Tudo começa em um ambiente de bar onde me encontrava alcoolizado. Outras pessoas estão por lá e me retiro rapidamente para ir ao banheiro, enquanto ninguém se importa, pois estão todos bêbados. Não encontro exatamente um banheiro como desfecho, mas somente uma calha no chão que vem bem a calhar, no pátio. Urino por ali mesmo, me perguntando se era o melhor lugar possível e, se caso viesse outra pessoa para o mesmo local, se eu seria xingado por tal ato. A situação passa, mas no dia seguinte estou sendo perseguido.
Estou em um pátio interno de um grande, imenso prédio. Um prédio antigo que me cerca, com o comprimento de uma quadra inteira de largura. Sou perseguido pelo que se assemelha a uma gangue e preciso correr, apenas sei disso. Estarei frito. Começo a correr e logo a pular para subir até o alto de umas telhas. O cenário se parece com o histórico e centenário colégio Gonzaga. Olho para trás e ainda estou seguido. São muitos. Não zumbis, mas uma gangue inteira, um deles bastante alto e bem próximo. Dos telhados, escalo uma grade branca de um portão. Chego a pensar se sou capaz, mas consigo, sabendo que obviamente meu perseguidor há de conseguir. Ele segue no meu encalço pelos telhados e salto de uma grande altura rumo ao concreto, mas aterrisso bem, até me dando ao luxo de virar-me de costas e ver a que distância ele está de mim.
Como ele é maior, suas passadas são mais largas e sei que não vou fugir para sempre. Chego a planejar um enfrentamento corpo a corpo, mas não tenho chances por seu tamanho, apesar do instinto vívido. Além disso, quando ficamos frente a frente como lutadores a esperar o golpe, surgem outros da gangue e meu destino é selado. Corria comigo meu amigo Gustavo, que também é capturado. Quando me dominam de vez, colocam-se um saco, algo de pano que cobre minha vista.
Só retomo o poder de averiguar quando estou em uma condução completamente escura e cercada pela gangue nos assentos em volta. É menor que um ônibus, mas me parece maior que uma kombi ou van. Os caras nos dirigem olhares como "o que vamos fazer com vocês?", mas o chefe maior ali não parece incomodado e logo nos revela o plano de nos anexar ao trabalho da gangue. A condução completamente escura segue por um asfalto que seria da avenida Bento Gonçalves. Noto momentos como se estivéssemos na contramão e outros em que parecem outros veículos como os irregulares no sentido. Tudo isso baseado na maioria dos veículos que seguem. Parece uma avenida de três pistas, duas para ir e uma para vir.
Para agradar minha surpresa, há mulheres na condução, provavelmente as que desejam estar com o poder da gangue, drogas fáceis ou mesmo admirem os caras. A mais bela está a meu lado quando revela que "não posso ficar com você, não nessa condição de recém capturado". "E é só por isso?", eu lhe devolvo em sorrisos. Ela apoia sua mão sobre a minha e repito o gesto, algo bastante sutil e discreto, para não despertar suspeitas dos demais. Me pergunto, nisso tudo, quem está conduzindo a van grande ou micronibus.
Chegamos finalmente pela sequência no asfalto no que ainda parece uma rua bastante central, com um centro comercial enorme e também do tamanho de uma quadra. Todos descem na parada e tomam seus postos. A rua é fechada em uma quadra com cavaletes, o terreno é todo da gangue, da boca, eles mandam no espaço. Vigiam, se divertem, demonstram seu poder em frente ao colossal empreendimento. As garotas acompanham, não vejo mais a que estava ao meu lado. Ela tinha as maçãs do rosto bastante saltadas, uma franja, cabelos castanhos, olhos grandes. Uma Mia Sara nessa delicada situação em que eu era prisioneiro e começava a ter a confiança do chefe do esquema.
Em frente ao estabelecimento, uma mesa inteira repleta por uma grande torta, um grande bolo branco com merengue e confetes em cima. Dá vontade de servir-me, assim como meu amigo Gustavo, que agora era Igor, teve a ideia de ir até ali e, mesmo na condição de recém capturado, saciar sua fome com alguns dos demais. Fico mais pela calçada da frente, a escuridão nas ruas e meu estado ainda estupefato por vivenciar tudo aquilo. Não avisei em nada meus pais, não sabem onde estou, nem eu direito sei. Devo trabalhar para eles, servir essa quase seita, essa movimentação que lida com ilícitos, possui muitos menores de idade, mas que não é combatida, mesmo estando esparramada pelas calçadas e o meio da rua.
De momento, está parada ao meu lado Pâmela. A reconheço pelo cabelo e a pinta no rosto. Estranho vê-la ali. Estaria eu em Pelotas ou Porto Alegre? Mas ela confirma rapidamente que está de passada por ali. Não recordo meu diálogo com ela, mas poucas frases depois desaparece e, após eu olhar para frente, para voltar o olhar ao lado no meio fio, ela e um amiga já não se encontravam mais ali. Comento com um garotinho que fui deixado falando sozinho, já agora me direcionando a ele. Impressionante como não deixei de lado a postura de demonstrar fraquezas sociais, quando deveria manter uma postura de seriedade e devoção a tudo aquilo. Eu poderia ser expulso por não satisfazê-los a qualquer momento. A gangue, composta em sua maioria por mais pobres e por mal encarados, me olhava estranho. Talvez também por suspeitar da ação com uma das meninas, sendo eu um mero recruta de início.
Em outro momento, me sinto sozinho e deslocado, mas falo com uma mulher mais velha. A um soar rápido como o de uma sirene, antes que eu possa entender, vários se deslocam da calçada e vão ao meio da rua para dançar em pares. Aproveito a desconhecida presença dela e formamos um par, no que parecia obrigação a todos os presentes ali na frente. Tão rápido como ela surgiu, em alguns giros da coreografia improvisada, vira-se para mim um garoto mais novo, um gordinho que me surpreende por estar, do nada, dançando comigo. Explico a situação que poderia constranger-nos, mas ele leva como se fosse algo comum a acontecer na seita.
O fim da missão é em outro toque, quando todos voltam em fila para dentro e conheço os aposentos, em uma estreita fila que segue junto à parede de entrada pela direita da porta. Um a um as pessoas adentram para o salão central, um saguão enorme, com catracas para confirmar as entradas e duas mesas, uma em forma de retângulo, que contorna todo o perímetro do salão e uma comprida mesa central. Estou escalado, pelo ingresso que me deram e pela catraca que passo, a comer na mesa central. Sento próximo à cabeceira, com medo de alimentar ódio dos demais membros há mais tempo, por estar, provavelmente, muito próximo de onde o chefe vai sentar. Antes de esperar a refeição, acabo acordando da estranha história.
20/07/2017
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