25/10/2020

Aos gremistas que lá do céu cantam comigo

Escrevemos sobre tantas pessoas de tantos lugares. Sobre escritos e escritores que nunca nos viram. Portanto, me senti na obrigação de relatar uma homenagem ao amigo que nos deixou na última semana, o Roger Schneid. Mesmo ele não nos sendo exatamente próximo, talvez tenha sido o amigo mais cerca, sem contar parente, a nos deixar. Fomos surpreendidos pela ida por sua pouca idade e pela fatalidade de como ocorreu o episódio, segundo constam.

Há poucos dias eu lembrava o futsal que jogamos juntos por alguns anos. Roger gostou de minhas atuações logo na primeira partida em que nos conhecemos. Não sei que tanto ele tenha gostado, mas eu ficava feliz de assim o ser. Relembrei dias antes de seu falecimento como eu pegava a bola para a reposição do goleiro de futsal com as mãos e Roger sempre encostava na área, próximo ao escanteio (a quadra era estreita) e pedia bola para ele, para começar a jogada. Ele sempre recebia pela lateral da área, trazia a bola para o meio e arriscava um lançamento, entre sucessos e insucessos. O lance muito se repetia.

Conheci Roger, na verdade, em viagens com a Geral do Grêmio em Pelotas. Ele era um membro ativo da torcida, conhecido pelos demais cupinchas, frequentador assíduo do estádio Olímpico Monumental, este que nos deixou em 2012 para 2013, na substituição pela magistral Arena, entre bairro Humaitá e vila Farrapos - quase Canoas - dizem os colorados invejosos.

Roger passou por alguns momentos ruins com as drogas, reencontrei-o em 2016, justamente nas datas finais da Copa do Brasil, quando o nosso Grêmio rompeu o jejum de títulos grandes que já perdurava os incômodos - talvez impossíveis - 15 anos. Mas a conquista daquela copa marcou o capítulo importante de nossas vidas, inclusive com registros fotográficos para a posteridade. Pensava que Roger estaria em Porto Alegre para comemorar o feito tricolor, que tanto se aproximava após a abertura dos 3x1 fora de casa, no Mineirão, contra o Atlético Mineiro. Mas encontrei-o ali, bebemos e comemoramos juntos. Acredito que mais comemoramos do que bebemos naquela ocasião, na companhia de um tal xavante, João Gastal.

Roger também recebeu a homenagem por parte da torcida do Pelotas, outro clube que ele, mais local, frequentava. Além disso, jogava seguidamente em nossos ginásios com a camisa do maior da Argentina, o Boca Juniors. Se você acha que é o River Plate ou o Independiente, está errado. É o Boca Juniors. Mesmo eu não ocultando minha preferência pelo Racing de Avellaneda.

Apesar de nossa constante falta de assunto, ele arrumava alguma coisa para falar, xingar alguém ou levantar algum tom humorístico - mesmo que muitas vezes apenas ele achasse graça. Era bem quisto no círculo de amizades do Colégio Gonzaga, tinha sua afinidade com o reggae e cantores de rap, além de gostar dos nossos Engenheiros do Hawaii. Talvez tenha sido a referência para que um dia eu escutasse um cara que hoje está muito em alta, o tal do Emicida. Os olhos pequenos de Roger de certa forma me lembravam esse rapper.

Quando me aproximei de verter as ditas lágrimas com essa homenagem, com essas palavras, Roger, foi quando parei para pensar que não estarás mais conosco em futuras conquistas que o Grêmio venha a ter - e é bom que tenha, porque já está novamente difícil, sabes. Lembro uma história que ele contou, ou o amigo nosso Rodrigo, de São Lourenço do Sul, contou sobre um jogo do Grêmio em que Roger foi descer a avalanche e quase quebrou a perna. Teve que aguardar no concreto da arquibancada ao final do jogo e a viagem de volta para casa, com a perna aos frangalhos. Momentos de um gremismo alucinante nas românticas arquibancadas da hoje esquecida zona da Azenha. Mas inesquecível, sem dúvida.

Lembro uma festa no DC Eventos em que obviamente não combinamos nos encontrarmos, mas ele estava lá. Eu estava em um degrau que daria acesso à pista propriamente referida, enquanto tocava não sei qual música e a iluminação era sintonizada em tons rubros para rosados. Alguns casais se formavam. Roger tinha determinada lábia com as moças. Mas ele preferiu ficar ali na volta incomodando. "Olha o jeito que esse cara está com a guria, é um juvenil", xingava um que não conhecíamos. Eu achava daquilo um sentimento híbrido, entre o engraçado e o trágico, porque até o dito juvenil ali com alguém e eu sobrando naquele ambiente. E o cômico de Roger não procurar coisa melhor para fazer do que xingar o cidadão desconhecido. Mas este era ele.

Sentiremos falta. Seja de alguma postagem inesperada na internet, ele que pouco usava o Twitter. Seja dos jogos do Grêmio, seja de algum reencontro pela noite na cidade, entre Bar do Zé, frente e quadras ao lado da Universidade Católica, seja alguma festa não marcada entre nós. Não estará lá, mas existirá a lembrança. Roger ressignifica para mim a música aos gremistas que lá do céu cantam comigo. Vá em paz, bruxo. Por ela lutasse e que agora atinjas.

Roger na final da Copa do Brasil 2016
Lembrança dele feliz pelo Grêmio

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