17/02/2022

Melhor por escrito

Acho que gosto de escrever também porque, oralmente, nunca gostei de ser interrompido. Pavor de começar a falar e ter de repetir ou começar de novo por interrupções ou porque os outros julgam ter coisas mais importantes para fazer. Assim também sempre detestei terminar algum causo, alguma história e notar o semblante decepcionado ou pouco animado (ou pouco atormentado, dependendo o efeito desejado), indiferente, semblante de pouca relevância ao recém ouvido por meus interlocutores. Dessa maneira, a escrita me parece uma forma mais indireta para tratar com as coisas, mesmo as do cotidiano. Você que está lendo essa divulgação que em seguida irei publicar, não sei se você está interessado ou desinteressado. Não sei se está gostando ou não está. A escrita, em cartas, em blogs, em textos publicados fica assim, mais impessoal. Não sei a reação de quem está do outro lado do texto. Não sei a reação de vocês.

Outra questão muito mais abordada por nós tímidos, por nós antigos ou nós desconfiados, é o poder seletivo, na escolha de palavras para compor um texto escrito, diferente do discurso falado. Também aproveito para confessar que muitas vezes apenas cuspo meus textos, sem um planejamento prévio, sem uma organização anteposta das ideias. É tudo mais interposto. Sendo construído, literalmente, ao gerúndio.

E muitas vezes não gosto de planejar minhas caminhadas, ou ao menos gosto de mudá-las a gosto, à escolha da hora. Várias são as situações da vida que encaro e procuro resolver dessa forma. Acredito na força dos improvisos, creio na variedade, na fuga das mesmices e engessamentos que todos enfrentamos. Me senti a própria Martha Medeiros ao percorrer essas últimas linhas. No disparo improvisado, obviamente. É que também confesso ter lido materiais, livro dela. São coisas da vida, como o nome da obra sugere.

De minha parte, a escolha das palavras certas quase sempre não é problema. Procuro formular essa teia elaborada com precisão. Agora o efeito que causará no interlocutor, se causará indiferença, decepção ou até irritabilidade, prefiro deixar para o trabalho escrito, porque frente a frente, ao vivo, sobre um palco onde ouvem-se vaias, ou até a internet, palco de feedbacks muitas vezes maldosos, prefiro evitar de absorver. No cotidiano, no trabalho, em atendimentos feitos ou recebidos, onde a possibilidade de nos atrapalharmos e ouvirmos queixas é grande, a crítica negativa faz-me mal. Pelos meus escritos também, e é por isso que prefiro manter certa cautela, certa distância, certa ponderação e preocupação. Seleciono melhor meu público leitor e para quem conto um conto, como pergunta uma canção da banda uruguaia La Vela Puerca.

Ainda não cheguei à (agradável?) idade de não me importar com as críticas e me desligar mais do que pensem. Enquanto isso, procuro interligar e agradar. Espero um dia chegar mais no que vendem ser a arte sutil ou não de arremessar o dane-se. Mas não pretendo ler o livro esse. Enquanto isso, permaneço seletivo.

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