26/08/2025

O Médico e o Monstro (1920)

O Médico e o Monstro, filme de 1920, adaptado do romance de Stevenson, conta a história de duplicidade do médico Dr. Jekyll com a figura monstruosa de Mr. Hyde. Eles coexistem. Portanto, a temática do filme é essa coexistência do bem e do mal em uma mesma pessoa e a dificuldade para controlar a própria monstruosidade, a agressividade, a perversidade, os desejos. 

Dr. Jekyll é um sujeito por demais respeitado na sociedade londrina. Ele visita George e está encaminhado para casar-se com a bela Millicent, filha do magnata. O interesse da filha pelo jovem médico/cientista é visível. Porém, o próprio George incentiva Henry Jekyll a conhecer a perversidade, os cabarés, a vida noturna e suja de Londres. Como é dito por outro amigo deles, "há poucas coisas que George não conheça, não tenha vivenciado". Contrapondo a prudência e inocência de Jekyll, seu lado obscuro aflora pelo incentivo alheio. Assim, pesquisador e experimentador da ciência, ele propõe em segredo o uso de uma poção, de uma droga que o transforma em um duplo perverso. Coexistem em Londres a figura respeitada de Dr. Jekyll e do corcunda aterrorizante e frequentador das maldades da noite, o tal Mr. Hyde.

Adaptando século depois se pode comparar a forma oculta em que Jekyll não era associado a Hyde, apenas seriam amigos que nunca, logicamente, apareciam juntos. Henry Jekyll chega a destinar em testamento suas descobertas e patrimônio para o "amigo" Hyde, situação que pôs todos em desconfiança e vigilância: qual seria a relação entre Jekyll e o perverso, estranho e desconhecido Hyde? Uma mesma pessoa pode ter lados ocultos, crimes grotescos, aparências a enganar. Disso não sobra dúvida, sobretudo nas redes sociais e, como é o tema do Brasil no mês de agosto, os perigos das redes com tráfico de imagens e consumos velados ou obsessivos de temas que colocam em risco a sanidade, os direitos e a preservação de crianças e adolescentes. Situações suscitadas a partir do vídeo de Felca e por aí adiante.

Muitos Mr. Hyde vivem escondidos em Dr. Jekyll, sejam em traidores, abusadores, criminosos dos mais diversos tipos, violentadores, articuladores de conteúdo proibido e traficantes. A temática é totalmente clássica através da modernidade em que a humanidade se desdobra sobre novas maneiras e tecnologias para sobrepor camadas e infiltrar-se em universos do abjeto e do repudiante. Camadas ocultas de crimes virtuais e entre quatro paredes se misturam à história do viés tecnológico. Crimes domésticos, crimes familiares, abusos cometidos por quem deveria cuidar e proteger. Eis variedades de Mr. Hyde que sobrevivem à sombra dos órgãos investigadores e da sociedade alerta contra a tirania e a perversidade dos falsos zeladores.

Temática que se mistura ao agosto lilás de proteção contra a violência contra as mulheres e sobretudo na proteção de crianças e adolescentes. É difícil avaliar uma história como essa e não se colocar na condição de alerta de que casos podem estar ocorrendo ao lado ou em perfis que aparentam tranquilidade. A vizinhos e familiares que suspeitam marcas e atitudes estranhas, a denúncia deve estar sempre disponível quando apontarem-se provas.

Sobre a história do filme mais do que centenário, Dr. Jekyll foi experimentar prazeres que o dominaram, descontrolaram na dosagem e o derrotaram como indivíduo e figura de convívio social. As camadas de bem e mal que se acoplam em um mesmo sujeito, como delineava Nietzsche, podem desequilibrarem-se e causarem transtornos. Sobressaem-se a desconfiança e a incapacidade de leitura exata dos sujeitos, indivíduos cada vez mais individualistas, suscetíveis e programados a perdições e caminhos errados enquanto outros tantos visam o lucro. Vendem-se doenças e remédios. O problema e a cura. A indústria do erro, a cegueira de quem lava as mãos e da justiça e a indústria do punitivismo, por último. Ou nem isso. 

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