frio, vergonha, timidez ou surdez.

encolho-me em pensamentos de imaginar-me velho, idoso, mais encolhido do que nunca. e lembrando e rememorando o que eram duras tarefas que aos poucos ganham status de apenas conselhos amorosos e repletos de ternura, numa verdadeira transformação metamorfose.

- escova os dentes
- pratica exercício
- sai um pouco desse computador, vai te fazer mal pra vista
- ajeita essa postura

e a vida naquele jogo de encararmos óticas diferentes para cada momento. o que parecia um grande esforço, um grande desafio e uma provocação brutal e árdua contra a alojada preguiça, agora se transforma em lamentos, em orações carregadas de início da subordinação "se". se fosse daquele jeito que sabíamos ser correto, hoje seria de outra forma.

invernos que passam e novamente encolho-me, mais do que nunca. de frio, de vergonha, de timidez, de reflexão, de surdez para ouvir minha própria voz. sentindo a falta daqueles mais torturantes conselhos de ocasião, os quais não tenho mais, não posso mais ouvi-los fora de minha mente, por mais que eu me encolha para ouvir os mais baixos ou me estique para ouvir os mais altos.

13/08/2018

escritório

no escritório
se esquivavam ideias cheias de vontade
de terem asas e serem sonhos

no escritório
haviam números, gráficos e polinômios

no escritório tudo se traía
principalmente sonhos
como somos
e também hormônios

no escritório tudo se submetia
a números, gráficos e polinômios

se eu já disse
saiba que se repetia

todo dia
todo dia

tudo se subtraía

no escritório
contrário à poesia
a poesia se contraía
não se elegia
sem ter quórum
nesse forum
dos que não foram
do que seria

vaga leme

vaga
vaga leme
gira gira gira
geme geme geme
fecha a escotilha
e volta nossa fênix

vaga
vaga lume
noite noite noite
surge surge surge
vaga mente
urge urge urge

08/08/2018

saltemos

sumir
sou mar
estou aqui
e também lá
venci
vem cá
águas prontas
para te curar

vem a
doçar
vem a
dançar
mesmo que o sal
nunca vá se acabar

06/08/2018

Malgi Mágica

Começo esse registro ainda no domingo referente ao evento. Mas o concluo na segunda-feira seguinte. De forma especial, a equipe local de futsal, a Malgi se tornou campeã gaúcha pela primeira vez. Uma conquista inédita para a cidade no futebol de salão feminino. Um projeto de dez anos com vários parceiros, com começos e fins, mas a persistência falando mais alto. Ecoando pelos quatro ou mais cantos do estado. Adversárias da região metropolitana, extremo norte, centro gaúcho, Rodeio Bonito, Cruz Alta, Uruguaiana. Enfim, dessa vez ninguém foi páreo para o futsal pelotense. Uma conquista que muito orgulha em saber que a região ainda revela talentos e capta e acolhe bem aos talentos de fora. Assim desejamos.

De ano para cá, entendo cada vez mais a importância e subsistência dependente dos patrocinadores. Com cada nome lembrado e agradecido, a Malgi Futsal chegou lá. Após uma primeira fase invicta, vencendo pela primeira vez na sua (nem tão, hein) recente história o bom e tradicional time de Uruguaiana na fronteira oeste, a Malgi passou pelas adversárias do Figueira na semifinal com duas goleadas. Prontas para voos maiores, a decisão colocou de novo frente a frente as pelotenses e as uruguaianenses.

O jogo de ida saiu do habitual e terminou em placar final de 7 a 1. Simbólico e desagradável. Irreversível na primeira olhada. Mas o jogo da volta resolveria essa situação. A Malgi buscava seu primeiro título, enquanto a Celemaster de Uruguaiana tinha estrelas bordadas na camisa. Mas o belo uniforme predominantemente verde das pelotenses queria ostentar o estrelado no lábaro.

De pênaltis, nasceram os três primeiros gols na tarde de domingo (05/8) no ginásio do Paulista, tradicional clube rubro-negro do que se convencionou chamar zona norte da cidade de Pelotas, embora esteja situado num cruzamento que para alguns seria Centro, outros Cohabpel e outros Três Vendas, nas proximidades da chamada Curva da Morte.

Voltando da localização geográfica, os pênaltis. Cota foi a batedora oficial. A experiente jogadora cobrou os dois para a Malgi. O segundo para recolocar a vantagem no placar em 2 a 1. Duda, a que mais correu em quadra, se esforçou, batalhou, perdeu muitas no ataque, mas ganhou quase tudo na defesa, aproveitou um escanteio e fez 3 a 1. Detalhe que o escanteio foi cedido pela goleira adversária, que espalmou um chute forte, mas que iria para fora. Falei com meus botões que poderia ser bem aproveitada essa rara oportunidade. E assim foi.

O panorama da partida era de muita pressão das uruguaianenses. Imprimiam mais velocidade, mais jogadas combinadas. A goleira Dani desde o primeiro tempo segurava-se para sagrar-se a melhor em quadra na decisão. Defesas de todas as formas. A competência, o treino, o reflexo, a sorte nas quatro letras de Dani.

Uma dividida não ganha, uma bola que sobrou melhor na área e a Celemaster voltou ao jogo reduzindo o placar para 3 a 2. Assim zerou o cronômetro do primeiro tempo. A etapa final seria de uma demora tremenda. O relógio não caminhava. A pressão era enorme. A Malgi precisava da vitória no tempo normal para levar para prorrogação. Com unhas e dentes e bicos e todo tipo de doação na marcação, as alviverdes se fechavam na defesa. Dani seguia sua tônica no jogo. Maurício arrumou a Malgi em um esquema de 3-1 (só uma jogadora na frente) para defender o 3-2 no placar.

Evelyn era um raio de sol na quadra, cortando como um saibro de luz a marcação das adversárias. Raras saídas em velocidade e desafogo para a defesa. A pressão maior foi no último minuto. No placar imóvel da etapa final, goleira-linha na Celemaster. Alguns trabalhos explorando a amplitude da quadra com jogadora a mais na armação, mas aproveitamento ruim e marcador congelado no 3 a 2 que serviu para Malgi.

No arranque da prorrogação, o placar zerado. Caso de persistência de empate, pênaltis. Mas Cota, sempre ela, estourando qualquer sistema de cotas de participação dela sendo decisiva, girou em cima da marcação e chutou sem chances para goleira. O golaço da partida, o golaço da final, sem dúvida alguma. Vibração no ginásio de novo e Malgi na frente agora pelo desempate.

O panorama do fim dos fins foi semelhante ao final do segundo tempo. Pressão e pressão e desejo da passagem do tempo. O estouro do cronômetro finalmente veio e o ginásio enfim comemorou. Malgi campeã pela primeira vez. Cota, a artilheira da experiência no jogo, Dani, a segurança, Duda, a guerreira corredora, a esforçada Bruna, a praticamente assistente técnica Dani mais alta, a habilidosa Evelyn, a multifuncional Paola e demais combatentes. Título mais do que merecido em um clube que faz trabalhos físicos, técnicos, táticos, nutricionais e, importante item, psicológicos. Malgi cada vez mais referência no Futsal Feminino.

Malgi Campeã
Foto: Gabriel Huch - Diário Popular
  



Texto do site da Malgi sobre a conquista
Por: Victor Thompsen
A Taça RS 2018 é da Malgi/CAVG. Jogando em Pelotas, as meninas reverteram o resultado adverso do primeiro jogo da decisão e após uma vitória por 3 a 2 no tempo normal, derrotaram a Celemaster por 1 a 0 na prorrogação e ficaram com o título do primeiro turno do Estadual 2018.
Reforço importante
Para a partida deste domingo, a Malgi contou com um reforço de peso. Melhor fixa do Estadual 2017, Keka voltou as quadras após sete meses se recuperando de uma cirurgia para corrigir uma lesão no ligamento cruzado anterior do joelho esquerdo.
Primeiro tempo movimentado
Reforçada por Keka e pela torcida que lotou o ginásio do Paulista, a Malgi buscou o gol no inicio da partida, Na primeira chegada Cota recebeu de Dudinha e finalizou para fora. No lance seguinte, após bate rebate na área a bola bateu na mão de uma das jogadoras da Celemaster, o arbitro da partida assinalou pênalti, Cota foi precisa na cobrança e abriu o placar. Dois minutos mais tarde em lance semelhante na área da Malgi o arbitro da partida marcou pênalti para a Celemaster, Gabriela foi para a bola e deixou tudo igual 1 a 1.
A ala da Celemater era a principal jogadora das visitantes e aos 12 minuto, ela só não virou por que Karina de carrinho tirou a bola em cima da linha. Pouco depois, após ataque rápido da Malgi, Evelyn tentou a finalização e mais uma vez a bola bateu na mão da jogadora da Celemaster, Cota foi para a bola mais uma vez e mandou no ângulo, Malgi 2a1
.
Após o segundo gol, a goleira Dani começou a se destacar pelo lado da Malgi, foram ao menos três intervenções cirúrgicas da goleira evitando o empate da Celemaster. A resposta da Malgi, por sua vez foi certeira, quando faltavam pouco mais de três minutos para o final do primeiro tempo, Cota em cobrança de lateral achou Dudinha na área, a ala finalizou de primeira para marcou o terceiro. Um minuto mais tarde Becha aproveitou sobra dentro da área e mandou para as redes, 3 a 2. No fim, Dani voltou a aparecer e com duas grande defesas evitou o empate.
Segundo tempo nervoso
Se as emoções já eram grandes no primeiro tempo, elas ficaram ainda maiores na segunda etapa. Com o resultado que levava o duelo para a prorrogação, Malgi e Celemaster fizeram um segundo tempo eletrizante, onde quem chamou a atenção foram as goleiras. Logo no primeiro minuto, após jogada ensaiada de lateral, Larissa chutou de bico, raspando a trave.  Pouco depois foi a vez de Dani aparecer, Becha fez jogada individual e chutou forte, a goleira da Malgi mandou para escanteio. No lance seguinte Tiphane acertou a trave e no rebote Dani operou um milagre para evitar o empate da Celemaster.
Atrás no placar e precisando de um empate para garantir o título, a Celemaster se lançou ao ataque e Dani brilhou mais um vez ao fazer grande defesa em chute de Gabriela. Quando Dani não defendeu, Dudinha e Tuigui se jogaram de carrinho e evitaram o empate.
Inspirada, Dani voltou a aparecer mais uma vez para evitar o gol de Becha. Na sequencia Dani fez outra grande defesa para evitar o gol de Duda. A resposta da Malgi veio com Cota que completou lançamento de Keka para defesa de Laís.
Muito disputada a partida contava com forte marcação de ambas as equipes e aos 15 minutos do segundo tempo, a Celemaster estourou o limite de faltas. Na cobrança do tito livre, Karina chutou forte a direita de Laís. No minuto seguinte Evelyn fez grande jogada individual e finalizou de bico na trave.
Numa das últimas oportunidades de conquistar o empate, Gabriela avançou pela direita e chutou rasteiro, Dani apareceu mais um vez e garantiu a vitória. Com o resultado a partida foi para a prorrogação.
Gol relâmpago
Sem nenhuma vantagem na prorrogação, as equipes precisavam ir para cima para buscar o título e a Malgi foi cirúrgica em seu primeiro ataque. Em bela jogada ensaiada de lateral Dudinha achou Cota na área, a pivô girou sobre a marcação e chutou no canto, para marcar aquele que seria o gol do título, o 12º dela no Estadual em oito jogos. O gol animou a Malgi e Dudinha em duas oportunidades, quase ampliou. Lais apareceu bem e evitou o segundo gol da Malgi. Pouco depois foi a vez de Larissa para na goleira adversária que espalmou para escanteio,  Definindo o placar do primeiro tempo.
Força defensiva garante Taça
No segundo tempo da prorrogação, a dedicação defensiva da Malgi fez a diferença. Incansáveis, as meninas brecavam todas as investidas ofensivas da Celemaster. Quando ninguém interceptava as ações, Dani mostrava segurança lá atras. Ela apareceu mais uma vez nos minutos finais para defender chute de Dani Fleitas.
Na última oportunidade do jogo, Keka por pouco não coroou o título com um golaço. Evelyn pegou a bola na quadra de defesa e foi enfileirando as adversárias, foram três jogadoras da Celemaster que ficaram para trás, com direito a caneta. A ala ajeitou na entrada da área e rolou para Keka que dominou e chutou no canto, Lais espalmou. No fim a Celemaster até colocou a goleira linha, mas não evitou a vitória das Pelotense.
Com o resultado a Malgi se sagrou Campeã da Taça RS, primeiro turno do Estadual. Garantiu uma vaga na decisão geral do Estadual e de quebra garantiu vaga em uma competição nacional para 2019, Taça Brasil (caso seja campeã Estadual) ou Copa do Brasil (em caso de vice-campeonato Estadual).
Agora as meninas voltam o seu foco para mais uma decisão, na quinta-feira dia 9, as meninas entram m quadra para tentar o tetracampeonato do Jogos Abertos de Pelotas.
Campanha
8 Jogos
7 Vitórias
0 Empates
1 Derrota
35 Gols Marcados
16 Gols Sofridos
19 Saldo
87,5% de Aproveitamento

05/08/2018

cronocrimenes

Cada vez que me deparo com os espaços em branco que predestinam e se amostram no aguardo de minha escrita, é o embarque de uma nova viagem. Sei ou pelo menos creio saber, ter alguma ideia do que vou em seguida escrever, mas a construção final é sempre distante de qualquer molde.

Assim também é a vida real aí fora. E bom que seja. Posso conhecer para onde estou viajando, mas o destino final, as ações e interpretações sempre terão um quê, um teor, um sublime de novidade. Posso saber onde vou jogar bola, mas não sei como virão os chutes, os passes, a sucessão das jogadas. Posso saber as falas de um filme, mas alguns detalhes das cenas, antes despercebidos, me serão novidade. Posso conhecer, ou achar que conheça certas pessoas, mas as pessoas também se modificam entre elas. Sequência de experiências e acontecimentos que não ficamos sabendo, ou ficamos sabendo de forma incompleta, ou ficamos sabendo pelo ponto de vista de terceiros.

Cada embarque num texto é diferente. É como um embarque em uma linha de ônibus. Conhecemos a pontuação, as palavras e o tamanho dos parágrafos em média. Conhecemos quanto tempo demora o ônibus ou o trem ou o veículo que for para fazer determinado percurso. Mas com quem estaremos? E quem vai cruzar nosso caminho? Entre demais passageiros, pedestres e motoristas nos trajetos. Gente que cruza pela gente.

Fazendo os mesmos percursos de quantas e tantas vezes, me nascem, me ensaiam, me florescem novos textos. Novas perspectivas. Estão o tempo todo em rotação. Dançam com novos autores que possa estar lendo, com novas pessoas e pontos de vista que eu possa estar convivendo. Brindam com imagens, notícias, manchetes e reportagens. Brincam com músicas ou com outros barcos em nossos ancoradouros.

Metamorfoses ambulantes na linguagem conhecida do que possa ser música popular brasileira. Metamorfoses ambulantes, mas quem tem as bulas que mudam a todo instante? Em outras citações de sabedoria popular, aprendemos que a graça, o objetivo dos portos e suas embarcações é a coragem de novamente partir.