Definitivamente trarei más notícias. Enquanto isso, meu disco preferido do Blur toca ao fundo. É o que mais ouvi nesse período de isolamento social / quarentena. Obrigado, Damon Albarn. Fico pensando na precisão que os escritores precisavam demonstrar à frente das antigas máquinas de escrever. Clareza e coesão nas ideias a serem desenvolvidas e acertos das mãos às teclas. Cirurgiões. Antes deles, o tremendo esforço de molhar a pena nos tinteiros de séculos passados.
Enquanto a música Coffee and TV fala em casar e recomeçar, penso nos afazeres que preciso desenvolver nessa folga dominical do jornal que escrevo. Estamos sem edições de segunda-feira por conta da pandemia, então reiniciamos as notícias do extremo sul para as manhãs pelotenses de terça-feira. Apesar disso, hoje é o último dia de prazo para gravar um vídeo para meu amigo que aniversaria. É uma pressão grande estar diante de uma câmera de baixa resolução falando sobre os anos em que nos acompanhamos, tentando passar uma mensagem o mais bonita e sensível possível e, se não for pedir demais, também engraçada. Uma responsabilidade tremenda que adiei durante a semana até o dia de hoje. Espero que posicionar esse fato nessas linhas me ajude a corresponder com o compromisso.
Agora começa a tocar a música Parklife sobre a monotonia da vida e o sedentarismo. Este último que deve, ou deveria, ser maior na Inglaterra do que aqui. Li uma manchete de que o Reino Unido se prepara para a segunda onda de contágios do novo coronavírus. É o país europeu que registrou mais mortes até o momento, com mais de 45 mil. Proporcionalmente também superior à média brasileira até aqui. O número de idosos lá deve contar bastante para essa alta estatística.
Estou enrolando com outros acontecimentos a tristeza de que estou com um primo internado em UTI em Santa Catarina. Ele tinha problemas crônicos, me parece que bronquite, o que lhe caracteriza como grupo de risco para a maldita pandemia. Penso em sua agonia, sem acompanhamento de parentes no hospital, em alas isoladas pela segurança e tentativa de redução de contágios. Ele fez o teste pela doença e aguarda o resultado. O irmão dele já foi em deslocamento para o hospital, mas mesmo assim não pode ficar ao pé da cama. As situações hospitalares já eram agoniantes, mas tudo pode piorar.
Pensei isso sobre suicídio esses dias. Minha irmã, com seus contatos de mediunidade, me afirma que suicidar traz malefícios incontáveis para a alma, consequências pesadas. Não sei direito sobre isso, penso que o mundo aqui em cima é muito ruim por tudo que relato nesses anos todos, mas claro que podemos, a partir disso, imaginar pelo menos 100 situações de como poderia ser pior. Você não consegue? Obviamente que consegue. Sempre pode ser pior.
A presidência. A ausência de governo, a ausência de ministros, o crescimento de casos, o crescimento de mortes. A corrupção. O desfragmento das esquerdas que novamente serão derrotadas irremediavelmente enquanto mantiverem essas posturas. Os gafanhotos que fugiram de nosso frio e de nossas chuvas. O frio e as chuvas que castigaram ainda mais a pobreza deste país. Os números distorcidos de desempregados, enquanto a informalidade é a realidade do país, com sub-empregos, com pouca garantia, com salários menores do que o salário mínimo para sustento de famílias inteiras. Com auxílios negados ou fraudados ou insuficientes ou volte novamente amanhã, porque por hoje encerramos e não nos interessa o seu pão. A dificuldade das compras, o risco aos funcionários, nas ruas, nos caixas, no transporte público, nas feiras, na manga, na beterraba, no mamão. As máscaras que cobrem meio rosto. As máscaras que cobrem rostos inteiros.
Assisti ontem ao filme Persona, de Ingmar Bergman. Péssima tradução brasileira para "Quando duas Mulheres Pecam", como um comentou no site Filmow, é uma tradução preconceituosa e até lesbofóbica. É uma das grandes obras do sueco Bergman, creio que valha a pena assistir mais de uma vez, para ver onde as personagens de fato se fundem, procurar, teorizar, tentar descobrir onde está a fantasia e onde está a realidade. E onde está a nossa realidade nisso tudo, nesse mundo de máscaras. "Personas", termo das tragédias gregas.
Após a onda de frio, estamos com o calor úmido, que deve ser trágico para rinites e sinusites. Piadas de que são coriza, espirros e inchaços e olhos vermelhos dessas doenças crônicas, não por causa da covid-19. Está tudo junto e somado. Atravessamos no final de julho e para o início de agosto o pior período para combater o novo coronavírus. Leitos em lotação pelo estado e o aumento diário no número de mortes.
Estou lendo As Vantagens de Ser Invisível. Presente de uma amiga e que venceu Macunaíma, de Mário Andrade, na enquete de qual eu leria antes. É um best-seller adolescente dos Estados Unidos. Considerei bobo de início, mas há passagens que me fazem reflexivo e que contribuem para eu estar aqui neste momento. A retomada de situações, o encaixe das idades, as descobertas, o aprendizado contínuo, o como lidar. Como eu agiria em tal ocasião? Esta é uma pergunta que me permite contemplar melhor as obras, participar melhor com elas, entender melhor as personagens, concordando ou discordando, mas entendendo. Se não me enxergo diretamente na situação, penso em como seria estar ali por todo o contexto. Nem me aprofundo muito nessa questão em relação ao livro As Vantagens de Ser Invisível, mas é um exercício que costumo praticar.
O livro me fez lembrar que a primeira vez que vi os pré-adolescentes girarem a garrafa, preferi continuar treinando meus arremessos no basquete. Eram poucas gurias naquela turma, acho que houve um ou outro beijo quando brincaram disso. Mas o que eu penso sobre? Meu arremesso da linha do lance livre era o melhor entre os da minha idade. Isso me importava. Dessa vez sem arrependimentos, só recordações.
Quando será que isso tudo vai passar? O calor úmido, a pandemia que se aproxima e se mistura à história de nossas famílias, essa identificação inexata e surpresa com as obras literárias e do cinema. A escrita que pratico aqui nas folgas de jornal. Continuamos.
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