27 de setembro de 2022

Ao menos hoje - e por alguns hoje

Hoje fiquei bem chateado ao ter de acordar cedo e passar por uma sessão inesperada de exames. Esperava e me preparava psicologicamente para enfrentar uma coleta de sangue, mas fiz na verdade um eletro, que constatou que meu coração está ok. Ao menos ele.

Saí de casa sem o celular, porque o deixei carregando. Se fosse somente a coleta de sangue, seria um exame rápido, embora caro no laboratório próximo de meu apartamento. Mas foi na clínica que realiza eletro. Enfrentei longa demora. E sem celular.

Tive de me sentar em uma das primeiras cadeiras - muitas estavam ocupadas - e fechar os olhos. Praticamente fingia que dormia. Talvez tenha enganado alguns. E por pouco não dormi de verdade, porque estive cansado e com sono. Realizei o cadastro na clínica. Esperei na sala de espera e não no carro com a justificativa de que logo viria um enfermeiro. Aguardei o enfermeiro. Me chamou o enfermeiro. Fui com ele e o exame mesmo não durou mais do que dois minutos. Entre amarras e a ligação definitiva do aparelho de medição. Assim logo voltei para a sala de espera. A médica iria me atender a qualquer momento. Mas entre a chegada à clínica e o atendimento da médica para leitura e análise de meu exame eletro percorremos duas horas. A conversa com ela também em pouco resolveu. Estou cansado de tentar contar minha história. São meses de sintomas e poucas soluções. Reponho vitaminas, mas isto parece pouco. Ao menos meu coração está ok.

Na sala de espera, tive de enfrentar a rede Globo ligada a manhã inteira, entre programa que antes era de auditório e depois inimiga da aposentadoria, Ana Maria Braga. O louro partiu e ela segue trabalhando. Pautas de pouco ou quase nenhum interesse meu. Barulho em meus ouvidos. Mantive os olhos fechados. Uma hora minha percepção não passou batida. Enquanto falavam de massagens caras de 180 a 350 reais na região metropolitana de São Paulo, a incansável faxineira da clínica passava a vassoura sucessivamente sob nossos pés, que ora desviavam do instrumento de limpeza. Ela percorreu o saguão algumas vezes. Considerei um trabalho de esmero. Geralmente não vemos essa eficácia, essa dedicação nos consultórios por onde passamos. Higiene extra ou exploração da classe? Eis a questão sobre o que se sobressai.

Passei pela consulta. Que quase se tornou troca de insultos. Fui questionado. Também questionei. Me decepcionei. Os médicos não me ajudam. Não sei a resposta de meus problemas. Outra consulta que se vai. Outros relatos que foram feitos. Do que adianta?

Almocei no apartamento. À tarde tive de estudar. Me senti um pouco eufórico. Comi chocolate antes para sobreviver. Preciso do doce ou da cafeína. Ou do doce com a cafeína. Ou me desanimo. Ou me desmotivo. Enfrentei as aulas. Esteve calor. Calor para usar máscara. Indisposição. Tive de ir com meu pai até o hospital do plano de saúde para marcar mais exames. Ao menos a consulta da manhã serviu para isso. Além de expor parte de minha corroída intimidade, serviu para requisição de mais exames. Vitaminas, cálcio, magnésio. O atendimento foi rápido e eficiente. Que assim siga. Ao menos o dinheiro tem algum retorno. Embora saúde eu não tenha de sobra. Nem para vendê-la nem para dá-la.

Lembro agora que na consulta da manhã, na ausência de meu celular, logo eu, um jornalista,me rendi ao que eu já deveria ter feito. Mas é que eu não havia percebido. Estava de imediato ao meu lado esquerdo um suporte para revistas que primeiramente o vi torcendo o nariz por dentro da máscara. Mas logo percebi o jornal impresso do concorrente. E peguei a folhá-lo. Mais completo do que o nosso como nossa diferença salarial sugere. Consegui terminar o jornal e nada da médica me chamar. O horário do almoço se aproximava e nada. Pensei em reler o trabalho do jornal concorrente. Mas deixei parado o jornal levemente amassado antes por meus dedos, agora sobre o suporte das revistas. Demorou mais uns minutos para um senhor de idade se dirigir até o jornal. Catou-o e leu. Teve sua leitura interrompida pelo chamado médico. Acho que foi em direção ao enfermeiro. Ou a outro médico. Saiu. Deixou o jornal repousado sobre seu antigo assento. Abandonado. Mais uns minutos e surgiu um homem mais novo. Meia idade. Olhou de soslaio e tascou a mão sobre o jornal. A maioria se informa pelos smartphones, mas alguns ainda se dedicam ao impresso. Ao menos em consultórios. 

Ao menos é a expressão chave deste texto. Ao menos recuperei meu humor quando visitado por minha prima ao final da tarde. Ela relatou suas experiências médicas ao longo desses últimos dois anos. Em especial dos últimos meses quando deles se recuperou. Realizou uma cirurgia de sucesso. Consegue relatar o passado sob a ótica de algum alívio. Imagino o transtorno. A sensação hoje de algum futuro. De perspectiva. A perspectiva, o sonho futuro são importantes. A esperança de certa forma nos move. Ouvi-la em superação após tanta dificuldade me fez bem. Não sei se teremos trajetórias semelhantes e os mesmos desfechos. Mas fico feliz antecipadamente por sua resolução. E torço incondicionalmente por sua melhora. Para que o passado seja engavetado no baú dos traumas e sustos. Ela que supera o uso anterior da morfina. Ela que de medicação tem se libertado. Ela que encoraja a que outros relatem suas experiências. A saúde humana definha e o exército dos fármacos é convocado. Dele somos escravos e sonhadoramente libertos.

Terminei um dia difícil e cansativo com alguma mensagem de esperança. Meu time (um dos) ganhou pelos mesmos sete que havia sofrido há algum tempo. Poderia encerrar em total delírio como quando recebi tal notícia direto da região mais metropolitana do estado. Mas logo surgem especulações de casas de apostas. Prefiro manter a cautela. Assim parece o ritmo da vida. Ontem mesmo me perguntava sobre minhas alegrias incondicionais. Sem filtros. Hoje em dia é raro demais. A sombra do que vai dar errado adiante, a sombra da sabotagem me persegue. Por ora, parabéns aos guris pela vitória. A vitória e a idoneidade será posta à prova adiante. Que a mantenha quem a possa manter. Ao menos, nossa palavra chave de hoje, ao menos hoje, consigo terminar ok meu dia.


22 de setembro de 2022

Meio fio

O ruim do gesto humilde de sentar no meio fio é lembrar que colocamos os sacos de lixo - que às vezes são rasgados - exatamente junto ao meio fio.

6 de setembro de 2022

Empatia no Placar

Há certa situações em que tenho uma fácil empatia porque me ocorre, em outras consigo porque facilmente me imagino no lugar de quem passa por isso, e ainda há as situações em que, com um pouco de esforço, também me imagino no lugar da vítima.

Dificilmente não atinjo tal resultado.