28 de abril de 2018

re(in)trospectivo

Juntam-se muitos eventos neste meu sábado que inicia na madrugada. Do aniversário do meu pai ao de um grande amigo que fiz. Jogos do Grêmio contra o Botafogo de meu pai e jogo do Brasil de Pelotas, que eu vou transmitir simultaneamente ao horário do Porto Alegrense. Além disso, duas formaturas, as que tenho reservadas ao mês de abril que vai se encerrando. Coisas que acontecem e se sucedem em minha vida, as formaturas aguardadas no mesmo dia, na mesma noite. Revezar entre elas, aproveitar ao máximo nenhuma, mas procurar aproveitar ao máximo a estada em cada uma. Assim é a vida, suas escolhas, renúncias e disparates do tempo.

Explanação demais sobre a minha vida. Vim tecer linhas de teimoso que sou eu, lata vazia à minha direita, coração esvaziado ao centro, com a ponta para a esquerda, é isso que dizem? Que seja. Durante a semana, dois dias antes foi o aniversário do Farroupilha da cidade de Pelotas, clube que muito bem adotei aos meus gostos e reivindicações. Tenho e prezo um carinho imenso por tal. Trajei minha camisa para percorrer as ruas do centro, sob olhares curiosos e saudosos para um jovem com a vestimenta de um dos clubes de seu miocárdio. Algum problema comigo? Creio eu que cruzei com o comentarista Caldenei Gomes, mas quando percebi que seria ele já havíamos nos despistado da calçada.

Não há rosto mais antigo impassível à camisa do Farroupilha. Recordam que já torceram por ele, ou recordam gente que torceu ou ainda torce. Recordam um pai, um tio, um amigo, um tempo remoto no estádio Nicolau Fico. Recordam um jogo que passou e abrem o baú dos fundos do raciocínio. Assim é a reação quando vista a camisa do Farroupilha nos dias atuais. Quase todos desconhecedores de ser um dia de mais um aniversário da agremiação quase centenária. 92 anos fazia, o campeão gaúcho de 1935, o maior torneio gaúcho da história, o maior estadual, o de centenário da revolução farroupilha.

Tempos difíceis ao futebol do interior. Outros apontamentos dos tempos? Oh, como de sempre faço isso. Dos cuidadores de comércios de esquinas, voluntariosos na função de cuidarem o movimento, encararem uns, cumprimentarem outros. Seguranças e porteiros. De um, de dois, de três comércios, dependendo. Juntando uns pilas no mundo atual. Uns ao celular, quase que bem distraídos.

O calor do centro foi enorme em pleno abril. Comprei uns livros, dos quais apareceu uma confusão sobre tudo que já aconteceu em Londres, um sobre o caçador dos mitológicos nórdicos Trolls e, para mim, a iniciação no universo kafkiano e mais umas ideias do tal argentino Julio Cortázar, ao que tudo indica, um dos maiores do país cisplatino.

Na compra da livraria em formato sebo, a descoberta que a outra pessoa fora o gordinho tatuado que eu nunca vi além de atrás do balcão, é a esposa ou namorada dele. Fiz o possível para evitar um contato mais próximo, embora ela insistisse a arrumar livros próximos a mim. Até a maldita da pequena escada fez questão de pegar para dificultar minhas leituras de orelhas e contracapas. Mas consegui fazer as devidas escolhas. A outra mulher que entrou na livraria parecia-me mais nova pela visão periférica e voz doce e gentil com a qual se comunicava, mas logo notei, ao me dirigir ao caixa do gordinho do balcão, que ela tinha idade mais avançada que os funcionários do local.

Assim foi a aventura de compras em uma livraria retrô utilizando uma camisa relativamente nova de um clube essencialmente retrô. Assim seguia o verão improvisado mesmo ao fim de abril, completamente fora de época. E fazia minha dedicação e preparação rumo ao sábado de acontecimentos. Sábado estando a acontecer. Com tecer. Conte ser.

24 de abril de 2018

gado leiteiro

a fita
a fita métrica
é o bafômetro
do poeta

não tem como
o poeta embriagado
gado leiteiro
de orgasmos silábicos

sim, lábios
assopram
bafômetros
assombram

métricas
antiéticas
com nossos delírios
com nossos deleites
de gado leiteiro

óleos, azeites
olhos, enfeites
não aceites
essa metrificação
petrificação
do coração produtivo
do gado letreiro

a melhor

poesia? não sei se esta, esta que acabamos de dar à luz é a melhor. (leram o texto ordens e desordens deste que agora vos fala na caligrafia muda que as teclas tingem?) mas no momento é a melhor. a melhor na eternidade deste breve momento, compreende?
tipo, nesse momento em que as outras não se apresentaram. ou se atrasaram, ou se arrastaram, ou recusaram o chamado pra voltar à memória. ou ainda não vieram. ainda nem nasceram e vão precisar aguardar mais para concorrer. logo, esta última é a melhor. ora, se é! a melhor deste breve relento...

oi, posso?

entre o mato e o mar grosso
há tantos troços
e outros tantos
destroços
facas
copos
baratas e
ossos
águas
minerais
e poços
esgoto
enxadas
fossas
e fossos

há tantos gostos
e outros tantos
desgostos
música
funk
harpas e
bossa
cores
vermelho
anil
verde e 
rosa
calor
frio
febril e
coça

há tantos julhos
e outros tantos
agostos
tempo que passa
e vem setembro
e vem e vem
e já não lembro
dos postos
dos restos
do enterro
dos ossos
dos baús
de tesouro
cacimbas e
poços

é crosta
terrestre
rente
entre
o de repente
e o rupestre

entre oceânico
e agreste
há tantos troços
e tantos testes
será
ai de mim
que me preste
que me apresse
a perguntar
um momento
que viesse
a chegar
sermos nós
ermos a sós
um desses
testes
troços
sets
tracks
nosso

oi, posso?

Sobre Importâncias - Manoel de Barros


Um fotógrafo-artista me disse outra vez: Veja que
pingo de sol no couro de um lagarto é para nós mais
importante do que o sol inteiro no corpo do mar.
Falou mais: que a importância de uma coisa não se
mede com fita métrica nem com balanças nem com
barômetros etc. Que a importância de uma coisa há
que ser medida pelo encantamento que a coisa produza
em nós. Assim um passarinho nas mãos de uma criança
é mais importante para ela do que a Cordilheira dos
Andes. Que um osso é mais importante para
o cachorro do que uma pedra de diamante. E um dente
de macaco da era terciária é mais importante para os
arqueólogos do que a Torre Eiffel. (Veja que só um
dente de macaco!) Que uma boneca de trapos que abre
e fecha os olhinhos azuis nas mãos de uma criança é
mais importante para ela do que o Empire State Building.

Que o cu de uma formiga é mais importante
para o poeta do que uma Usina Nuclear. Sem precisar
medir o ânus da formiga. Que o canto das águas e das
rãs nas pedras é mais importante para os músicos do
que os ruídos dos motores da Fórmula 1. Há um
desagero em mim de aceitar essas medidas. Porém não
sei se isso é um defeito do olho ou da razão. Se é
defeito da alma ou do corpo. Se fizerem algum exame
mental em mim por tais julgamentos, vão encontrar
que eu gosto mais de conversar sobre restos de comida
com as moscas do que com homens doutos.


Manoel de Barros

23 de abril de 2018

22 de abril de 2018

ordens e desordens

Uma situação que eu considero deveras injusta é a com os primeiros apresentados. A memória humana nos prepara para gostar mais dos que vêm por último, ignorando os ímpetos iniciais. Está confuso por enquanto, certo? Vamos exemplificar e ver se refletem e concordam.

Numa entrevista de emprego, é bem possível que se o jurado, o empregador não preencher corretamente as tabelas, as planilhas, dos pontos fortes dos candidatos, os últimos pareçam melhores, porque terão a palavra final a seu favor. É preciso reunir bem os dados e avaliar e reavaliar, talvez invertendo a ordem nas revisões. Os primeiros podem ser esquecidos.

Num desfile de escolas de samba, não raramente o sorteio coloca as que subiram da divisão de acesso para iniciarem. As que fecham as apresentações são afirmadas como as melhores. Um pouco da ordem dos shows, que possuem bandas de abertura e encerram os festivais com as mais aguardadas. Nesses casos, o princípio de conceder o lugar de destaque aos mais relevantes até se entende melhor. Em programas jornalísticos ou de entretenimento, colocam a notícia ou o quadro mais aguardado ao final, retendo os índices de audiência. Não podemos deixar que isso se aplique injustamente em outras ocupações da vida.

Atualmente, nossa gata em casa é a Melissa. Minha mãe teve vários gatos ao longo de sua sexagenária vida. Eu não tive as mesmas experiências e estou começando somente agora. Afirmo para ela, em tom de brincadeira, que Mel é a melhor que ela já teve. O que não posso avaliar como verdade ou não, pois não conheci os demais felinos dela. Ela balança e quase cede, com exceção à lembrança de sua infância, o Chiminho. Seja lá como escreveriam. Mas realmente ela anda bem afeiçoada à atual, o que pode levá-la a ceder em concordância com essa broma. Estou sendo injusto com os enterrados gatos passados?

A preservação da história é sim uma preocupação minha. Acabo de recordar música como a do Titãs em que Paulo Miklos canta que não se lembra quem ele era antes de você. O peso sobreposto do presente afeta, esmaga partículas do passado, postas em esquecimento. Certamente. Muitas filosofias inclusive advertem para a vivência máxima desse tempo. Embora concorde com a importância, não gosto de ser injusto com o passado. Ele tem toda a sua validade pela sucessão de acontecimentos que nos levam a compor o presente. As lembranças, desde que não nos sufoquem, não nos esganem e não nos apreendam de modo negativo nos passos a seguir, são válidas. Difícil manter essa balança, esse equilíbrio em funcionamento, de acordo?

É comum as pessoas saírem de um relacionamento e esculhambarem com a parceria anterior. Apontam muitos pontos negativos, se questionam como passaram tanto tempo a gostar da pessoa X ou Y. É difícil para elas enxergarem novamente o momento que agora já é passado. É difícil enxergarem sem a inocência do que causou o rompimento, sejam hábitos ruins do parceiro antigo, sejam escorregões fortes, como traição, por exemplo. A memória a respeito fica permanentemente afetada. Não há mais como voltar atrás.

Voltando às entrevistas de emprego, se um candidato prepara uma apresentação ou tem um currículo de tal forma, se outro candidato posterior o supera, parece que o primeiro nessa ordem está fadado ao fracasso. Fica um sentimento de "como ele não havia pensado nisso?" ou "como não se especializou nisso anteriormente?" e assim o posterior apresenta grande vantagem, tanto na escada valorizada quanto na ordem cronológica posta aqui em questão.

Em relação aos debates políticos, quem dá a última resposta, geralmente a tréplica no assunto, sai por cima como organizador do pensamento por último. Expõe melhor suas ideias, pode se sobressair, se sobrepor ao oponente e garantir seu posto de dono da temática. Não há mais réplicas na sequência, ou seja, treplicar é a grande chance de encerrar com chave de ouro. Debates consumados no campo do desenvolvimento das ideias, mas, ao mesmo tempo, dependentes do fator tempo, que, a uma hora ou outra, encerra a discussão sobre alpha ou beta.

Outros exemplos podem ser aplicados de diversas formas. Preferir uma viagem posterior à outra que fez num passado mais distante. Achar um relacionamento atual melhor do que o anterior. Uma rede social melhor do que a outra. Um animal de estimação melhor do que o passado. Pode ser também que a pessoa tenha evoluído e domado melhor seus cuidados para planejar melhor a viagem, para se relacionar melhor com a outra pessoa, para usar melhor a rede social ou para cuidar e aproveitar melhor seu pet. Mas são hipóteses.

Em contraponto, maiores saudosistas podem esquecer os pontos negativos da viagem antiga e sentir exclusivamente saudade. Como sente exclusivamente mais saudade da escola. Ou sente maior saudade de um amigo que nem conseguia ou conseguiria mais se dar bem, carregar papos maiores do que um breve cumprimento, por exemplo. Sentiriam a ausência do finado Orkut ou do bichinho que esteve consigo aos mais de 10 anos de existência do peludo. São perspectivas e é sempre difícil avaliar com um grau mais justo as passagens do passado ou do atual momento. Ó, bom aos que conseguem planejar e criar expectativas positivas e melhores ao futuro.

Acabei de ler o conto de Mário de Andrade e seria esse o melhor simplesmente porque agora o li e está fresco na memória, vívido e aplicável? Estou sendo injusto com os demais contistas passados nessa leitura composta por diferentes expoentes da literatura nacional? Se mudasse a ordem da leitura, mudaria eu a minha avaliação de que foi o melhor ou não? Enfim, são dúvidas amplificadas com o uso do "se" e que não teremos a resposta definitiva. Como estamos melhor, na soma de tantas grandezas nas equações, entre passado, presente e projétil do incerto futuro?

20 de abril de 2018

salas

Era um cenário completamente diferente. Um prédio enorme, do tamanho de um quarteirão. Interno em dois ou três andares. Salas, salas e mais salas. Escadas de uns 20 em 20 metros. Subir ou descer. Saguão, corredores com trânsito. Era a escola técnica federal. Estava de volta a ela.

Numa sala do segundo andar, me reúno com meus colegas Looney Tunes, questionados sobre perguntas sobre História. Ninguém presta muita atenção na aula e um encapuzado, que descubro ser eu, responde uma errada de gozação. Após um rápido giro por outros participantes, ele (eu) ganha(o) nova chance de responder. Novamente tenta, agora um pouco mais sério. O professor informa que, se errasse, seria retirado da sala para uma detenção. Dá-se um suspense se a resposta foi correta. E, na cena seguinte, já estou de pé, acompanhado pelo professor que praticamente me puxa e carrega pelo colarinho da camisa. Levo minha mochila e um dos braços, saio da sala e sou encaminhado por superiores para a sala dos pequenos infratores.

O prédio tem amplo movimento e a sala da detenção tem um determinado público, quase ou até tão grande quanto a minha sala de aula anterior. As carteiras, a disposição das mesas não dá muito espaço entre um sujeito e outro. Entro e me acomodo. Apesar de tratar-se de pequenos infratores, não parecem exaltados ou dispostos a mais algazarras, apenas agem naturalmente, como uma sala como outra qualquer. A professora começa a falar sobre a atualidade do futebol. Percebo que estamos no ano de 2007. Ciente de que vim do futuro, me arrisco a brincar de profeta.

Lamento os percorridos anos de jejum pelo Grêmio. Uma tristeza chega a me invadir, mas sei que em 2016, em 2017, tudo está para melhor e esse período há de ter passado. Quase me belisco para garantir que passou mesmo. Mas, em 2007, ao questionar quem seria o campeão brasileiro, quem os alunos acham que seria, eu respondo, ao recordar, que o São Paulo é o campeão.

Ao meu lado, um corintiano fica brabo, me encara e parece querer ampliar suas infrações, dessa vez contra minha integridade física. Já outros levantam o braço quando pergunto se há são-paulinos no recinto. Esses vão ter um bom 2007. A bem da verdade, 2007 foi um dos melhores anos de minha vida. O Grêmio ia bem mesmo dentro da seca e o período escolar foi satisfatório, ouvindo piadas em rádio e recontando aos colegas como se fossem minhas ou eles não sabendo qual a fonte que eu bebia. Eu ia embora tarde na escola e tinha tempo para distribuir essas bobajadas.

Na escola técnica, soa um alarme de intervalo. Eu havia distribuído mais algumas verdades referentes aos acontecimentos de 2007, num sentimento máximo, supremo, sultão de conhecedor vindo do futuro. Chego a me anunciar como futurista, sabendo de tudo que está para acontecer a esses meros atrasados no tempo. Uma sensação que me fez experimentar uma retrospectiva do que propus e fiz na década anterior. Realmente é pouco, mas, durante o presente, muitas vezes é o que cabe ao orçamento, ao espaço de tempos e oportunidades e joga-se com isso, lamentando-se ou não mais tarde. Lamenta-se mais o que não é feito, isto é fato.

Pelos corredores, transito como um fantasma, sem ser reconhecido e ao mesmo tempo conhecendo aqueles setores. É muito semelhante ao prédio da escola técnica onde habitei um ano, mas mais tardiamente do que 2007, pelos meados de 2010. Os corredores, as conversas de jovens em pequenos grupos, alguns aproveitando o intervalo para comer e outros para papear. Estou solitário, subo e desço escadas, algumas inimagináveis, como se Alice tivesse desembocado ali um pedaço do país das maravilhas. Escadas caracóis, degraus circulares ou que exigem saltos quase acrobáticos, mas tudo enfrento, mesmo me arrastando de vontade e com a mente a trabalhar mais do que o corpo. Enfim, uma coordenadora, uma organizadora do corredor com aspecto disso mesmo, grita que está soando o oitavo sinal, ou seja, o da volta do intervalo. Calculo eu que cada sinal deva ser somado desde o da entrada no turno. O da ida ao intervalo seria então o sétimo e o do regresso, respectivamente, o oitavo.

Volto à aula, ou voltaria, se eu soubesse onde é minha sala. Não sei se pego minhas coisas na detenção e regresso para outra atividade na sala anterior. Por ora, encontro minha sala de início, onde respondi erradamente às perguntas da História, mas aí desencontro de memória a sala da detenção, onde deixei objetos. Depois, parece-me que atinjo o objetivo de encontrar a sala da detenção, mas deixo escapar a antiga e próxima sala de aula. Um enigma impressionante e desafiador.

Encontro uma antiga fantasmagórica figura. Ela mais real do que eu. Caminham ela e sua prima, prima da qual realmente fui colega naquela suposta instituição. Prima que não me interessava, interessava era ela. E caminho envergonhado, sem saber se estou sendo notado. Sem saber se estou sequer sendo visto e desejando talvez não estar, talvez estar. Estar confuso, pelo mínimo, eu estava.

Encontro a suposta sala de prosseguimento das atividades, estando a sala ao lado da ligação com uma bela escada com detalhes em mármore em concretada em degraus com alternância de pisos pretos e brancos, uma pitoresca introdução arquitetônica. Fico parado como se fosse um porteiro a tentar reconhecer mais pessoas e a indicar que se tratava dali mesmo a sala em questão.

Reconheço Estevan e Wagner. Esses eu fui conhecer na faculdade, o que faziam ali? Se bem que ainda na detenção, Bruno Ladeira aparecia como a um anjo de presença exclusiva a me aconselhar se eu deveria parar ou seguir as narrativas que os atrasados do ano 2007 ainda desconheciam. Ainda vagueio mais um pouco por ali. Vi ao Pedro que me pergunta o que estou fazendo com somente um tênis nos pés e quando me dou por conta que no outro estou só de meia, respondo que minhas coisas ficaram em uma sala que não sei identificar.

Assim, sem saber identificar as duas salas ao mesmo tempo e ao mesmo tempo sem saber o que tudo aquilo significava, fiz minha volta ao ensino técnico sul rio-grandense.

19 de abril de 2018

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18 de abril de 2018

Justas causas

Muito me incomoda opiniões divididas e multiplicadas aos montes de que homens com apoio a movimentos feministas apenas participam ou buscam bocadas de segunda intenção, de outro interesse. Concordo que os homens não devem tomar o protagonismo desses movimentos, principalmente ao respeito ao lugar de fala, mas evitar que participem de forma mais à margem, é um declínio, um desperdício ideológico e de luta. É fazer o movimento, que tenderia a ganhar força, perdê-la. É, mais uma vez, excluir mais do que incluir, um dos problemas centrais das contemporaneidades.

Enquanto homem, manifesto apoio a movimentos feministas, movimentos por igualdades salariais, contra assédios em locais de trabalho, pela inclusão das mulheres em diferentes setores: esportivo, engenheiro, medicinal, político, etc. É um processo que me parte interno, de minhas inquietações e buscas de reduções das desigualdades. Nada a ver com agradar X ou Y. Nada a ver com buscar segundas intenções com participantes ou protagonistas do mesmo movimento.

Ao mesmo tempo, defendo e posicionaria minhas bandeiras sempre em favor de outras consideradas minorias sociais. Por exemplo, os movimentos negros, como sofrem os brasileiros vítimas de preconceito, nas dificuldades trabalhistas, no preconceito com pobres, nos desrespeito de seus direitos garantidos constitucionalmente. Por exemplo, idem aos movimentos LGBT. E que segundo interesse teria eu para com esses movimentos? A menos que insinuem coisas. E insinuar é um verbo de muita aplicação na atualidade. Insinua-se em leituras rasas ou em propostas solucionais pouco densas e/ou apressadas. Lamento.

Meu trabalho na consistência de apoiar e registrar cada passeata, manifestação ou protesto próximo a mim. Incentivar que mais mulheres e mais negros participem desses movimentos. Mais trabalhadores e trabalhadoras por seus direitos. Que não se curvem à opressão, ao arrocho salarial seja de onde for. Este é meu trabalho. Conscientizar através de frases, discursos, do repasse de informações e de opiniões que servem para construção de um mundo mais justo e igualitário diante dos mais diversos sofrimentos humanos.

Enfim, friso que minhas lutas e as bandeiras que ergo partem de meus princípios, da educação que recebi e das minhas constatações pelas visões de mundo, pelo lugar de fala, pela exploração de ambiente e novas condições sociais e culturais observadas. Não estou aqui, nessas e em outras linhas dessa passagem mundana, no objetivo final de agradar simplesmente por agradar. De acometer atos com segundas intenções nesses tipos de objetivos. Acredito fervorosamente que grupos considerados minorias sociais, sejam mulheres, negros ou LGBT sofreram ao longo de séculos, das proibições e reduções de direitos e tudo o que está sendo conquistado por estes grupos nos últimos tempos não pode ser colocado em perda.

Reafirmo minha tristeza cada vez que ouço e leio opiniões de que todo homem hétero apoia movimentos pelas mulheres com segundas intenções. Meus princípios internos, do que considero justo, do que considero correto às pessoas, transpassam essa lógica que pode servir a outros. A mim, acredito que não.

PPP

Estão privatizando a cidade
Estão privatizando o estado
Estão privatizando o país

Estou privatizando a minha vida também, quem quiser assumir, vou terceirizar.
Cansado dela. Se ninguém lidar com essa empresa, de muitos gastos e poucos retornos, a gente bate o martelo e extingue.

esmigalhas

todas as certezas estão por um triz

todo o mundo é um quadro

apagador e giz

todo o giz é cor

olha o quadro que fiz

miss e cronômetro

todo o céu de aves: condor e perdiz

tudo que perdi com dor

todo giz esmigalha

toda a muralha tem falha

toda a malha abis-mo

nunca

nunca tive barba onde gostarias
nunca tive barco onde gostarias
nunca assinei tuas tordesilhas
nunca assimilei como seria
nunca tive barco em tuas ilhas
nunca tive ilhas onde tu sereias
nunca tive naco em tuas ilhas
nunca tive filhas que de ti seriam

16 de abril de 2018

indicadores

tentei agarrar ao chão de meu quarto o que eu pensava ser um lápis na escuridão da madrugada, em que apenas a luminária, que garante minhas leituras de cabeceira, ilumina. ao contato de meu indicador e meu polegar ao solo de madeira, descobri que não era um lápis preto, mas tão somente tratava-se de um brusco arranhão no assoalho e pó em volta. assim é o tempo quando tenta-se agarrá-lo. acaba-se apenas com as partículas de pó nas mãos.

15 de abril de 2018

mortis

deixes de ser bobo
que não é o aniversário
que faz lembrar tuas vitórias
tuas conquistas e melhores memórias
se fosse tão especial
não acontecia todo ano
o que faz lembrar é a morte
com sua faca e seu corte
dilacerando pedacinhos
distribuindo com carinho
ao relento o que tu fostes

mortívida

ó, que sorte tens, ó vida
mesmo oprimida e deprimida
te repetes sempre igual
que azar tens, ó morte
aconteces só uma vez
e, se deres muita sorte,
hora do estrelato final

prima vera

prima vera é prima distante
de segundo grau e contatos de terceiro
prima vera é passageira
passa apressada e ligeira
inverno todo delirante
longo inferno a todo instante
todo armado de punhal
não mata de primeira
faz espera traiçoeira
congelar até o final

vinhos

o vinho tinge de vinho
meus órgãos internos
sua boca tinge de vícios
meus órgãos externos
seu batom atinge o vinho
percorre o caminho, alguns exceto
poucos vetos sob o vinho
secretos caminhos
sob o teto

12 de abril de 2018

sombra de dilúvios

fui até onde deu
aguentei até onde fui
ondei por onde andei
andei por onde ondas
nada-se em ondas
andamos eu e minha sombra
sem ou com sombra de dúvida
eu e minha sombra
peso sobre ombros
peso sobre as costas
peso sobre as ondas
e a sombra
apenas acompanha
e nada carrega
o peso é todo meu
nessa regra

tempo

o melhor que posso te dar é meu tempo
o pior que podes me tirar é meu tempo
lamento a ausência de rima
com outros elementos
mas é sempre
o tempo
o tempo
o tempo

Prostituição comercial

Atualmente, vivo os dilemas da prostituição comercial. Por mais que as aproximações socialistas reduzam a desigualdade social (minha verdadeira inimiga de cabo a rabo), existe a dependência das vendas, dos comércios, da publicidade e propaganda. Nos tempos que aqui me acercam, praticamente sobrevivo deles. E isso demanda um tremendo esforço.

Olhando por alguns aspectos, ao menos dois tremendos esforços. O primeiro é a correria pela busca de anunciantes. Ninguém bate à tua porta nesse interesse. Ou tu corres atrás ou ficas sem. Chupando o dedo. Vendo o trem e o navio passarem. Chupando o papel da bala. Então, o caminho é bater nas portas alheias, o que praticamente exige uma atuação teatral. Preparar a melhor cara, a roupa menos amassada e tentar controlar o suor das mãos. Mostrar confiança e entendimento da oferta sendo feita.

Não me imaginava trabalhando comercialmente, mas os destinos e sistema me colocaram nisso. É obrigação. Quase tudo, se não for tudo, por obrigação é ruim. Mas mesmo os serviços que mais pensava gostar me parecem cair nas garras da rotina e obrigatoriedades. Vou levando.

Trabalhar com vendas de produtos, de ações ou de propagandas e anúncios exige um determinado cinismo. Muitas vezes é procurar, debater, insistir e ir atrás de propostas que nem tu mesmo acredita. Ou que não investiria caso estivesse do outro lado, do lado do empresariado. Enfim, é tentar convencer algo que tu não leva fé, que não garante dar certo, mas que precisa dar o braço a torcer, por a mão no fogo e a ideia na cabeça alheia. A busca inicial é pelo benefício próprio, não vou ser hipócrita. Porém, me satisfaz poder satisfazer o cliente. Acredito que o retorno precisa ser positivo para ambas as partes. E não menciono exclusividade em negócios comerciais. Embora outros negócios também se tornem comerciais.

Algumas pessoas trabalham com áreas, com produtos que elas mesmo gostam. Produtos alimentícios, veículos, acessórios, eletroeletrônicos. Outras precisam convencer nas vendas de itens somente necessários no dia a dia e não prazerosos. Talvez seja pior se esforçar para vender coisas supérfluas, coisas que não são nem essenciais e nem prazerosas. Aí existe a necessidade de explicar para quê serve, para quê a pessoa precisa daquilo e o porquê daquilo facilitar sua vida em algum momento. Complicações, desafios e percalços dessas ingratas tarefas obrigatórias.

É obrigatório vender. É obrigatório circular dinheiro. Tirar ali, colocar acolá. Girar a engrenagem. Manter-se no sistema, no carrossel. No movimento dos hotéis, dos bancos, das lojas, dos parquímetros, dos bancos, com a documentação em dia. Caso contrário, tem direito a nada. Vira uma miragem sob algum alpendre, sobre uns degraus. Se arrasta em busca de passar o tempo, sem direito a bens de consumo enquanto os ponteiros movimentam o tic e o tac do relógio.

É preciso procurar alguma área para vender. Seja a força de trabalho, do braçal ao polêmico e subjetivo trabalho intelectual que nem sempre se torna palpável ou fácil de calcular seu preço. É preciso circular, circular e circular. O tempo não para e o tempo é dinheiro. Se o dinheiro parar, para onde vai seu tempo?

Crônicas forasteiras

Escrevo esta abreviação com sono e calor, para que fique registrado. Não para iniciar em tons de desculpas, mas realmente porque assim me economizo tempo de pensar em uma grande abertura. Dito e feito, pelo centro eu recordava das antigas aventuras na cidade de Cruz Alta, das quais sinto muita saudade. Ter onde investir e ir atrás. Por pouco tempo de significado que seja.

Gosto muito da figura de forasteiro. Em parte, porque gosto absurdos de viajar e conhecer novas paisagens e quiçá algumas pessoas. Essa breve troca de experiências. Por outro lado, na impressão de que os lados femininos assim também o gostam. A boa impressão da figura estrangeira e forasteira, podendo investir sem o peso do compromisso. Demonstrando boas qualidades e se ausentando antes dos estouros negativos. Podendo marcar espaço pelas peculiaridades e diferenças regionais, em experiências e conhecimento de outras causas. Essa troca cultura é deveras interessante.

O filósofo alemão Arthur Schopenhauer apontava para o direcionamento dos opostos. Ora, que maior e melhor oposição do que uma união de gente de diferentes tribos com alguns interesses e aproximações, sejam nas experiências, nos gostos ou no que desejam? Isso é ótimo. O clima de aventura, de descoberta e de marcar histórias favorece. A adrenalina de que algo possa dar errado também faz parte do imenso cenário e do imenso contexto. Poder dar algo errado na viagem em si, no conhecimento da pessoa ou nos fins experimentais. Tudo faz parte.

Se Schopenhauer apontava esse caminho a ser trilhado, que grande erro a própria Alemanha, fundamentada após no nazismo, cometia. Querer a exclusão de outros povos e a dominação de todas as fronteiras. Excluindo a diversidade, logo ela, a diversidade que tanto nos inspira e nos instiga. Um erro brutal sob todas as esferas analisáveis. Desde a crueldade na eliminação do diferente até esse ponto que encaderna nosso breve assunto de hoje.

Ah, mas sim, que saudade dessas experiências ainda alcançáveis, como é alcançável, com um maior esforço e distância de vista, a juventude que me pertence. Não tenho o mesmo ímpeto e cada bem monetário que adquiro, invisto para causas mais necessárias e urgentes, da alimentação ao transporte, consciente da dificuldade nacional dos presentes tempos. Golpe após golpe a machadadas, quem sabe reservar mais um tempo e acertar na escolha? Existem os leques que se apresentam e a escassez de saltos que podem ser feitos. Existem as escolhas e as renúncias e deve-se utilizá-las com determinada estratégia e inteligência, mas ciente da limitação dos tempos e oportunidades. Devant, camaradas.

6 de abril de 2018

Habeas mentem

Enquanto luto por meus barões e meu sustento mensal com a direção da rádio, tudo se desenvolve no país. A aflição, a expectativa, o suspense, os conflitos. Não menos inquietante é aquela situação na sala da direção geral. A tarde se alongava e eu procurava direcionamentos e, quem sabe, alguma definição.

- Está acabando o prazo. - De repente o diretor se manifesta. - O Lula vai ter que se entregar. - Sobre o mandado de prisão ao ex-presidente da República acusado por um imóvel de área pouco, mas bem pouco mesmo, maior do que a propriedade conseguida por meus pais. Um ex-ferroviário da estatal e uma funcionária pública do Banco do Brasil, sendo a classe dos bancários sempre muito atingida em relação aos maléficos banqueiros nacionais e internacionais.

O resumo da reunião é que eu preciso empreender. Prender clientes e mamar de suas tetas. Estou aceitando essas jornadas, no que pode ser feito para meu sustento. Enfim, saindo dali a pé, ainda no prédio, topo no elevador da sede da rádio pela primeira vez em meses com alguém com quem eu dividiria o elevador por algumas horas, sem problemas. Ela se mostrou simpática. Talvez em alguma chance ou nuance, concordaria comigo. E concordaríamos juntos. Estava perfumada e tinha belos cabelos escuros. Nossa simpatia durou a descida de 11 andares rumo ao térreo. E, após cumprimentar o porteiro, seguimos nossos rumos. Sigo protegido pelas ruas com meus óculos escuros e a bebida da proteção das noites anda bastante ausente, para falar a verdade. Vai-se mais uma noite sem sua presença no logo mais.

Vou rumo à descida do centro, oposta ao palco da final do Campeonato Gaúcho no domingo. Para o outro lado, para a outra descida. Preciso comprar nos camelódromos um fone de ouvido que me isole bem o som das torcidas para decisão. Será o melhor para poder trabalhar nesse barulhento jogo. Ouvir os repórteres e os retornos do plantão. Vinha trabalhando com o fone de ouvido branco de meu celular, o que é deveras inadequado. O isolamento do som é péssimo e acabo passando por surdo perante os nossos amigos ouvintes. Hora de um fone novo.

A primeira banca não me agradou, percorri um pouco do labirinto de lojas fechando naquele fim de tarde de sexta-feira até encontrar um garoto que me parou. Pelo chamado do mais velho, o nome dele também era Henrique. Carlos Henrique, ele explicou, mas não gosta de Carlos e prefere ser chamado como me chamo. O mais velho de boné aba reta, com todo um estilo que ganhou os espaços no Rio Grande do Sul - mais comum ainda em Porto Alegre, talvez - me indica outras opções de fone de ouvido, os headphones. Assim como o da primeira loja, ele pensa que é para jogos de computador, mas explico que são para transmissões esportivas.

Ele se empolga, diz que não costuma ouvir rádio, mas que poderia acompanhar. Foi muito simpático, realmente um bom vendedor. Comprei dele e me agradei do produto pela proteção aos ouvidos. Pareceu tudo ok. Quando ele testou o fone com a música de meu celular, reconheceu a canção. - Nickelback. - Grupo canadense.

Ele, gremista, se empolga descrevendo o lance da expulsão do lateral-direito Eder Sciola do Brasil de Pelotas na final do Gauchão. Eu discordo do cartão vermelho, mas ele justifica, gesticula, comenta e emenda até um "como se eu fosse o Arnaldo Cezar Coelho comentando". Uma figuraça. Me despeço dele, que descubro pelo nome se chamar Isaac. Cumprimento também ao Henrique na saída. Quase me perco novamente no labirinto de pequenas lojas, mas encontro a saída.

Pela Floriano, novamente passo por um comício, por uma manifestação do Partido dos Trabalhadores. Estão revoltados com a ordem de prisão contra Luis Inácio. Justo ele que encabeçou as palavras do diretor da rádio no primeiro parágrafo. Diferente da direção da rádio, que meio que mandou eu trilhar meu caminho com seus suportes mais básicos, aqueles reunidos em torno do microfone, queriam Lula solto. Queriam Lula candidato, onde lidera as pesquisas de primeiro e de segundo turno. Queriam Lula sem pagar uma pena que os candidatos, que os políticos de outros partidos não cumprem por acusações mais sérias, como malas de dinheiro, lavagens enormes, helicópteros com droga e corrupção dos mais diferentes níveis. Distintamente de quando desci a rua na ida, na volta uns manifestantes ocupam o centro da via. Os carros ficam trancados. Enquanto uma companheira discursa, muitos buzinam. Buzinam e buzinam, atrapalham a fala - o que deveria ser um dos objetivos, além de querer passar. Finalmente liberam os que estavam presos na quadra, mas dão a ideia de manifestantes, na figura de alguns mais jovens com cartazes, bloquearem a via lá na esquina adiante, fazendo com que os motoristas obrigatoriamente desviem o trajeto, liberando o trânsito e, ao mesmo tempo, mantendo o protesto no meio da rua.

Identifico poucos conhecidos. Em especial, uma conhecida. Outros vou ver que estiveram através da internet. Se distanciando do pequeno mar de bandeiras vermelhas, hoje mais semelhante a um arroio, em outros tempos verdadeiro Atlântico (Pacífico não!). Saindo dali, seguem os comércios no mesmo ritmo. Homem gritando ofertas DE PREÇOS IMBATÍVEIS ao microfone da frente de uma loja, talvez de sapatos, não olhei. Pessoas apressadas para pegar o ônibus, estudantes de mochilas, senhoras e senhores, muitos com fones de ouvido. Outras prestações de serviço funcionam normalmente. Manicures concentradas, pessoas em uma lancheria, onde a televisão também mostra bandeiras vermelhas e quase me provocam sorriso e riso.

Ali perto é onde eu corto o cabelo, o Marcos, apesar de seguir trabalhando, talvez aplaudisse o protesto. Não sei. Outra mãe leva três crianças pequenas, provavelmente na saída da escola. Nas saídas das escolas residem o caos no trânsito, quase maior do que o protesto. Pais perdidos, em busca de estacionamento e de reconhecer os seus filhos em meio a tantas crianças barulhentas. Outros pedem dinheiro na esquina. Carros de firma passam. Outros mofam dentro de veículos à espera dos compromissados que logo vão vir. Os parquímetros funcionam normalmente.

O país não se comporta bem como um organismo. Mesmo próximo a seu coração, aos órgãos mais vitais, ou centrais, muita célula deve continuar se comportando na normalidade das demais instituições listadas. Pessoas escondidas atrás de suas mesas de trabalho, sentadas nos bancos da praça, buscando os filhos na escola e buzinando nos entroncamentos do trânsito. Nada de anormal num fim de tarde de sexta. Na distante frieira, também algumas coceiras, mas nada de anormal. Ó, povo que anda de ônibus, que vende e que compra nos pequenos comércios, que entope de carros as ruas dessa classe longamente média, que acha caro o ingresso da final do estadual, ó, povo, se tu soubesses o que eles aprontam e inflamam contra ti, não seria só um arroio de bandeiras.

4 de abril de 2018

predicações perfeccionistas

nossos breves encontros de um interior mais interiorizado. seria porque procedia tais momentos das profundezas do âmago de minha alma? talvez.

tal vez estávamos pelo interior do interior do estado. colinas, verdes campos, tons dos mais variados verdes pertencentes à mãe que atende pelo nome de natureza.

à estadia desses bem proveitosos momentos, soma-se uma partida de futebol em um estádio dos mais precários imagináveis. paredes altas atrás de uma da metas. paredes descascadas em tons pasteis que há muito imploravam reestruturação, recapagem, repintura. o gramado também não é exemplo. parece mais uma extensão selvagem da vegetação em volta. tudo precário demais. é um estádio no meio de um povoado, casas que se estendem pelos lados, elevações que permitem visualizar as ruas distantes, mas que engolem a visão da depressão na parte baixa das calles. sobe e desce para chegar a destinos por ali.

no jogo de futebol, placares pouco credíveis, mas pouco importava. até fazíamos questão, mas era tudo de um aspecto demasiado estranho para aplicar a veracidade.

mais tarde estávamos em casa. na casa onde deveríamos estar. nossa pacata, estimada e louvável privacidade. um pedaço de paraíso aos interiores. a exterioridade do momento agradando demasiadamente. a bonança em fartura. me conduziu quase que pelo braço, um dos gestos mais lindos imagináveis. ao menos, o abstrato da vontade quase palpável.

fomos aos fundos para o tempo nosso e de ninguém mais. construções de madeira, ponte levadiça. toras e troncos de madeira. árvores que agora só viviam para nos abrir caminho rumo ao pedaço de paraíso. um bom sacrifício, posso agora pensar. galinheiro ou construção para patos, marrecos e cisnes. aves de suas vidas pacatas. nós, aves de vidas reviradas, pássaros de bom e mau agouro, só em busca do agora e do tesouro maior. braços quentes e sorriso iluminador. olhos que, além da visão, usam o tato por tocar a alma. cores frias neles para aquecer minha existência. reflexos, saudosismo e perfeição.

ainda por essas bandas interioranas, alemãs, sabia eu, eram as origens e ruelas e arquiteturas especiais eram encontradas em área mais centrada do povoado. prédios de um classicismo e de um tamanho até surpreendentes pelas visões anteriores de se tratar de uma pequena emancipação de viventes. nas ruas extremamente estreitas, casas compostas com móveis tão antigos quanto suas fachadas. lustres, abajures, móveis de madeira, rusticidade e sofisticação lado a lado. turistas perambulando. pessoas agora já conhecidas de outros tempos. hóspedes dos mais diferentes infortúnios se pintassem no parágrafo anterior de privacidade zelada e cometida a dois. mas por esses labirintos de antiguidades, encerrei a passagem por esse mundo de sonhos ilustres. predicações essencialmente bem-vindas e perfeccionistas a meu gosto. literários pedaços de paraíso.

2 de abril de 2018

ema

devo nada
nem esse poema
pessoa cercada
por esse sistema
encarcerada
pelo esquema
vale-se nada
ema
ave que não voa
cena
cena que não flagra
eu-me
pessoa que não sonha

adornos

adornos
sobre os corpos
somos
adornos sobre as dores
sono
sobre a vida
sonho
sobre a vida
sobre
sobrevida
sobre ida
sobre volta
sobre ainda
que te importa?

a dor

adoecer
a dor de ser
dói e ser
adormecer
a dor mercê
mercê da dor
merecedor
hein, será?
encerar
em ser a dor

silêncios

eu silencio tudo que me faz mal
virtual
o mal já me ocorre interno
o externo não há porque deixar-me piorar
quanto menos vejo, melhor
meu interior
prior de tudo que tenho

1 de abril de 2018

Imensidão / Insiginificância

Laguna (Foto: Henrique König)

Laguna (Foto: Henrique König)

Laguna (Foto: Henrique König)

Laguna (Foto: Henrique König)

Laguna (Foto: Henrique König)

Laguna (Foto: Henrique König)
Laguna (Foto: Henrique König)

Laguna (Foto: Henrique König)