Paradas em uma paisagem da praia de Laguna, as pedras me traziam a alegria imensurável de poder vê-las e apreciá-las, mas também sentia a tristeza por elas nunca mudarem. Talvez esteja em Raul Seixas a tristeza das pedras que choram sozinhas em um mesmo lugar. Talvez tenha nada a ver com pedras esse discurso todo. Mas quando eu estava em Laguna, era visualizar as pedras, pensar na paisagem que eu queria capturar para sempre em minha vista. Era revê-las alguns anos depois sabendo que estariam lá. E minha tia que lá morava não estaria mais, porque faleceu. E a casa dela foi rapidamente demolida sem negociarem uma possível venda e divisão da obra sobre o terreno. E no bairro em volta, ao invés de demolirem, casas eram construídas. E tudo mudava, menos as pedras. E a tristeza pela imobilidade das pedras fixadas há séculos sobre o declive dos morros dava lugar à tristeza pelas mudanças bruscas em algo que eu também tive como familiar. Porque passei verões entre as belezas naturais e a ansiedade, a incompatibilidade que sentia ao contato humano. A solidão adolescente de estar apenas com meus pais e conhecer mais nenhum jovem daquela região. Meu próprio primo, com o qual o pequeno contato que tive sempre foi positivo, mas hoje envelhecemos, sou adulto e ele mais ainda, pois mais velho, com esposa e filha pequena. Filha dele sem avó, porque minha tia faleceu. E sua casa, nossa casa por alguns dias, sumiu. E o cachorro manco. E o pequeno garotinho gago o qual ensinei um pouco de palavras cruzadas. Não sei se aprendeu, mas espero que esteja alfabetizado. Já deve ser um adolescente. Talvez da minha altura. Ele bebia coca-cola com suco de uva e eu pensava que alguém deveria detê-lo. Mas eu era responsável pelo gurizinho apenas por minutos, talvez nem horas, pois logo esgotada minha bateria social. Um amigo da família ia para lá. Morava de favor, ajudava a cuidar os doentes que foram nos deixando. E ele, homossexual que teve aids quando era jovem adulto, também já partiu. Tinha as bochechas vastas como se fosse o personagem Quico (ou Kiko?) do seriado mexicano Chaves. Me mostrou suas fotos quando era maquiador do sistema brasileiro de televisão, popular SBT. Isto foi antes de eu entrar no Jornalismo.
A Laguna e a casa de minha tia naquela praia acompanharam diferentes verões e períodos da minha vida. Infelizmente era um tempo de somente semana a cada verão. Não conhecia outros jovens, sobretudo outras jovens com os quais eu poderia me divertir. Mas sempre foram períodos muito reflexivos e que recordo até hoje, como o degenerar alcoólico de minha tia, o cachorro manco, o menino gago, o calor do morro que bloqueava o escoamento do vento, as baratas que brotavam pelo solo. As vizinhas, senhoras fofoqueiras, o filho especial de uma que não sabia se comunicar direito, mas tocava violão e era atendido em um centro para crianças apesar de seus quase 2 metros de desengonçada altura. Tudo isso me recordo, enquanto minha vida muda e as pedras da Laguna permanecem solitárias e acompanhadas umas pelas outras no mesmo lugar em que a mente armazena a cena.
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