28 de fevereiro de 2015

Mordidas no Veneno

Ainda não sei lidar
Não sei lhe dar
O que você quer
O que eu quero
O que nós queremos
 
Ainda não sei lidar
Não sei lhe dar
O momento à altura
Daquela lembrança
Que não esquecemos
 
Ainda não sei livrar
Nem lavrar
A terra que temos
Não sei se a vendo
Ou fico a vendo
Enquanto o tempo me deixar
 
Ainda não sei levar
Nem louvar
A vida que temos
Tanta praga e inseticida
Tantas mordidas no veneno
 
Ainda não sei ligar
Os pontos distantes
Para o mesmo instante
Ser o que escolhemos
 
Sei que meus planos
E minhas ações
Não foram os melhores
Nesses anos de plantações
Mas ainda acredito
Haver algo para colhermos

27 de fevereiro de 2015

Fardas e Pijamas Listrados

A humanidade. A repressão e a dominação contra classes e sobre povos. Sobre gente como a gente, do outro lado do muro ou da grade. Somos tachados com CH, somos taxados com X. O X da questão é ver além da máscara que eles querem sobrepor sobre as pessoas. O ódio impõe a generalização que nos faz incapazes de ver o brilho nos olhares. Nos faz incapazes de ver o lado humano e a inocência individual de quem está no meio da guerra, no meio da fila, no meio frio, no meio do caos.
 
Estamos à véspera do Gre-Nal 404, mais um na história do Rio Grande do Sul. Iniciativa inédita dos últimos tempos é o setor para torcida mista, com colorados e gremistas no mesmo espaço durante o clássico. A ideia é propagar uma campanha de paz entre os torcedores gaúchos. Ela ocorre partindo de setores mais elitizados, de quem pode pagar pela locação confortável no estádio moderno em um jogo de tamanha importância. Não é exatamente a realidade de civilização do cotidiano. Mas, com a campanha em andamento, pelo poder da mídia interessada, ela talvez possa ser expandida a outros estádios, estados, agremiações... e sociedade. Ok.

Na mesma semana da pilha feita por esta campanha, a Brigada Militar dá o mau exemplo. No jogo do meio de semana, válido pela Copa Libertadores, torcedores do Inter pintavam as ruas de vermelho para apoiar a chegada do clube ao estádio Beira-Rio. Acabaram pintados de vermelho por exageros, ações descabidas da Brigada. Cenas fortes circulam pelas redes sociais. Torcedores baleados por balas de borracha, feridos a cassetetes, a pauladas dos intolerantes de farda. O despreparo para lidar com a população é gigantesco. Os exageros presenciados são repugnantes, repudiáveis.
 
A onda de violência, a violência repressora é o dia a dia. O dia a dia que esvazia a fantasia. A fantasia da paz proposta pela campanha. Me perturba a forma como quem tem o poder está para reprimir. Taxa e tacha quem tem poder. É taxado e tachado quem não tem. A distribuição e os tratamentos são completamente diferentes de acordo com as classes envolvidas. Opressores e oprimidos. Dois (ou mais) pesos. Duas (ou mais) medidas.
 
O Brasil vive um momento conturbado, fique registrado. Greves ocorrendo e boatos de greves por ocorrer. A distribuição de recursos sofre faltas com paralisações no transporte. Mas a distribuição da violência marcou o episódio comentado e mais tantos episódios. A paz nacional, por conta de taxas e tachas, está longe para a nossa maioria de taxados e oprimidos. Está longe até do futebol, mesmo após anos de campanhas por ela. Está longe, infelizmente, eu diria, como um tiro de meta está distante do gol.
Filme: O Menino do Pijama Listrado
"Hoje, o guri judeu estaria à direita. Um palestino à esquerda. Muda a crença, e não acaba a opressão" COIMBRA, Vinicius

21 de fevereiro de 2015

Esquimó

Me esquivo
Me sinto sempre entre, no mínimo
Dois caminhos
Sou, no mínimo, uma esquina das dúvidas
 
Sou frio
Sinto frio
Sou um esquimó
Esqueço e esquematizo a vida
Cheia de nós
 
Isso, é o que sou
Sou um esquimó
Esquecido, esquecendo
ESC sendo
Com meus esquis
Meus huskies
E meus whiskies
 
Foto: http://www.brasilescola.com/upload/e/esquimo.jpg

19 de fevereiro de 2015

Pingos no Para-Brisa

Fui pego pela chuva. De novo. Não é o primeiro banho em sua companhia vinda dos céus neste verão, porém, eu carregava a câmera na mochila surrada e o perigo de um prejuízo envolvendo-a era grande. Ela não foi visita inesperada, pois as nuvens rondavam em 50 tons de cinza sobre minha cabeça.
Consegui alcançar o destino final de minha casa, mas bastante encharcado. Combinei que a reunião transferida da manhã para às quatro horas da tarde não ficaria de meu encargo e obtive concordância (em parte) da decisão. A chuva não cessou e, após rápida execução de uma tarefa virtual, me dei ao luxo de ler um capítulo e dormir.

Enquanto isso, as fotos nas redes sociais tomaram as proporções de urgência e alarmantes como costuma acontecer atualmente em enchentes. Quem realmente sofre não tem (aparentemente não) tempo de captar o momento em imagens, ou, em tragédia, acaba perdendo o equipamento na enxurrada.

O balanço das críticas através de imagens é interessante. As ilustrações do caos caem em cima dos governantes, às vezes em tons exagerados. Há, sim, a culpa do alto escalão da prefeitura, responsável por serviços de recolhimento de lixo e manutenção das vias de fluxo do saneamento. A pancada d'água também foi forte e deixaria estragos de qualquer jeito. Mas obviamente que os prejuízos poderiam ser amenizados, compreendes, Mendes?


Termino as linhas com aspecto de diário ao som ainda de alguns pingos. Há poucos minutos ainda estavam bastantes estaladores sobre as telhas e calçada. A reunião, todavia, foi adiada e não me livro de ser escalado novamente a comparecer a ela, marcada para próxima segunda-feira.

Por fim, águas passadas mesmo são os protestos em massa pela redução das tarifas. As cidades grandes têm os requerimentos da época ignorados como pingos em um para-brisa. Os políticos seguem protegidos internamente pelos vidros com insufilm e fingimos não ver mais.

A partir de domingo (22), passagem a 3,25 pila em Porto Alegre. Como será que foi a chuva lá?

14 de fevereiro de 2015

Pelos e Apelos

Meus pelos e apelos
E seus crescimentos
E seus cortes
São a vida, distorcida
Certa mesmo
Só a morte

4 de fevereiro de 2015

Tempo das Vacas Magras

Em abril, nem muito quente e nem muito frio, teremos o início da terceira divisão gaúcha. Assolados mas sonhadores, os clubes, a princípio 13 inscritos, vão buscar o comum objetivo que só será alcançado por um deles. Somente o campeão do torneio terá vaga para disputar a divisão de acesso em 2016.

O sonho talvez ganhe requintes e brilhos por se tratar de uma competição arquitetada como sub-23. Apenas três atletas acima da faixa etária podem ser inscritos por cada agremiação. Compreendendo isso, muitos vão ter a oportunidade de mostrar serviço em uma competição de pífio acompanhamento midiático, mas de interesse de alguns olheiros de vitrines maiores, que irão percorrer os nefastos gramados sul-rio-grandenses.

Na cabeça dos torcedores, nossos personagens principais e que realmente acalentam um determinado charme ao certame, está o heroico compromisso de carregar a bandeira nas mãos e o símbolo na segunda pele sobre o coração, na tentativa de trilhar o caminho das pedras até o caneco. Todos acreditam e sonham com a primeira divisão, o patamar máximo já atingido por alguns, mais recentemente ou há décadas atrás. Turva é a jornada para chegar até o santuário, onde muitos se esbarram e muitos se embarram para pouca efetividade.


A terceira divisão afasta o sonho das contratações melhores, dos jogos em melhor nível e com melhor público. Ao contrário das vantagens da elite, existe a morbidez de estar próximo ao juízo final. As trevas e o receio de fechar as portas estão sempre presentes, como inimigas do sono tranquilo e da paz com o travesseiro.

Hoje, temos uma divisão de acesso com 15 clubes confirmados. A terceira divisão, por sua vez, traz 13 agremiações. Eu preferiria uma divisão de acesso mais acolhedora, com os 28 escudos. Podia haver mais grupos, mais times e mais combate entre eles. Mas, caso o clube saísse derrotado, saberia que pode tentar de novo no ano que vem. Sempre na luta pelo sonho da primeira divisão. Não no abismo que é a terceira. O mínimo dos mínimos seria a última seção de clubes ter direito a umas três vagas na divisória acima. Um pódio de contemplados pelo trabalho de tão poucos recursos disponíveis.

Da minha visão, é isso. Boa sorte aos clubes, com suas contratações e fundos para viagens apertados. Mais apertado ainda estará o coração dos verdadeiros hinchas nessa árdua missão. Somente um peleador clube passa da terceira para a divisão de acesso. Somente um passa da divisão de acesso para primeira. Há, sim, muita coisa errada. Mas mais errado seria abandonar uma das razões de viver quando ela está no meio do temporal.

O futebol do interior sempre deve viver.

FOTOS: EDIANE OLIVEIRA