Não sei o que escrevo. Minha obra - ah, que chique - era composta somente das músicas que eu compunha desde os 12 para 13 anos. Hoje são centenas. Depois parei de musicar algumas e dava ênfase à poesia. Tenho trabalhos da faculdade para fazer enquanto aqui estou. Eles me enfadam. O academicismo me enfada. A obrigação de produzir o que já produziram, de fazer o que os demais já fizeram. Não quero. Priorizo o inédito de quase todas as maneiras. Às vezes, por convenção social, seria melhor imitar os outros, seja pelas maneiras como esperam que você aja, seja pela repetição do que efetivamente dá certo. Mas mesmo assim me complico. Me sinto farsante em quase qualquer obra que colho como ideia alheia. Gosto como particularmente enxergo as coisas ao redor.
Após as diversas músicas, nos variados gêneros musicais, do pop rock ao rap, após as poesias de versos mais para curtos do que compridos, tive contato com as crônicas para relatar episódios da minha vida. Creio que já vinha desenvolvendo isso desde a adolescência, mas a experiência, a releitura inspiram. Para não me contradizer do primeiro parágrafo, são inspirações, não cópias, como o academicismo muitas vezes sugere. As mais diversas críticas à universidade nesse sentido são válidas. Queremos trabalhos inovadores, mas devemos nos basear inteiramente nos antigos. Para muitos é assim. O que é necessário é caminhar. Claro, sempre em vista a comprovação e a aplicação. A expansão efetiva do conhecimento.
Avancei para o gênero das crônicas com aquilo que me entalaria a garganta, com o que me machucaria aos percalços do dia a dia, com as inquietações mundanas, com as observações dos mais heterogêneos personagens que nos cruzam o caminho. A facilidade de seu formato incerto, em que posso escrever ao gosto que aparece e, ao terminar, poder chamar de crônica, sem que critiquem com isto é ou não é uma crônica. É um reduto, uma fortaleza poderosa. A sua suavidade que cabe em página ou duas, não mais do que três. O formato da crônica instiga, flui, me carrega às entranhas das ideias, às distâncias do mundo, ao contato dos outros, mesmo quando me fecho ao mundo externo.
Finalmente, o formato dos contos serviram imediatamente para o espaço do imaginário, as narrativas mesmo curtas, mas com potenciais de expansão. Quantas delas serviriam para livros, para filmes? Algumas, sim, não tenho dúvida quanto a isso, bastaria a boa vontade de expandi-las, mencionando aqui como se fácil fosse. Não é fácil, existe uma atenção mais minuciosa, um cuidado tanto maior com a escrita, porque apontar os erros alheios sempre é fácil. Na verdade, na minha autocrítica encontro muitos erros, mas a preguiça de corrigi-los me impede um resultado, digamos, mais satisfatório. Portanto, me atento aos modelos reduzidos dessas linguagens referidas, me atenho, me confino aos poemas, às músicas que um dia serão ou não gravadas, às crônicas e aos contos.
Um romance de maior fôlego exigiria tempo, que hoje não desfruto, enquanto estudante de letras - dos academicismos que por tantas vezes me enfadam - e escritor diário do jornal Diário da Manhã, e narrador de todos os santos jogos do Brasil (de Pelotas) na Série B do Campeonato Nacional. Ademais, mantenho uma rotina de leituras e visualizações de filmes para colher algumas rosas ou ao menos pétalas e sépalas nas variantes das histórias.
Não sei o que escrevo, mas permaneço atento, descritivo, trazendo detalhes, parâmetros de comparações quase sempre desnecessárias, situações geopolíticas e atuais, comparações e espelhamentos de obras produzidas com nada a ver uma e outra. Acredito que os laços entre obras distintas seja mais válido do que as obviedades dos que claramente foram inspirados uns pelos outros. Ou seja, mais me interessa juntar algo muito distante no tempo ou nos fatores culturais, observando suas semelhanças e comportamentos diferentes, do que comparar obras próximas, em que qualquer sujeito teria a capacidade de enxergar tamanha nitidez. Embora, a nitidez nem sempre esteja nítida a tantos olhares turvos, mas aí...
Não sei o que escrevo, mas escrevo aqui durante um domingo ensolarado que antecede ao feriado de finados, o mais grave da história brasileira pela imensa pandemia de covid-19. Quantos disso se foram? e, na minha vida, tantos outros se foram em 2020 por outras causas e motivos. Circunstâncias. Não sei o que escrevo, mas escrevo aqui ao som do vizinho, apelidado por nós de Dênis, o Pimentinha, um berrão de não sei qual idade, às vezes meu pensamento avança para que ele já tenha mais de 10 anos e tome rédeas ou tomem rédeas de seu próprio incerto comportamento. Outras vezes o acho tão infantil e pequeno que parece não ter mais do que cinco ou seis anos. Está em algo intermediário entre essas impressões. Dênis está saltando na piscina, embora não esteja tão calor ainda. Quando estiver estará apimentado o bastante para que eu deseje meu próximo endereço o quanto antes, embora durante a longa temporada de inverno me senti plenamente acostumado e ambientado nessa troca de casa.
Escrevo enquanto poderia fazer outras coisas, quase nada preocupado com o alcance do público - agora. Futuramente, talvez. Talvez por questões de renda. Talvez por limitações empregatícias. Talvez. Talvez um dia eu também melhor saiba o que, para quem e com qual objetivo escreva. Até lá...
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