29 de julho de 2015

Quarta-Feira

Mais uma quarta-feira. Nem quarta fria, pois abriu calor no fim de julho, nem quarta feia, pois o sol também nos acompanhou nesta jornada. Os dias, apesar da beleza natural deste, são mais curtos no inverno.

Assim, faço meus poucos afazeres e parto contra o tempo para aproveitar o fim de tarde. Nas ruas, a cidade exerce rotinas, repete movimentos no imenso tabuleiro. Consigo notar os funcionários que olham ansiosos para frente de seus estabelecimentos, esperando a hora de largar fora.

Alguns praticam exercícios por necessidade, esforçados. Outros buscam prazer e bem estar nas práticas, com roupas esportivas para melhor desempenho. Lotam as pistas previamente estabelecidas a seus passos. Outros dividem calçadas com pedestres mais vagarosos e respiram as toxinas dos automóveis e ônibus em seus trajetos.

Cruzo por idosos carregando sacolas pesadas demais. Isso me faz pensar o quão estranho soaria solicitar ajudar aos que rumam na mesma direção do que eu. Afinal, as pessoas pouco confiam nas outras, poderiam pensar que se trata de um assalto disfarçado de solidariedade. Há muitas máscaras e coisas ocultas nas cidades.

Cruzo por crianças colocando suas pequenas mãos onde não devem. De suas próprias narinas até aos locais mais inusitados e, às vezes, perigosos. Responsáveis desatentos não percebem ou tardam a perceber seus atos não recomendados. Algumas correm para fora do alcance das mãos maiores dos adultos, por falsa sensação de liberdade ou a mais pura travessura.

Os olhares dos idosos carregam mais incógnitas. Olham distantes da realidade das ruas, que são como um grande jogo da velha, em linhas que se estendem retas por quadras e mais quadras. É difícil adivinhar o que pensam, o que puxam da memória, o que relembram ao ver certos movimentos dos mais jovens. É difícil saber se a nostalgia os traz uma sensação boa de ter feito algo, ou o arrependimento de não ter feito. Ou a sensação boa de não ter escolhido algo, ou o arrependimento de ter escolhido. Perguntas que passam como a fumaça do transporte coletivo.

De óculos escuros, ninguém adivinhará o que meus olhos transbordam a querer dizer. Como um disfarce, me esquivo de alguns cumprimentos com pessoas que pouco conheço e, quando considero válido, realizo a referência de tirá-los e os concedo uma saudação e, talvez, um curto papo.

No fim de minha jornada, com a lua coberta ainda por nuvens, como se escondesse também em cortinas ou persianas naturais, ouço a voz e a simplicidade de Wander Wildner pelos fones de ouvido. "Eles não dizem adeus. Eles não dizem adeus. Os índios dizem até o outro sol. E que os deuses te acompanhem."

Foto: Henrique König

17 de julho de 2015

O Carma e a Cruz


O carma e a cruz
A arma engatilhada
A luz no fim do túnel
Foi apagada antes do fim
Foi assim e sobrou nada

O carma e a cruz
A alma se seduz ao nada
Ao que ninguém sabe
Mas antes isso do que ficar parada

O carma e a cruz
Babylon by bus
Sarna na alma
Vasta andança sem luz


Escrito em 15 de julho de 2015
Foto: Henrique König


15 de julho de 2015

C'est la vie

A vida de constante insatisfação

Sabemos que muito é possível

Mas só é possível com abdicação

Uma escolha anula a outra


A vida de constante insatisfação

Estruturas que nunca mudam

Decisão que não nos cabe

Resposta que jamais se sabe

Roupa, razão, paixão que não coube

E não nos soube aceitar


Foto: Henrique König

10 de julho de 2015

Refém do Contexto

Sou refém do contexto
Por vezes, contesto
Definidor de meus atos
Por vezes, por demais sensato

Refém dos quadrados dias do calendário
De interpretadores e interpretados
De significantes e significados
Equivalentes e equivocados

Mas queria um dia fora do sequencial
Aleatório e independente
Dar-me ao luxo ser um pouco inconsequente
Como um sonho intenso, ardente
Minha escolha, meu destino e meu final
Foto: Henrique König