20 de julho de 2017

A Seita

Tudo começa em um ambiente de bar onde me encontrava alcoolizado. Outras pessoas estão por lá e me retiro rapidamente para ir ao banheiro, enquanto ninguém se importa, pois estão todos bêbados. Não encontro exatamente um banheiro como desfecho, mas somente uma calha no chão que vem bem a calhar, no pátio. Urino por ali mesmo, me perguntando se era o melhor lugar possível e, se caso viesse outra pessoa para o mesmo local, se eu seria xingado por tal ato. A situação passa, mas no dia seguinte estou sendo perseguido.

Estou em um pátio interno de um grande, imenso prédio. Um prédio antigo que me cerca, com o comprimento de uma quadra inteira de largura. Sou perseguido pelo que se assemelha a uma gangue e preciso correr, apenas sei disso. Estarei frito. Começo a correr e logo a pular para subir até o alto de umas telhas. O cenário se parece com o histórico e centenário colégio Gonzaga. Olho para trás e ainda estou seguido. São muitos. Não zumbis, mas uma gangue inteira, um deles bastante alto e bem próximo. Dos telhados, escalo uma grade branca de um portão. Chego a pensar se sou capaz, mas consigo, sabendo que obviamente meu perseguidor há de conseguir. Ele segue no meu encalço pelos telhados e salto de uma grande altura rumo ao concreto, mas aterrisso bem, até me dando ao luxo de virar-me de costas e ver a que distância ele está de mim.

Como ele é maior, suas passadas são mais largas e sei que não vou fugir para sempre. Chego a planejar um enfrentamento corpo a corpo, mas não tenho chances por seu tamanho, apesar do instinto vívido. Além disso, quando ficamos frente a frente como lutadores a esperar o golpe, surgem outros da gangue e meu destino é selado. Corria comigo meu amigo Gustavo, que também é capturado. Quando me dominam de vez, colocam-se um saco, algo de pano que cobre minha vista.

Só retomo o poder de averiguar quando estou em uma condução completamente escura e cercada pela gangue nos assentos em volta. É menor que um ônibus, mas me parece maior que uma kombi ou van. Os caras nos dirigem olhares como "o que vamos fazer com vocês?", mas o chefe maior ali não parece incomodado e logo nos revela o plano de nos anexar ao trabalho da gangue. A condução completamente escura segue por um asfalto que seria da avenida Bento Gonçalves. Noto momentos como se estivéssemos na contramão e outros em que parecem outros veículos como os irregulares no sentido. Tudo isso baseado na maioria dos veículos que seguem. Parece uma avenida de três pistas, duas para ir e uma para vir.

Para agradar minha surpresa, há mulheres na condução, provavelmente as que desejam estar com o poder da gangue, drogas fáceis ou mesmo admirem os caras. A mais bela está a meu lado quando revela que "não posso ficar com você, não nessa condição de recém capturado". "E é só por isso?", eu lhe devolvo em sorrisos. Ela apoia sua mão sobre a minha e repito o gesto, algo bastante sutil e discreto, para não despertar suspeitas dos demais. Me pergunto, nisso tudo, quem está conduzindo a van grande ou micronibus.

Chegamos finalmente pela sequência no asfalto no que ainda parece uma rua bastante central, com um centro comercial enorme e também do tamanho de uma quadra. Todos descem na parada e tomam seus postos. A rua é fechada em uma quadra com cavaletes, o terreno é todo da gangue, da boca, eles mandam no espaço. Vigiam, se divertem, demonstram seu poder em frente ao colossal empreendimento. As garotas acompanham, não vejo mais a que estava ao meu lado. Ela tinha as maçãs do rosto bastante saltadas, uma franja, cabelos castanhos, olhos grandes. Uma Mia Sara nessa delicada situação em que eu era prisioneiro e começava a ter a confiança do chefe do esquema.

Em frente ao estabelecimento, uma mesa inteira repleta por uma grande torta, um grande bolo branco com merengue e confetes em cima. Dá vontade de servir-me, assim como meu amigo Gustavo, que agora era Igor, teve a ideia de ir até ali e, mesmo na condição de recém capturado, saciar sua fome com alguns dos demais. Fico mais pela calçada da frente, a escuridão nas ruas e meu estado ainda estupefato por vivenciar tudo aquilo. Não avisei em nada meus pais, não sabem onde estou, nem eu direito sei. Devo trabalhar para eles, servir essa quase seita, essa movimentação que lida com ilícitos, possui muitos menores de idade, mas que não é combatida, mesmo estando esparramada pelas calçadas e o meio da rua.

De momento, está parada ao meu lado Pâmela. A reconheço pelo cabelo e a pinta no rosto. Estranho vê-la ali. Estaria eu em Pelotas ou Porto Alegre? Mas ela confirma rapidamente que está de passada por ali. Não recordo meu diálogo com ela, mas poucas frases depois desaparece e, após eu olhar para frente, para voltar o olhar ao lado no meio fio, ela e um amiga já não se encontravam mais ali. Comento com um garotinho que fui deixado falando sozinho, já agora me direcionando a ele. Impressionante como não deixei de lado a postura de demonstrar fraquezas sociais, quando deveria manter uma postura de seriedade e devoção a tudo aquilo. Eu poderia ser expulso por não satisfazê-los a qualquer momento. A gangue, composta em sua maioria por mais pobres e por mal encarados, me olhava estranho. Talvez também por suspeitar da ação com uma das meninas, sendo eu um mero recruta de início.

Em outro momento, me sinto sozinho e deslocado, mas falo com uma mulher mais velha. A um soar rápido como o de uma sirene, antes que eu possa entender, vários se deslocam da calçada e vão ao meio da rua para dançar em pares. Aproveito a desconhecida presença dela e formamos um par, no que parecia obrigação a todos os presentes ali na frente. Tão rápido como ela surgiu, em alguns giros da coreografia improvisada, vira-se para mim um garoto mais novo, um gordinho que me surpreende por estar, do nada, dançando comigo. Explico a situação que poderia constranger-nos, mas ele leva como se fosse algo comum a acontecer na seita.

O fim da missão é em outro toque, quando todos voltam em fila para dentro e conheço os aposentos, em uma estreita fila que segue junto à parede de entrada pela direita da porta. Um a um as pessoas adentram para o salão central, um saguão enorme, com catracas para confirmar as entradas e duas mesas, uma em forma de retângulo, que contorna todo o perímetro do salão e uma comprida mesa central. Estou escalado, pelo ingresso que me deram e pela catraca que passo, a comer na mesa central. Sento próximo à cabeceira, com medo de alimentar ódio dos demais membros há mais tempo, por estar, provavelmente, muito próximo de onde o chefe vai sentar. Antes de esperar a refeição, acabo acordando da estranha história.

18 de julho de 2017

Essa gente que nem sente
O gracejo da ironia
Gente tão exigente
Nem vê o nascer do dia

15 de julho de 2017

Marcado pelo Mercado

No fim das contas
No fim das compras
Tu sabes que não precisa
O mercado, aquecido
Te batiza
No fim das contas
No fim das compras
O gado é sempre marcado
Marcado pelo mercado
Volte sempre
Obrigado

Quero-Quero

Quero morrer
Duas vezes por mês
Mas só se morre
Uma vez
Não adianta querer
E depois
Querer viver

13 de julho de 2017

Geo-Grafia

Sou um poço de ironia
O horizonte é um monte
Um monte de geografia
O horizonte que aponte
Um monte de biologia
Apesar daquela tática
Tática de ter
Matemática todo dia
Sem escolha na escola
Hoje não escolheria
A teimosia matemática
Temática que eu esquecia
Ao ver no horizonte
Toda aquela geografia
Litoral norte gaúcho (Foto: Henrique König)

Adega Adequada

Escrevo apenas
Escrevo atenas
Cenas que ninguém vê
Tão distantes do horizonte
Dos números da TV
Escrevo como quem procura
O trevo de quatro folhas
Escrevo como quem pudesse
Ter na vida mais escolhas
Escrevo como quem procura
A cura dessas chagas
Como quem procura
A chave dessa adega
A poção mágica de um só gole
Em que se escolhe dizer: Chega!

12 de julho de 2017

Colchetes

Fui escrever
Sem querer deixar a cama
Sem querer
Risquei o tecido que me cobria
Um ato de desatenção
Estava atento na poesia
Mas mãe
Não fiques brava
Por essa colcha riscada
A vida do poeta
É cometer riscos
Toda coberta que o envolve
É uma colcha de letras móveis

No Fim das Contas

Varredura, martelada
Dobradiça, ferro, motor
Construção, meio fio, calçada
Pavimento, elevador

Trabalha
Trabalha
Trabalha

Rala
Rala
Rala

Bate ponto
Deixa pronto
O sistema não tem falha

Trabalha
Trabalha
Trabalha

Rala
Rala
Rala

Prefeitura, conta paga
Ponte levadiça, trator
Caminhão, esmeril, farda
Orçamento, aparador

Trabalha
Trabalha
Trabalha nessas tralhas

Rala
Rala
Trabalha
Procura no fim dessas tralhas
Duas coisas que querias

No fim do dia
A família
No fim da vida
Se der tempo
A aposentadoria

11 de julho de 2017

Juninas em Julho - Não Enjoo

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König


Foto: Henrique König


Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Foto: Henrique König

Animais - Ame Mais

Estive com animais de estimação
Estimando a ação
De Amar
Estive com animais de estimação
Com nome nenhum
Ou com nomes comuns
Mas para mim especiais
Especialmente por serem
Tão somente animais
Mel (Foto: Henrique König)

Porto Velho

Porto
Horto velho
De meu encontro
Comigo mesmo

Sopro vivo pelo vento
Só lamento
O tempo morto
Absorto em pensamento
Foto: Henrique König

7 de julho de 2017

Pureza

História verídica. Uma vez, nos anos 1980, meu pai estava num supermercado de Santa Catarina. Havia um jovem rapaz, de descendência germânica, cabelos compridos, mas não tão compridos como usaria mais tarde. Ele olhava com curiosidade para uma embalagem de plástico. Tratava-se de um guaraná colocado na gondola do supermercado. Ele viu meu pai próximo a ele no corredor e resolveu perguntar.
- Com licença, cara, mas sabes me dizer o preço desse guaraná?
Realmente não havia etiqueta que indicasse o valor daquele estimado guaraná para o alemãozinho e meu pai viu que se tratava do famoso Guaraná Pureza.

- A dúvida... A dúvida é o preço da Pureza... E é inútil ter certeza.
O rapaz alçou as sobrancelhas e não hesitou em preencher o carrinho com uma dúzia de garrafas de guaraná Pureza. Agradeceu meu pai e se dirigiu ao caixa.
Quando ele voltou ao Rio Grande do Sul na semana seguinte, estava fundada a banda Engenheiros do Hawaii. A frase de meu pai foi empregada em uma das músicas de maior sucesso da banda gaúcha.
O homem curioso pelo preço do guaraná era nada mais nada menos do que Humberto Gessinger.