Os cachorros da vizinhança se incomodam quando saio com camisas do Grêmio e acho que jamais entenderei o porquê. As pichações estão mais corretas do que erradas, só precisam estar no lugar certo, por questões de respeito ao próximo e visibilidade.
Comemoro comigo mesmo a cada vez que cruzo por alguma escrita das ruas com um valor interessante ao cidadão que passe e a veja. Cunho político e social nas paredes. Há quadras que percorro sem que apareçam outros pedestres, mas muitos carros me ultrapassam seja qual for a marcha que esteja engatada neles. Em outras ruas, prefiro estar com a segurança de meus fones e meus óculos escuros enquanto driblo a multidão apressada.
Cruzo por postos de gasolina e, em ambos, os frentistas conversam descontraidamente, trocando anedotas e causos. Nem parece o mesmo cenário apocalíptico de dias atrás, quando motoristas formavam filas quilométricas na busca por combustíveis.
Mais adiante, funcionários de uma loja de colchões estão loucos para testar os produtos pelos quais são responsáveis. Eles apenas esperam o sol se por novamente para regressarem a seus respectivos lares. Talvez estacionem na ciclovia quando a ciclovia já puder ser ocupada como estacionamento, ao anoitecer. Talvez jantem em uma pizzaria ou algo assim, com o olhar voltado à tela do celular e sem agradecer devidamente ao garçom.
Alguns libertam-se da rotina de trabalho e trocam as vestimentas para se prender à rotina de correr pela avenida Dom Joaquim. A luta pelo salário e contra a balança é constante. Alguns criminalizam umas drogas e ingerem outras, adquiridas com receitas médicas nas 'drogarias'.
Eu desvio sempre do que os cachorros de uns deixam no caminho. A maioria está nem aí. Na verdade, nem aí em relação a todos os aspectos que me chamaram atenção pelas ruas. E, após ver pessoas de mais ou menos idade, mais ou menos condição física pela Dom Joaquim, retorno para meus aposentos.
O sol, cercado por um emaranhado de fios presos a postes, se despede em um mergulho teatral. O tempo, implacável, nocauteia mais um dia no manicômio a céu aberto.
Foto: Henrique König |