27/06/2018

As Amazonas

Não tinha jeito ruim a batalha, hoje, dia de São João. Dos bergantins, os homens de Francisco de Orellana estavam esvaziando de inimigos, com rajadas de arcabuz e de balestra, as brancas canoas
vindas da costa.


Mas aí, a bruxa deu as caras. Apareceram as mulheres guerreiras, tão belas e ferozes que eram um escândalo, e então as canoas cobriram o rio e os navios saíram correndo, rio acima, como porco-espinhos assustados, eriçados de flechas de proa à popa e até no mastro-mor.

As capitãs lutaram rindo. Se puseram à frente dos homens, fêmeas garbosas, e já não houve medo na aldeia de Conlapayara. Lutaram rindo e dançando e cantando,as tetas vibrantes ao ar,até que os espanhóis se perderam para lá da boca do rio Tapajós, exaustos de tanto esforço e assombro.
Tinham ouvido falar destas mulheres, e agora acreditam. Elas vivem ao sul,em senhorios sem homens, onde afogam os filhos que nascem varões. Quando o corpo pede, dão guerra às tribos da costa e conseguem prisioneiros. Os devolvem na manhã seguinte. Ao cabo de uma noite de amor, o que chegou rapaz regressa velho.


Orellana e seus soldados continuarão percorrendo o rio mais caudaloso do mundo e sairão ao mar sem piloto, nem bússola, nem carta de navegação.

Viajam nos bergantins que eles construíram ou inventaram a golpes de machado,em plena selva,fazendo pregos e bisagras com as ferraduras dos
cavalos mortos e soprando o carvão com botinas convertidas em foles. Deixam-se ir sem rumo pelo rio das Amazonas,costeando a selva,sem energias para o remo, e vão murmurando orações: rogam a Deus que sejam machos, por mais machos que possam ser, os próximos inimigos.


Eduardo Galeano
Os Nascimentos.

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