20 de fevereiro de 2021

road movies

eu faço músicas feias castelos de: areia eu faço os meus laços e se ficarem cegos eu corto eu faço os meus nós e se ficarem cegos eu... eu

punheteia a guitarra ao ritmo de um road movie nós vencemos as curvas mas não ganhamos das nuvens

massageia a lâmpada vê se sai mais uma ideia o gênio preso sob a tampa e sob o chapéu de alumínio repleto de medos e também de delírios faço uma música de cada vez yeaaahhh yes faço uma música de cada vez yeaaahhh yes vivo uma loucura sem sensatez

16 de fevereiro de 2021

sem ganhar uma rupia

trabalho pra caralho
sem nunca ganhar uma rupia
capitalismo porco
sistema filho da puta

nossas terras engendradas
por empresas estrangeiras
eles enchem as algibeiras
e pra nós resta naaadaaaaaa

trabalho, quebro galhos
sem ganhar uma rupia
sem sistema de esgoto
cegos operando lupas

empresas privatizadas
o lucro é todo deles
nossas terras arrasadas
somos sempre os mais reeeleeees

trabalho sem me sentar
sem ganhar um centavo
outros passam o dia inteiro
estando parados

população deslocada
periferias e favelas
acendendo toco de vela
longe das fachaaadaaaas

trabalho bem paspalho
sem ganhar uma rupia
tua utopia tá aonde?
não vale nenhum trocaaadooo

inverto os termos
dentro dessa música
sem nunca ganhar uma rupia
ou ganhando nenhuma rupia
ou sem ganhar uma rupia
pra parecer original
na hora de fazer o vocal
pra ninguém me copiar
sem ganhar um real
ou ganhando nenhum real
ou sem nunca ganhar um real

inverto os termos
dentro dessa música
sem nunca ganhar uma rupia
ou ganhando nenhuma rupia
ou sem ganhar uma rupia
pra parecer original
na hora de fazer o vocal
pra ninguém me copiar
sem ganhar um real
ou ganhando nenhum real
ou sem nunca ganhar um real

trabalho como uma mula
sem ganhar uma rupia
trabalho como uma mula
sem ganhar uma rupia
trabalho como uma mula
sem ganhar uma rupia

eu quero é ruupiaaaa
a mais rupia é minha
ninguém tasca, eu vi primeiro
eu quero é ruupiaaaa
a mais rupia é minha.................................



como uma mula

como uma mula eu reformulo
as mesmas frases
mudando palavras e talvez
algumas crases

como uma mula eu fico preso
ao que me cerca
se eu passar a primeira cerca
tem outra na minha reta
se eu for desobediente
é bala na minha testa

como uma mula estou junto
a outras mulas
tem quem viva e não se importe
e outras só simulam
e outras só simulam
e outras só simulam

como uma mula eu vejo os dias
passar no calendário
as folhas pulam e caem fora
e não cai o meu salário
e nada do meu salário
a droga do meu salário

como uma mula eu trabalho
todos os dias
(((exceto feriados)))
no departamento circula
grande quantidade de mulas
propina, débito em conta
laranjas, cheques sem fundo
sobre o lombo cargas em dobro
e drogas do submundo
e drogas do submundo
e drogas do submundo
e dólares na cueca
e drogas do submundo
e notas ultra-secretas
e drogas do submundo


15 de fevereiro de 2021

Blindagens

Estava inquieto para escrever. Meu cérebro geralmente está assim. Mas não sabia exatamente o que colocar no papel. Cronologicamente estamos no feriado de carnaval durante a pandemia. O primeiro carnaval evidentemente pandêmico, embora muitas pessoas ignorem esses sinais, alertas e riscos. Tentam uma normalidade inexistente. Pouco mais de 2% da população foi vacinada, uma para cada 50 pessoas. Mesmo assim, festas clandestinas em diferentes locais, sobretudo ao litoral.

Creio que minha mãe perdeu parte do gosto pelas praias ao ver imagens na televisão. Ela quer se mudar para perto do oceano, mas acaba balançando suas estimativas a partir desses contratempos. Meu pai recebe SMS da irmã dele, geralmente com agradecimentos por depósitos feitos ou informando sobre a saúde dos demais irmãos. Não é boa a situação dos tios. Receio que a continuidade dos fatos estremeça a relação positivista com que meu pai sempre encarou a vida e eu discordava. Mas é complicado discordarmos sem entendermos o que move e dá forças aos demais continuarem. Enquanto me blindo em pleno pessimismo e tentando assimilar os assustadores realismos que nos cercam, meu pai talvez se feche em pensamentos otimistas que o mantenham íntegro, com força para comprar algo na padaria, abastecer o carro e fazer serviços manuais, sejam mais ou sejam menos urgentes.

Eu estava refletindo sobre minha necessidade de estar sempre refletindo. Sou assaltado constantemente por pensamentos insólitos, transfigurados, adjacentes, entrecruzantes, enviesados. Mudo de assunto com rapidez. Crio uma ilusão de que minhas reflexões são mais importantes do que outras coisas. Passo-as ao papel no ritmo voraz da urgência. Na verdade, desabafo com menos funcionalidade e interferência ao mundo externo do que qualquer mascote ou palhaço fantasiado em frente a farmácias econômicas, anunciando descontos e tentando convergir clientes ao local. Qualquer vendedor de vale-transporte ou de equipamentos para bolhas de sabão, na luta diária pela sobrevivência, está mais interagido com o mundo.

Mas talvez esse seja o meu modo de lidar com as situações. Muito mais introspectivo e criativo textual do que os demais habitantes. Compartilhei uma campanha para ajudar um cão atropelado. Chamada vaquinha virtual. Para além de auxiliar esse pobre indivíduo, pensamos nos todos recolhidos e amparados pelas mais diversas ONGs, em parceria ou não com os poderes executivos municipais ou estaduais. Cães, gatos e outros animais, os outros que podemos comer à mesa. Socialmente aceito.

Outro dia eu caminhava pela avenida mais badalada da cidade, com os melhores imóveis, modernidades, novidades, gente se exercitando, carros à mostra, exibicionismos, restaurantes mais caros, inclusive um constatado que filava energia elétrica. Roubo. Bom, por ali eu me deslocava e reconheci um senhor de meia-idade que, na dificuldade do alto índice de desemprego, empunha um cartaz em busca encarecidamente de moedas, dinheiro para se alimentar e cruzar o facho de mais um dia. Parei diante dele, me atrapalhando com as palavras para informar que já o conhecia de ali passar outras vezes e que dessa vez iria ajudá-lo. Remexi meus bolsos, enrolado junto com minha língua que não pronunciava as melhores palavras para ocasião, acrescentado o efeito de estar por trás da máscara de tecido pela prevenção do vírus pandêmico. Ele também estava assim. Consegui sacar os dois reais que pretendia contribuir com o dia daquele cidadão. Não ganho para estar distribuindo mais do que isso. Tenho receio de meu próprio futuro. Tenho total desacostume com a rotina laboriosa. Fui criado dessa forma, infelizmente. Em uma aparente tranquilidade que de modo nenhum combina com a sociedade brasileira. A luta é diária. O lutar é exaustivo. É preciso seguir de algum jeito.

Me blindar com o pessimismo nem sempre vai resolver, é necessário interagir com as batalhas. Com os demais humanos e, nisso tudo, agraciar aos bichinhos. Os que não comemos. É duro tentar fugir da hipocrisia. Ela nos persegue. Pensei nessa frase anteriormente: enquanto buscamos o elixir máximo e inalcançável da justiça, nos persegue o bafejar constante e irrequieto da hipocrisia. Somos todos hipócritas. É muito difícil, senão impossível, escapar do aprisionamento da contradição.

Meu pai, ao contrário, se blinda em um otimismo que também nada combina com a sociedade brasileira. A cada SMS que recebe, informes de piora da saúde familiar, a televisão desde suas manchetes e complementos reportagens de que as coisas pioram. Desemprego, saúde, aumento da miséria, violência urbana, racismo combatido, racismo que combate, fascistas e antifascistas e antifascistas facistas. Tudo isso nos cerca.

No caos total, provavelmente meus julgamentos são muito duros. Às vezes com os outros e constantemente comigo mesmo. Já esperávamos pouco, mas permanece seguidamente a sensação de que podíamos mais. Correndo atrás da desabalada carreira da justiça, tentando vencer, ficar à frente da hipocrisia, mas lado a lado com ela.

14 de fevereiro de 2021

6 de fevereiro de 2021

eu quero uma guerrilheira

eu quero uma guerrilheira

enquanto eu cuido da casa

ela luta na trincheira

eu contra o nome no serasa


eu quero uma guerrilheira

armada até os dentes

ela luta contra a polícia

e eu pra vencer a preguiça

e eu pra vencer a preguiça


eu quero uma guerrilheira

brasileira procurada

que eu ajude a esconder

suas identidades falsas

suas identidades falsas


eu quero uma guerrilheira

que chegue tarde em casa

chegue meia-noite e meia

e coma a janta requentada

e coma a janta requentada


eu quero uma guerrilheira

fugitiva de aparelho

que se veja no espelho

no semblante muita estrada

com sua vista cansada

guerrilheira da pesada

guerrilheira da pesada


eu quero uma guerrilheira

solteira por opção

marxista-leninista

sem medo da prisão

sem querer desistir

mesmo com medo da prisão

Explicações

Ao invés de me explicar, tive que me explicar porque não me expliquei. Não queria me explicar. Nem me explicar porque não me expliquei.

4 de fevereiro de 2021

Manual de etiqueta

Conversava sobre como se entreter, mesmo que infantilmente, nos restaurantes. Abordava o assunto rememorando quando eu era mais jovem. Sempre gostei de me alimentar em casa. A comida de minha mãe era muito, muito boa. Acima da média do que os restaurantes podem me oferecer. No custo-benefício então, nem se fala. E eu apertava a mão (mão de vaca) nessas questões. Meu jeitinho. Enfim, gostava de comer em casa e saía com o pessoal. Mas o pessoal, no improviso, seja por não terem uma mãe como a minha, seja por necessidade de horário, gostavam improvisar ou APROVEITAR o momento reunindo as pessoas para uma ocasião especial: a jantar.

Enfim, muitas vezes eu poderia já ter comido em casa, como era minha preferência. Assim, se me reunia cedo demais com os demais, precisava encontrar métodos de aproveitar o tempo nos ambientes tediosos que podem ser os restaurantes se você já comeu ou está sem fome. Conversando com Camila, pensava sobre como servir de passatempo. As ideias foram surgindo, sempre no improviso do aproveitamento de todos os objetos possíveis, de guardanapos a palitadores de dentes.

Nã, nada de poesia de guardanapo. A caligrafia neles sai tão ruim que só seria aproveitável caso fosse a urgência de esquecer uma ideia. Mas, vá lá, bastante já enviei mensagens de texto para mim mesmo para não esquecer algo. Hoje em dia bloco de notas, grupo solitário no whatsapp e tantas outras opções semelhantes são possíveis. O guardanapo não me agrada para esses fins. Mas ele está entre meus métodos preferidos de pirralhear em restaurante.

Os canudos, ela sugeriu colocá-los na boca e fingir ser um inseto. Uma mosca. Criativo. Pensei naqueles canudos - quase todos - encaixáveis nas suas extremidades. Pessoal gostava de desperdiçar dessa maneira. Acho que desde a época eu não aprovava muito. Hoje menos. Engenharia desnecessária que me irritava um pouco. E tantas as legislações que estão proibindo os canudos plásticos. Deixemos eles de lado.

Em casa ou em casa de amigos e parentes próximos, com a segurança e confiança que o utensílio possa proporcionar, seria possível girá-lo no dedo. Não no ar, na ponta do dedo, mas apoiando o indicador sobre o prato e fazendo-o girar entorno do seu próprio eixo, criando um efeito visual interessante. Além do efeito visual que o prato em movimento pode aplicar, ele também serve como instrumento musical. Os talheres como baquetas e o som é garantido. O copo e sua transmissão de ondas sonoras também pode ser assim aproveitado.

Mas o meu preferido, como bom fã de basquete, era arremessar os guardanapos usados contra o copo dos convivas. Eles que perdoem, mas isso nunca perde a graça quando o arremesso é certeiro. É preciso direcionar o tempo certo para essa façanha. Em festas de aniversário, casamentos e formaturas, então, após o pouco do álcool encorajar ao fazer efeito no organismo, a sucessão de arremessos é garantida. É preciso não começar a noite dessa forma imatura. Não. Ao longo da jornada, ganhará o arrojamento necessário e saberá o timing destinado à essa atividade encantadora. As pessoas já devem ter degustado suas bebidas nos copos e taças. Taças o tanto melhores porque mais largas possibilitam melhor índice de acerto. As pessoas já beberam nelas, ou seja, já tiveram a oportunidade de desfrutar do uso típico a que são destinados os utensílios. Porém, quando acham que podem repetir mais uma rodada ou dispor do desembuchante para a sequência de salgadinhos ou outros comes - PÁ - você mirou e tacou-lhe o guardanapo amasado direto no gargalo. A pessoa pode ter visto ou não visto. Pode ser surpreendida, pode rir ou ficar irritada. E o efeito em nós, caçadores natos, é o cômico de qualquer maneira. Azar o delas. Sim, sim, um dia seremos vítimas, prejudicados pela própria (quase) inocente brincadeira, mas as lembranças passadas nos serão válidas na memória. Dias de caça e dias de caçadores. Sobretudo, noites, como bem entenderam.

Atividades também com selo certificado, mais do que indicado, para churrascos em família e outros almoços e jantares. Boa mira e façam bom proveito.