20/04/2018

salas

Era um cenário completamente diferente. Um prédio enorme, do tamanho de um quarteirão. Interno em dois ou três andares. Salas, salas e mais salas. Escadas de uns 20 em 20 metros. Subir ou descer. Saguão, corredores com trânsito. Era a escola técnica federal. Estava de volta a ela.

Numa sala do segundo andar, me reúno com meus colegas Looney Tunes, questionados sobre perguntas sobre História. Ninguém presta muita atenção na aula e um encapuzado, que descubro ser eu, responde uma errada de gozação. Após um rápido giro por outros participantes, ele (eu) ganha(o) nova chance de responder. Novamente tenta, agora um pouco mais sério. O professor informa que, se errasse, seria retirado da sala para uma detenção. Dá-se um suspense se a resposta foi correta. E, na cena seguinte, já estou de pé, acompanhado pelo professor que praticamente me puxa e carrega pelo colarinho da camisa. Levo minha mochila e um dos braços, saio da sala e sou encaminhado por superiores para a sala dos pequenos infratores.

O prédio tem amplo movimento e a sala da detenção tem um determinado público, quase ou até tão grande quanto a minha sala de aula anterior. As carteiras, a disposição das mesas não dá muito espaço entre um sujeito e outro. Entro e me acomodo. Apesar de tratar-se de pequenos infratores, não parecem exaltados ou dispostos a mais algazarras, apenas agem naturalmente, como uma sala como outra qualquer. A professora começa a falar sobre a atualidade do futebol. Percebo que estamos no ano de 2007. Ciente de que vim do futuro, me arrisco a brincar de profeta.

Lamento os percorridos anos de jejum pelo Grêmio. Uma tristeza chega a me invadir, mas sei que em 2016, em 2017, tudo está para melhor e esse período há de ter passado. Quase me belisco para garantir que passou mesmo. Mas, em 2007, ao questionar quem seria o campeão brasileiro, quem os alunos acham que seria, eu respondo, ao recordar, que o São Paulo é o campeão.

Ao meu lado, um corintiano fica brabo, me encara e parece querer ampliar suas infrações, dessa vez contra minha integridade física. Já outros levantam o braço quando pergunto se há são-paulinos no recinto. Esses vão ter um bom 2007. A bem da verdade, 2007 foi um dos melhores anos de minha vida. O Grêmio ia bem mesmo dentro da seca e o período escolar foi satisfatório, ouvindo piadas em rádio e recontando aos colegas como se fossem minhas ou eles não sabendo qual a fonte que eu bebia. Eu ia embora tarde na escola e tinha tempo para distribuir essas bobajadas.

Na escola técnica, soa um alarme de intervalo. Eu havia distribuído mais algumas verdades referentes aos acontecimentos de 2007, num sentimento máximo, supremo, sultão de conhecedor vindo do futuro. Chego a me anunciar como futurista, sabendo de tudo que está para acontecer a esses meros atrasados no tempo. Uma sensação que me fez experimentar uma retrospectiva do que propus e fiz na década anterior. Realmente é pouco, mas, durante o presente, muitas vezes é o que cabe ao orçamento, ao espaço de tempos e oportunidades e joga-se com isso, lamentando-se ou não mais tarde. Lamenta-se mais o que não é feito, isto é fato.

Pelos corredores, transito como um fantasma, sem ser reconhecido e ao mesmo tempo conhecendo aqueles setores. É muito semelhante ao prédio da escola técnica onde habitei um ano, mas mais tardiamente do que 2007, pelos meados de 2010. Os corredores, as conversas de jovens em pequenos grupos, alguns aproveitando o intervalo para comer e outros para papear. Estou solitário, subo e desço escadas, algumas inimagináveis, como se Alice tivesse desembocado ali um pedaço do país das maravilhas. Escadas caracóis, degraus circulares ou que exigem saltos quase acrobáticos, mas tudo enfrento, mesmo me arrastando de vontade e com a mente a trabalhar mais do que o corpo. Enfim, uma coordenadora, uma organizadora do corredor com aspecto disso mesmo, grita que está soando o oitavo sinal, ou seja, o da volta do intervalo. Calculo eu que cada sinal deva ser somado desde o da entrada no turno. O da ida ao intervalo seria então o sétimo e o do regresso, respectivamente, o oitavo.

Volto à aula, ou voltaria, se eu soubesse onde é minha sala. Não sei se pego minhas coisas na detenção e regresso para outra atividade na sala anterior. Por ora, encontro minha sala de início, onde respondi erradamente às perguntas da História, mas aí desencontro de memória a sala da detenção, onde deixei objetos. Depois, parece-me que atinjo o objetivo de encontrar a sala da detenção, mas deixo escapar a antiga e próxima sala de aula. Um enigma impressionante e desafiador.

Encontro uma antiga fantasmagórica figura. Ela mais real do que eu. Caminham ela e sua prima, prima da qual realmente fui colega naquela suposta instituição. Prima que não me interessava, interessava era ela. E caminho envergonhado, sem saber se estou sendo notado. Sem saber se estou sequer sendo visto e desejando talvez não estar, talvez estar. Estar confuso, pelo mínimo, eu estava.

Encontro a suposta sala de prosseguimento das atividades, estando a sala ao lado da ligação com uma bela escada com detalhes em mármore em concretada em degraus com alternância de pisos pretos e brancos, uma pitoresca introdução arquitetônica. Fico parado como se fosse um porteiro a tentar reconhecer mais pessoas e a indicar que se tratava dali mesmo a sala em questão.

Reconheço Estevan e Wagner. Esses eu fui conhecer na faculdade, o que faziam ali? Se bem que ainda na detenção, Bruno Ladeira aparecia como a um anjo de presença exclusiva a me aconselhar se eu deveria parar ou seguir as narrativas que os atrasados do ano 2007 ainda desconheciam. Ainda vagueio mais um pouco por ali. Vi ao Pedro que me pergunta o que estou fazendo com somente um tênis nos pés e quando me dou por conta que no outro estou só de meia, respondo que minhas coisas ficaram em uma sala que não sei identificar.

Assim, sem saber identificar as duas salas ao mesmo tempo e ao mesmo tempo sem saber o que tudo aquilo significava, fiz minha volta ao ensino técnico sul rio-grandense.

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