26 de novembro de 2019

4 paredes

suas quatro paredes
minha sêde
minha séde?
sê-de minha

minha fonte
assim defronte
ou onde
te escondes
me escondes

suas quatro paredes
volto a elas
me recosto
mexo as letras
suas mechas
deixa dedos
deixa medos
do lado de fora

de suas quatro paredes
pinta comigo
primeira e segunda mão
lê-de meus sinais
não meça os quais
não fazem parte
de nossos rituais

de nossas quatro paredes
me adono
suas pernas em coroa
meu trono
adorno e horkheimer
ai-me
a minha alma
armada e apontada
a minha arma
amada e apontada

no escuro sou cego
no escuro sossego
no escuro me curo
me curvo
no escuro
de suas paredes

rente a elas e rentável
ágil o agir
entre o viável
e o invisível
o que está ali
e o imensurável
o que todos sabem
não mencionável

entre as quatro paredes
maybe in made
made in maybe
sure, no shame
barco e leme
lambe em lazy
entre as quatro paredes

cavidades
epidermes
novidades
e até germes
há de ser-de
sermos não ermos
corpo em ésse
letra de seremos

entre quatro paredes
o átrio batendo
o conjunto povoa
esse tudo
que é quarto
e primeiro
para a escolha
dos atos

24 de novembro de 2019

globo ocular

deixa eu girar
teu mundo
teu país
teus quadris
e
ha!
teu globo ocular

aliens exist

racing club de avellaneda
nos fones rancid
camisa "resist"
aliens of course exist
e mais nada

folhas de almaço

morro humano a cada dia
fica o artista
a cada transa a poesia erótica
me cresce e me brota
como os membros, tuas fronhas
me sufoca
devaneios, o que se sonha
me sufoca
me conjunta e me une
a ilhota
me mantém vivo, mil antídotos
para a carne antes morta
mezanino onde flutuo
mientras uma juventude senil
entra aqui ou me abre
tua porta
braços, mãos e maços
folhas de almaço
preenchimento poliglota
je parti e tois aussi
foi-se a frota
a espera é um porto
a vida vai e o vento sopra

6 de novembro de 2019

a bomba

Fui um dos primeiros a chegar nos bancos que cercam as plataformas de embarque e desembarque da movimentada rodoviária. O ritmo das capitais. Pousei minhas bagagens ao chão, no equilíbrio de minhas canelas para não tombarem e ao mesmo tempo tomando o cuidado para que não tombassem para frente. Mochilas abarrotadas de coisas dificultosamente colocadas e que me fizeram agradecer por ceder a nenhuma pressão interna de compra nas feiras ambulantes. Os tesouros dos briques à beira do parque em ótimas peças de artesanato ou imitando as principais artes do mundo da música pop e do rock. Como comprei nada dos interessantes materiais, foi possível alojar meus pertences em estreitos e disputados espaços.

Enquanto verificava o sobrepeso que me livrava das costas ao poder sentar-me com as bagagens no solo, notei a movimentação peculiar de um outro futuro passageiro. Também alocado para os desconfortáveis bancos de madeira, ele partiu em direção à plataforma de concreto onde os ônibus param, vão e vem, e pousou uma mochila preta por ali. Despreocupado em sua pose marrenta de óculos escuros, ele retomou sua posição original em recuo da plataforma rumo aos bancos. Observei-o de canto de olho, sem dar bandeira, sem despertar alarde. Fingindo tamanha despreocupação como ele devia estar fingindo, pois logo veio-me à tona o motivo da sequência de atos do homem: é uma bomba.

Olhei para o lado se mais alguém teria notado a tal petulância. Logo na rodoviária, em um domingo, em dia tão movimentado. O recuo dele para fumar um cigarro e depois sumir em direção à área de comércios e restaurantes da rodoviária não deixou-me sequer sombra de dúvida: era um terrorista. Como cresciam os tipos de atentado naquela época, a Europa vinha em polvorosa com tais acontecimentos. Museus e prédios franceses, descontrole dos metrôs aos centros históricos da Espanha, de Madrid a Barcelona. A Alemanha dava pronunciamentos para evitar surpresa sobre. Os Estados Unidos que nunca haviam superado o atentado contra Nova York em 2001. Todos esses países ocidentais servindo de exemplo e quintal para o que iria acontecer ainda naquela tarde.

A cena cinematográfica estava feita, o sol a brilhar de fundo, a mergulhar defronte às lentes amareladas de meus óculos escuros. Eu seria tão suspeito quanto ele. Inclusive uma de minhas mochilas, a preta, se assemelhava demasiadamente à depositada pelo farsante, pelo vigário. Maldito seja. Pensei em acometer-me contra os demais cidadãos. Esbofetear rostos de maneira incrédula e obrigar-lhes a abrir os olhos: "como não viram esse criminoso agir! bem diante de vocês!". Exclamar-lhes, fazer o maior alarido que me fosse possível.

Eu que já havia àquela altura e naquele ano pensado em tirar minha própria vida, muito me aborreceria terminá-la assim à beira de uma plataforma rodoviária, vítima de uma tragédia de âmbito nacional pelo número de mortos e mundial pela audácia do autor. Certamente aquela mochila preta reservava um dispositivo interligado a um disparador que o meliante executaria a uma distância segura. Disfarçado ele com seus óculos escuros para perder-se na multidão e nos caminhos sinuosos da metrópole rumo ao oeste da cidade para escapar pelo interior. Agora que ele havia sumido da vista eu nada poderia fazer. Será que serviria de mártir? Será que só eu havia percebido a ação criminosa? Será que se eu escapasse, recuando para longe dos estilhaços da bomba, seria suspeitado nas investigações por passar características vagas e imprecisas sobre o autor? Mas para que precisariam de mim, se as câmeras de segurança registraram tudo? Se é que registraram.

O tempo estava acabando, os ônibus do horário das 16 horas estavam começando a encostar no destino de recolher passageiros. Certamente programou para a hora do embarque, quando os motoristas estão conferindo os bilhetes e as demais malas estão ali para formar uma salada de opções confusas para se entender o motivo do estrago. O suor me escorria pela testa e pelo lombo; se eu saísse dessa, teria a obrigação de dar um jeito de trocar de roupa dentro do ônibus. Mas que ônibus e que futuro? Seriam mais atingidos os passageiros de minha cidade ou daquela serrana? Como sairiam nas estatísticas? A comoção nas rádios e telejornais locais. A imprensa internacional e as agências de notícias rumo ao contato, a dificuldade do idioma. As entrevistas sensacionalistas e emocionadas. Tudo isso com meu aval, minha cumplicidade, minha ineficácia em como combater. Cansei.

Me levantei para tomar uma atitude a respeito, os passageiros se aproximavam e eu não podia mais deixar daquele jeito. Poderia salvar vidas e ser reconhecido com medalhas de honra no mais puro e singelo heroísmo. Calcei-me de coragem e pus-me de pé. Não mais via de canto, mas ouvi de canto uma voz que se aproximou para junto de um senhor baixinho que sentado esperava, as pernas curtas que mal deixavam os pés alcançarem o chão enquanto as balançava. Senhor negro de barba e cabelos que restavam bastantes grisalhos.

Qual não foi a minha surpresa em reparar, agora sim de olhos, que aquela voz era advinda do delinquente de meia idade e óculos escuros. O patife estava regresso. "Um real pelo banheiro da rodoviária! Mas pela dor de barriga que tive valeu cada centavo. Obrigado por cuidar da mala" e aliviado dirigiu-se para sua bagagem e para o embarque. Ao menos o ônibus não era o mesmo que o meu.

esse motivo

enquanto eu penso no mundo
quem é que faz minha janta?
enquanto eu penso no mundo
quem é que faz minha janta?

queria ter tempo de ler, ver e escrever [um pouco]
para me sentir mais vivo
ou ao menos, menos morto
brindar-me com mais atrativos
uma taça de vidro de um líquido choco

queria ter tempo de ter você e você [mais um pouco]
para me sentir mais vivo
ou ao menos, menos morto
brindar-me com todos os seus sentidos
entre o alívio e o sufoco

como é que eu vou matar esse motivo?
se é com ele que assim estou vivo
como é que eu vou matar esse motivo?
se é com ele que assim estou vivo

como é que eu vou matar esse motivo?
se é com ele que assim estou vivo
como é que eu vou matar esse motivo?
se é com ele que assim estou vivo


*escrita em 06 de novembro de 2019 - pós apresentação de Gustavo Kaly e Wander Wildner na TVE RS*

turbilhões

um turbilhão de pensamentos
nem dá tempo de passar ao papel
tem dias que nada me vem
em outros vou infinito ao céu

tem dias que ninguém me dá bola
e dias que vocês se combinam
exercício da paranoia
não saio desse labirinto

um turbilhão de momentos
que se atropelam e disputam o meu tempo
quero fugir desse conflito
ficar em paz como supremo sentimento

o trânsito não te permite
é o apetite nunca saciado
meu tempo livre quero meu levite
acima desse mundo tresloucado

um turbilhão de turbilhões
turbilhão é uma palavra feia
turbilhões turbinados
turbilhões estrangeiros na minha aldeia
que perturbam o meu sossego
e me fazem ir além
perturbam como medos
me fazem ser outro alguém


*escrita em 06 de novembro de 2019 - pós apresentação de Gustavo Kaly e Wander Wildner na TVE RS*

3 de novembro de 2019

paranoia rodoviária

Eu esperava ali sozinho na rodoviária. Os ônibus do horário anterior haviam recém partido e os bancos se encontravam vazios à beira da plataforma de concreto, a área destinada ao vai e vem dos transportes coletivos. Sentei-me de frente para onde eu embarcaria mais de hora depois. Não eram estruturas confortáveis, o que deixava claro que os utilizadores costumam chegar ali somente minutos antes do derradeiro embarque. Mas considerava aquele um espaço seguro e não queria mais me acomodar com as pesadas bagagens, compostas por duas mochilas, em outros cantos. Ali estava de bom tamanho.

Miscelânea de pessoas por vir. De diferentes localidades, interior ou demais capitais, indo a trabalho ou voltando para casa. Visitas, festividades, enterros, diferentes motivações para se deslocar em tempos de passagens caras. Lembro quando eu pagava cerca de 50 reais para estar ali. Agora eram quase 90. Tudo isso em um combo de poucos anos. Quem dobrou salário nesse período? Envolto em pensamentos distantes, talvez mais além do que a trajetória daqueles ônibus, distraía-me com o desenroscar dos fones de ouvido para em seguida plugá-los ao celular e colocá-los como transmissores de meus temas musicais previamente e minuciosamente selecionados. Ênfase nos artistas que eu recém havia escutado em viagem com o intuito de vê-los e isso eu havia cumprido. Visitei e conheci pessoas e outras tantas que não me foram possíveis ver por contratempos delas ou impossibilidades ou mesmo por - mea culpa - não tê-las colocado em prioridade para possíveis encontros. Bola doravante.

Surge-me em periférico campo de visão a imagem de uma bela moça, dos atributos físicos que costumam me atrair. Características gerais devidamente observadas nessa olhadela de fração de segundo. Ao tomar consciência do panorama em volta, há uma maior ocupação dos lugares em relação ao período anterior de minha chegada, obviamente. Bom nível de preenchimento, a superar os 50% dos arredores do box 4, de onde partiria meu ônibus. Ainda entretido com as atrações musicais direcionadas aos meus ouvidos para transmissão direta ao sistema nervoso central, passei a considerá-la parte de minhas distrações. Imaginar idade, procedência e principalmente: estado civil.

Em outra das olhadelas - talvez a terceira ou quarta - observo que ela está conversando com alguém. Pago o preço pela demora em agir. O caríssimo custo de não tomar uma atitude antes, de apenas observar de canto de olho, sem estabelecer um contato visual que poderia resultar até em minha migração, bancos ao lado, em direção a ela para ligar assuntos. A dúvida entre começar genérico nas habituais conversas desenvolvidas desde que a linguagem é assim linguagem, só observar nos filmes antigos ou mesmo no que é empregado em livros de séculos anteriores. Olá, tudo bem, como está, vai para onde, a que veio, a que vai, interessante. Ou quem sabe investir em algo mais dinâmico mas que pode assustar as pessoas. É sempre uma dúvida ponderável.

Iniciar diretamente a conversa sobre seus gostos musicais, sobre para quem foi seu voto na eleição passada, se possui outras referências políticas ativistas, o que costuma ler, o que gosta de fazer no tempo livre, qual o sabor favorito de sorvete, se come ou não come carne, se conhece mais do mapa da cidade que sempre me interessa saber mais a respeito, de onde seriam suas raízes e gostaria muito, muito, muito mesmo de conhecer suas origens em nome e sobrenome. Calma, respira, não vai acontecer. Não há porque manter esse desgaste. Estava recém voltando dessa subida, dessa ascensão em aproveitar viagem em terras parcialmente desconhecidas. Uma hora se volta e, voltando para casa, outras aventuras desenvolvem-se, não é mesmo? Mesmo assim há o incômodo. Antes ela não estava conversando e agora está. Com quem está? Não interessa, foi perdida a oportunidade. Por ordem de chegada poderia ser sua esta chance. Nisso concorda? Concordo.

Alguém tomou o lugar na janela. Inclusive minha poltrona dessa viagem era no corredor, por comprar mais em cima da hora e fugir da classe executiva que tornaria a viagem ampliadamente cara, para acima dos 120 reais. Um assalto em transporte, praticamente um sequestro para voltar para minha cidade. Enfim, tomado de assalto fui naquela situação, evidentemente, pois alguém roubou meu lugar, o lugar no banquinho desconfortável de madeira ao lado da donzela. O preço de migrar chamando a atenção dos demais ocupantes à beira da plataforma para dirigir minhas mochilas para mal acomodar-me em outro banco duro de madeira com encostos de ferro aos braços, mas tudo isso com o intuito e conhecer aquele misterioso sotaque, quem sabe do noroeste do estado, terra das mulheres mais bonitas do mundo, segundo me constam pesquisas, conhecer olfativamente aquele perfume entre pescoço e cabelos, sem importar-se com a marca do shampoo ou da loção. Sem noção, divagava assim por pensamentos, mas ao mesmo tempo conhecedor do retrato da derrota. Não fui enquanto era tempo e alguém tomou-me esse espaço. Raios. Raios duplos e até triplos. Poderia ali estar um futuro relacionamento, um novo objetivo de viagem, uma perda de tempo virtual, no mínimo dos mínimos, era válido arriscar.

As olhadas de canto, o máximo que encarei nessa tríade contada, formavam uma imagem mentalizada pelo cérebro de que valeria a pena investir. Agora ela encontrara alguém para o resto de sua vida. De certo pegariam o mesmo ônibus e esse os confirmaria no caminho não só da mesma cidade, mas iriam pela estrada da felicidade. Desceriam na próxima estação rodoviária casados, com nomes escolhidos aos filhos e alianças medidas para serem compradas e trocadas e claro que aceito, pode beijar a noiva. Tudo bem, faz parte, segue-se para outra via. Afinal, eles estão mais próximos do box 2 e o meu destino reservava o box 4. Do ponto congruente que nos uniu em horário e local, era a sequência vital nos levando cada um para um canto e jamais daria certo. Abatimento, mas aceitação. Que eles fossem felizes. Quase um abrupto intuito de levantar-me para assim desejar ao mais novo casal. Talvez constrange-los evocando algum canto brega e ridículo como "com quem será?". Mas sequer sei os seus nomes. Não saber sequer os nomes é irritante. A idade, se prefere gato ou cão, chocolate ou morango ou baunilha ou creme, o signo, a cor favorita são questões irrelevantes quando não se sabe sequer que nome foi encerrado na cova e na gaveta do inacessível passado, inevitavelmente deixado para além das possibilidades futuras.

Somente quando o horário já estava sendo finalmente preenchido para nossos ônibus encostarem, os motoristas descerem e conferirem as passagens, é que pude observar a moça mais de perto. A poucos metros dela, urge-me a derradeira e fatídica surpresa: acompanhada estava a de cabelos escuros pela sua própria mãe. O exercício da paranoia rodoviária.

juliet

sonhei que você se debruçava em mim
só pra confirmar que eu queria
assim
sonhei que você me servia gim
só pra confirmar que eu queria
gim

sonho seu sorriso nervoso
como ele é
ruidoso dentro da minha mente
impreciso do motivo
do que você quer

sonho seu sorriso arbitrário
nada é páreo para ele
implacável e sem placas bacterianas
dentes brancos
laudos odontológicos
a mais bela criatura
do nosso zoológico
a fissura que me causa
e me deixa em chamas
e mexe com meus diagnósticos
neurológicos

sonhei que você se debruçava em mim
só pra confirmar que eu queria
assim
sonhei que você me servia gim
só pra confirmar que eu queria
sim

sonho seu sorriso
último passo do abismo
intrusivo que me submeteu
sonhos e paraísos
algo a mais que juliets e romeus
além do éden de cobras e maçãs
e de tudo aquilo que já se rompeu
sou o et do particípio
do verbo não vencido, carente e ateu

sonho seu sorriso subjetivo
me alegra poder ser esse motivo
em um gerativismo
seu sorriso forma o meu
Deus morreu
e o próximo sou eu

sonhei que você se debruçava em mim
só pra confirmar que eu queria
assim
sonhei que você me servia gim
só pra confirmar que eu queria
sim

2 de novembro de 2019

entre milhões de views e milhões de ninguém viu

Passeando pelo Google Street View e descobrindo algumas das cidades mais famosas do mundo nos Estados Unidos. Entre as impressões que me chegam está a de que lá tudo é muito distante para desenvolver caminhadas. São cidades planejadas para os carros. Ruas largas e impecavelmente asfaltadas, mesmo os becos ou desvios para lugar nenhum: há por lá o asfalto, o tapete ao desfile das quatro rodas de cada um.

Os cenários urbanos se desenvolvem nesse sentido. A horizontalidade de cidades segue esse guia de vias que no Brasil incentivariam os mais perigosos rachas. Não à toa roda-se e desperta-se o desejo de sagas como Velozes e Furiosos. Cada cidade por lá apresenta características adequadas para o exibicionismo da alta velocidade e tecnologia automotora.

No meu cenário muito mais pedestre e transeunte, imagino o forte calor dessa quantidade asfáltica. Noto a presença das calçadas e de terrenos baldios ou desocupados de imóveis também repletos de concreto. Há árvores nessas cidades mais sulistas, mas são vegetações mais baixas e características dos desertos, ou seja, a sombra não é convidativa. Chega a causar inveja aos sertões do Nordeste de brasilis, descritos pelo carioca Euclides da Cunha.

Lá nos EUA pode-se iniciar a vida de condutor mais cedo do que no Brasil, em licença para dirigir logo aos 16 anos. Um carro para cima e para baixo em direção aos fast foods, lojas, hotéis, festas e diferentes paisagens. O país que, antes colônia da Inglaterra e pós esse processo colonizou quase que o mundo todo, exporta esse meio de sonhos de consumo e de formas de administrar cidades. Com o calor dos asfaltos, com o incentivo de vendas mais baratas de carros e combustíveis, a carta para dirigir retirada na adolescência, a publicidade e outros estabelecimentos como as vendas de comida em lanches fazem os Estados Unidos brigarem contra a balança. Se o braço forte do capitalismo vence e coloca qualquer braço oponente direto na lona nas quedas, a balança mostra panorama da luta do país contra o sobrepeso de sua população. Perspectiva preocupante.

Outro ponto que me chamou atenção foi da situação da rica Califórnia, sozinha maior do que o PIB de quase todos os países do mundo e maior do que o PIB de uns quantos somados juntos, aglutinados; essa Califórnia que é fronteiriça com o México, ainda sem a oficialização de um muro trumpeano, mas que revela problemas que nos passam despercebidos sobre as crueldades das garras capitalistas. Ali em fronteira com essa Califórnia está a deepweb, está a obscuridade, o poder do tráfico. A cidade de Tijuana lidera ranking de 2018 sobre o atlas da violência mundial, atualizando homicídios. O México vive maus dias no combate ao teor violento de suas gangues e domínios de pontos. Uma rápida passada pelas ruas de Tijuana deixa claro como o sistema funciona por lá. Pichações que indicam a quem pertence a área e costumeiras casas como as que aparecem nos filmes dos lugares mais desérticos e áridos dos EUA, ou da própria fronteira ou lado mexicano. Possíveis bocas ou pontos de traficar, lugares suspeitos, casas apertadas, ruas hostis. Mesmo assim se distribui novamente o foco inicial que trouxe aqui, o asfalto como meio de escape. Bom para transportar droga ou fugir em perseguições, como a vida imita a arte; a ficção na realidade. Seja de Tijuana ou de outra cidade de comum geografia, espanta a proximidade com os estilos de vida badalados das conhecidas San Diego, Los Angeles, San Francisco e outras potências turísticas e atrativas da milionária Califórnia. Subúrbios a eles; trevas ao lado da ostentação. A própria megalomaníaca gigantesca cidade de Los Angeles convive com isso, os infortúnios da presença de gangues, migrantes, comércios ilegais, violência e crime, trabalhos a IML na calada da noite, vizinhos que nada sabem e nada viram.

Entre milhões de views e milhões de ninguém viu.