29 de outubro de 2023

Sinto raiva das situações do mundo, depois um marasmo de pena de quem nem tem condições, mesmo de saúde, de articular diferente.

13 de outubro de 2023

Guerra e Humanidade (1959) - Amor Maior Não Há

Um filme que deveria ser visto e revisto até hoje.


O filme Guerra e Humanidade, do diretor Kobayashi, de 1959, retrata tempos de Segunda Guerra Mundial entre Japão e China. Os japoneses detinham o poder e escravizavam os chineses. A história conta o personagem principal enviesado entre muitas encruzilhadas, termo inclusive utilizado na narrativa. Ele estava para casar com o amor de sua vida, mas tinha o receio de ser convocado para o exército japonês. Em seus estudos sobre os campos de produção, acaba recebendo a oportunidade de controlar uma mina de extração, com milhares de trabalhadores chineses sobre o controle dos japoneses. Em estimativas do filme, eram mais de 10.000 homens em supervisão daqueles poucos japoneses.

Como recebeu este emprego para ser um dos supervisores da mina, levou sua nova esposa a este local afastado, uma terra hostil, dominada pelos homens e com pouquíssimas mulheres. Tão adverso e arisco eram o clima da localidade que os escravizados não possuíam a mínima chama feminina para atiçar seus corpos, de modo que um serviço de visitadoras, muito semelhante ao que veremos em Pantaleón e as Visitadoras, livro do peruano Mario Vargas Lllosa, acaba aparecendo na trama. São algumas prostitutas que serviriam de consolo e de aparição como recompensa aos exauridos trabalhadores chineses.

Esta primeira parte da trilogia Guerra e Humanidade chama-se Não Há Amor Maior (1959), contando a história do Sr. Kaji, o personagem principal. Ele possui livros do mundo ocidental e é um grande humanista, mas tem seus valores totalmente colocados à prova através das situações adversas que tem de encarar. São líderes oportunistas, corruptos, relatórios falsos, crimes de guerra, torturadores, trapaceiros e subordinados ao exército japonês tendo de conviver com a violência, a retaliação, os excessos de poder e uma tremenda injustiça. O Sr. Kaji e a esposa tem a convivência posta à prova durante toda a trama, escapando de uma situação e logo tendo de resolver outro infortúnio. As ordens superiores são injustas, os relatos dos acontecimentos, da violência gratuita são falsificados. Trabalhadores que são agredidos até a morte são postos em relatórios como fugitivos ou acidentados. A produção de alimento e a distribuição são escassas e injustas. Os chineses estão esgotados de trabalhar para os inimigos e sem recompensa, ameaçando fugas e rebeliões. O Sr. Kaji tem de pacificá-los, conter as investidas e negociar futuros ainda promissores para esses pobres prisioneiros de guerra.

O alto comando japonês, quando acionado, pressiona Kaji por mudanças, por uma produção efetiva. Eles esperavam angariar da colheita 20% de aumento na produção. Não importa pelo que tenham de passar por cima. Por mortos, por esgotamentos, por torturantes jornadas de sacrificante trabalho. Mas Kaji, como dito, é um humanista e observa essas situações incrédulo de tamanhas injustiças, prometendo e pondo em práticas soluções que obviamente desagradam seus superiores e parceiros no comando da interiorana mina em terras chinesas.

Kaji vivencia a traição por todos os lados. Seus negociantes do lado dos representantes dos trabalhadores chineses o traem. Ele se decepciona, ameaça não ligar mais para as reivindicações e condições trabalhistas deles. Mas o coração de Kaji segue posto à prova e ele vai até as últimas consequências por aqueles homens antes desconhecidos, não importando suas origens ou pequenos ou maiores erros passados. O filme todo se desloca em uma trajetória não de santos, mas de homens passíveis aos erros e questiona o valor das desgraças que podem ser depositadas sobre esses desafortunados sujeitos. Kaji circunda por suas temíveis encruzilhadas, sinucas difíceis, quase impossíveis de resolver. Nos questionamos durante as peripécias o que poderíamos fazer no lugar do jovem japonês, de 28 anos, um emprego inusitado e a constante ameaça de perder seu encargo e ainda ser ameaçado de torturas, agressões e até do sumiço como a morte que facilmente poderia ser falsificada em mentiroso relatório.

Kaji convive com as prostitutas que visitam os trabalhadores, com os próprios milhares de mineradores, com os controladores dos suprimentos, guardas, encarregados do exército japonês e outros fiscais e administradores. A corrupção é uma prática frequente, retrata os extremos que ação e pensamento humanos podem chegar em tempos de escassez, guerra, conflitos, animosidade entre etnias, e mesmo entre homens que - teoricamente - lutam pelo mesmo lado de uma guerra. Tantos tentando obter vantagens sobre seus semelhantes, os excluindo, os oprimindo, lutando por seus cargos ou simplesmente por seus pedaços de sobrevivência.

Guerra e Humanidade inicia a trilogia com esse episódio da vida do Sr. Kaji em cerca de 3 horas e 24 minutos de filme. Mostra os excessos da guerra, as injustiças, os comportamentos doentis e fanáticos dos exércitos nacionalistas que até hoje habitam nosso mais ou menos estimado planeta. Mostra a dificuldade da manutenção de valores humanistas iniciais, presentes na teoria bem desenvolvida dos livros, inebriantes na hora do vamos ver da prática. Os desafios do Sr. Kaji deveriam ser vista obrigatória a estudantes, pessoas de todo o mundo, pessoas que desconhecem as práticas sacramentadas e repetitivas da crueldade dos exércitos, os roubos, os excessos, as torturas, os estupros, as condições de vida precárias a que são submetidos seres humanos que como culpa carregam apenas sua etnia ou local de nascença. Um filme pouquíssimo comentado, mas, até a presente hora, contando com minhas cinco estrelas depositadas em nota e com um alta média 4,5 através do aplicativo de catálogo de filmes do Filmow.

Recomendação do primeiro ao último minuto das mais de três horas de duração e lançada minha ansiedade para conferir os outros dois episódios dessa trilogia do diretor Masaki Kobayashi.

12 de outubro de 2023

Elena (2012)

Há o que achamos genial. E há o que não entendemos.


Assim começou o documentário Elena, de 2012. Não havia entendido se a moça que havia ido a Nova York estudar teatro era Elena ou sua irmã, Petra, que nos mostra em imagens resgatadas por ela sua vida em convívio com a irmã. Petra Costa é a diretora que assina a obra.

Entre os comentários que vi sobre a película, o destaque é a sensibilidade apresentada nela e não podemos fugir do comentário sobre o grande acervo de imagens da vida das irmãs, que tinham ainda a influência de uma mãe que fez um pouco de cinema em sua juventude. O filme é repleto de referências de como Elena serviu como inspiração para Petra. Uma relação muito próxima entre irmãs, de mais velha para mais nova. Uma família que vivenciou as dificuldades do período da ditadura militar brasileira, suas restrições e possíveis perseguições políticas e depois tentou vivenciar, respirar a arte, em um ar ainda rarefeito no cinema e no teatro nacionais.

Elena tenta ganhar a vida em Nova York. É outra realidade, são outras oportunidades, a ansiedade pelo que pode ou não dar certo. O coração da jovem fica dividido. A espera por um sucesso que não vem. Um talento que não se desenvolve ou não é valorizado. A espera, o compasso longo de uma espera duradoura. Elena vai e a família a acompanha, no caso a mãe e a irmãzinha Petra, bastante criança, pequena, de lembranças vagas, suscitadas ou relembradas através do acervo de vídeos caseiros. Petra é treinada por Elena para também ser atriz. Vídeos caseiros em brincadeiras, vestuário, atuações, banhos e desempenhos. Muitos de nós sonhamos em ter imagens registradas para posteridade através de uma câmera vista de forma amadora.

Petra reconhece a dificuldade de adaptação em uma Nova York de costumes diferentes, de idioma diferente, pois tinha que aprender a duras custas o inglês, do frio diferente do Brasil mineiro ou carioca. Para além da dificuldade de Petra, que era contornada com o passar dos meses em adaptação aos Estados Unidos, Elena passou pelos percalços daquele longo compasso de espera. A depressão contínua, os dias e as noites em muito sonho e pouca atividade, em depressão profunda sobre a cama. A promessa de ligações que não vinham, convites não depositados, atuações que nunca existiram fora dos registros amadores. Sonhos despedaçados, até que ela não resistiu mais e concluiu-se de uma forma bastante estadunidense.

Para Petra ficaram as lembranças, os registros, a admiração jamais cessada, a saudade, palavra bastante portuguesa e contínua, os olhos distantes e jamais consolados no olhar da mãe. "O que houve, mãe? Está com o olhar estranho." "Estava pensando em Elena." Cena que se repetia no dia a dia das remanescentes neste plano.

Para parte final do filme, finalmente entendemos quem era quem. Ou não. Quem havia ido a Nova York estudar teatro. Quem depois estava proibida, ao chegar à idade de prestar vestibular, de escolher teatro e de escolher, entre tantos destinos possíveis pelo mundo, a mesma cidade de Nova York. Se respondem perguntas lá do início documentado, de como era impossível, e ao mesmo tempo tão palpável e presente, encontrar Elena por alguma das infinitas ruas paralelas da grande maçã Nova York, na terra das oportunidades, mas também de opressões, dos sonhos que vingam ou que se vão atrás de portas de repetidos apartamentos.

Fico pensando que pouquíssimas pessoas teriam a oportunidade de realizar um documentário desses, seja pela banalidade de nossas vidas, seja pelas poucas oportunidades de entender de direção, edição e adaptação para cenas, seja pelo pouco acervo que reservamos em nossas casas sobre nossas famílias, nossas infâncias. O filme corre muito mais por narração de Petra sobre o que lembra ou inventa, através das imagens salvas em filmagens, do que com entrevistas novas, que também estão presentes ao tentarem reconstituir o trauma que, na verdade, lhes ocupou eternamente o âmago. Esta é Elena, viva nas imagens, nas lembranças, em olhares distantes e no coração de sua mãe e de Petra, petrificada, mas insinuante e plena.

11 de outubro de 2023

O futuro do turismo

Ao mesmo tempo em que a modernidade, a globalização e as grandes empresas povoam os mais longínquos rincões da Terra, em um ar de familiaridade, de uniformidade e padronização de cada canto, tornando-os os mesmos, ao mesmo tempo perde-se a devota cultura ancestral, a particularidade, o enriquecimento, a soma, as diferenças que nos fazem mais fortes. Essas diferenças sejam elas étnicas na miscigenação, na beleza das diferentes arquiteturas, na soma gastronômica e culinária de nossos estômagos que anseiam o distinto. A diversidade de modelos, de possibilidades, de ruas, de escolhas, de cores, fragrâncias e estilos. A padronização global impõe as mesmas peças, os mesmos moldes, as mesmas formas e atitudes. Ao passo que nos dão a segurança de conhecermos como funciona um shopping center - palavras inglesas, estrangeiras, mas globais -, ou um aeroporto, nos tiram, nos podam o eterno anseio, a graça pelas novas descobertas, o calafrio inquietante diante do desconhecido, o enriquecimento cultural e uma das verdadeiras vontades que nos fazem deixar o sossego de nossas casas rumo a novas experiências.

Pontes estaiadas pelo mundo, numa uniformidade que nos orgulha estarmos defronte a uma delas como se estivéssemos nos Estados Unidos ou na China, mas que ao mesmo tempo nos bloqueia alguma das vontades de para lá nos deslocarmos. Fast foods globais, que nos dão a certeza do que pedir ao sair de casa, mas trazem um desnecessário conforto que não mais queremos. Queremos explorar o diferente, experimentarmos novas receitas e medicinas. Buscarmos novos gostos e tradições que nos acrescentem.

Um mundo que se uniformiza também se limita. A pobreza de opções nos sai cara. Os avanços milenares e globais também se deram pelos cultivos distintos, pelo comércio de importações e exportações e não pela boiada, eucaliptos ou soja que a tudo dominem entre nossas fronteiras.

10 de outubro de 2023

A vida é só o tempo entre o florescer e o perder as pétalas.

Ou se lamenta que não floresceu. Ou após se lamenta que perdeu as pétalas.

1 de outubro de 2023

Meu pensamento é uma cinemateca que jamais será exibida.


Melhor do que lembrar tudo que se deseja é esquecer tudo o que se quer.


Frases de Rogério Sganzerla