Um filme bem ao estilo do finlandês Aki Kaurismaki, cineasta de diversos lançamentos, do drama e da comédia. Neste filme de 1990, a personagem principal é Iris, uma adulta que vive com os pais, trabalha exaustivamente na maçante missão de comandar uma esteira de caixas de fósforo. Quando tenta se divertir, não é notada pelos homens; quando recebe seu salário, mira um bonito vestido colorido em uma vitrine, o compra, mas é reprimida por seus pais; o velho o chama de vagabunda e a mãe prontamente adverte que ela devolva à loja.
Apesar do aviso, a loira Iris vai a uma festa com o vestido e chama a atenção de um homem esquisito. O breve relacionamento deles é um tremendo fracasso, conforme ele revela, em encontro seguinte, que nada mais lhe dava pena e desinteresse do que o amor que ela sentia; Iris fica arrasada. Mas tudo poderia piorar na crueza deste filme de Kaurismaki, conhecido pela ironia, destinos trágicos e atrapalhados de seus personagens marginais. Iris descobre estar grávida. Apesar da represália sofrida pelo antes companheiro, ela escreve uma carta e lhe entrega em mãos. O homem é categórico na resposta: livre-se do filho.
Socialmente analisada, a condição de Iris é de uma trabalhadora sem perspectiva de crescimento na empresa, com dificuldade para fazer amigas, não recebia apoio sequer de casa, por onde não é explicitado, mas provavelmente era considerada uma solteirona sem solução. Ao se acidentar, parar no hospital e tomarem conhecimento do azar de ter engravidado no único encontro em que isso era possível, os pais de Iris desejam que ela deixe a casa e arrume outro lugar onde morar. Ela até conta com ajuda e começa a bolar seus planos de vingança contra os que a humilharam em sua trajetória.
É um filme cru, na crueza e na crueldade, um filme frio como o clima portuário e provavelmente ventoso da Helsinki, capital finlandesa, confins de parte do mundo coberto de gelo. A atriz Kati Outinen, que realizou outros trabalhos com o diretor Kaurismaki, dá vida a uma personagem quase inanimada, uma espécie de Macabeia, da Hora da Estrela de Clarice Lispector, em plena terra antes pertencente aos russos (incluso as Lispector sendo de origem ucraniana, pois mirem a coincidência a que se chega).
Iris precisava de pouco para se contentar: uma refeição simples, um café, um ombro amigo, um homem que a notasse, a consideração e o respeito familiar. Ao perder cada sonho, degrau a degrau, a saída definitiva foi mirabolar planos de vingança aos desafetos. Em uma cruzada feroz por Helsinki, Iris não deixaria barato sequer para futuros homens interessados em sua pessoa: desejos de vingança completa. Mas, é claro, vindo do podador de sonhos Kaurismaki, nada de brilhante e excepcional, apenas a vida sendo coberta como um campo pela geada. As trilhas sonoras típicas contribuem para isso.
Nota final para Garota da Fábrica de Fósforos:
⭐⭐⭐⭐
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