Aqui o Rainer Werner Fassbinder e sua trupe lançaram um dos maiores filmes feitos. Sem exagero. Pensar após assistir ao filme que ainda foi lançado durante a Guerra Fria, com a Alemanha dividida. 1973 é a data de lançamento do Mundo por um Fio, um clássico que antecipa questões das redes sociais, robótica e, nosso tema mais do que atualmente à tona, inteligência artificial.
Uma empresa contratada pelo governo alemão formula um mundo cibernético em que foram desenvolvidos cerca de 10 mil protótipos de indivíduos. 10 mil personalidades diferentes que atuam entre si, com movimentos e gostos programados, mas que também possuem a capacidade sentimental e, portanto, até da revolta.
Quando pessoas ligadas à corporação começam a sumir, o mistério de Mundo por um Fio está instaurado. A trama do filme consiste na busca do cientista e coordenador Stiller em descobrir o que está por trás da morte de Henri Vollmer, então chefe do setor na empresa (talvez presidente). Stiller passa a desconfiar de parceiros de trabalho, de trocas entre os mundos real e fictício e de sabotagens para eliminar quem saiba demais sobre o projeto do Simulacron.
O filme antecipa muitas questões que nos remetem a filmes bem famosos que viriam na posteridade, como Matrix, A Origem, Eu, Robô, também fazendo paralelo com a história do clássico 1984 e tantos outros. Sobre a programação desenvolver sentimentos. Sobre a possibilidade de exclusões e limpeza da memória. Eliminar indivíduos e ainda fazer com que as pessoas que acreditassem na existência desse indivíduo pareçam loucas, facilitando também suas próximas eliminações. A convivência de mundos paralelos em que se necessitam conectores para adentrar o outro universo também é tema, por exemplo, do então campeão de gastos na época em que foi lançado, Avatar. É interessante apontar que os orçamentos de Fassbinder e sua equipe eram baixos, produções simples que apostavam nos diálogos e nos sutis jogos de câmera para prevalecer no lançamento de filmes memoráveis e ainda válidos mesmo passado meio século.
Em O Mundo por um Fio a ideia de jogos de espelhos é estupenda. A direção orienta diálogos em que o emissor apareça em primeiro plano, mas o receptor esteja aparecendo para o espectador pelo reflexo de espelhos. Além do mais o filme ainda mexe com a ideia do duplo, trazendo traços dostoieviskanos para trama. Quem é o verdadeiro e quem é o simulacro? Quem é o original e quem é a cópia? Quem é clone de quem? Quem está blefando e quem está realmente apoiando nosso pobre herói Stiller?
Enfim, o jogo de espelhos é fantástico. Um jogo de cena que, mesmo sem toda a carga de significação já seria por si só genial, mas com a temática dos duplos e do mundo paralelo tornam o sublime. Apesar de que as mais de 3h30min da produção de O Mundo por um Fio (originalmente como série para televisão pelo que consta) possam suscitar diversas teses e pelo menos 10 mil (para referência ao número) possibilidades de prosseguir esse texto, deixo aqui por encerrado.
Nota final ⭐⭐⭐⭐⭐
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