Esse filme encerra os episódios da vida de Antoine Doinel, personagem mais marcante na cinematografia do diretor francês François Truffaut. Com direito a várias passagens dos filmes anteriores, temos explicações e conclusões sobre a vida do polêmico e artífice personagem: sua relação com diferentes mulheres, sua dificuldade em manter relacionamentos e também conclusões importantes vindas dela sobre o homem em questão.
Em um acerto mágico de Truffaut, a carreira de cinema com o jovem Jean Leaud foi promissora. Estreando criança no filme traduzido ao português como Os Incompreendidos (1958), um dos pilares da formação da Nouvelle Vague francesa, a vida do personagem percorreu adolescência, início da fase adulta até a fase com mais de 30 anos, com aprisionamento em reformatório, perda da mãe que possuía amantes, namoros breves, casamento com a violonista do filme Domicilio Conjugal - o qual escrevi sobre neste blog - o divórcio, a criação do pequeno Alfonse, filho de Antoine e o relacionamento de surgimento um tanto stalker com a bela Sabine, loira personagem central n encerramento dessa trajetória em Love on the Run, ou Amor em Fuga.
Em sinopses, Antoine é apresentado como ainda adolescente, mesmo passados seus 30 e poucos anos. Não resiste ao charme das mulheres, também não sabe como se comportar adquiridos os relacionamentos e, pai divorciado, tem pequenas contribuições diante do crescimento do cabeludinho Alfonse.
Jean Leaud mantém seu humor surpreendente, em que a parceria com Truffaut nos põe em dúvida o que são ideias de piadas bobas de um ou de outro. Verdade que funcionam ao gosto deste escriba, que se sente mais familiarizado ao estilo drama-comédia das narrativas. Antoine atua por trocadilhos, literalidades, ironias passageiras. Seu estilo leve, jovial, interessado ao encontrá-las mantém os interesses das parelhas. Mas seu desenrolar passadas essas fases é insuficiente, resultando em separações, irritações, ansiedades mal resolvidas.
A adoração de Truffaut por seu personagem (alter ego de Truffaut, dizem, e faz total sentido pela riqueza de detalhes) lhe reserva um final satisfatório. Gera polêmica de considerarmos, de julgarmos o quanto merecia. Mas, aliás, o final seria um final? A loira Sabine conheceria o pequeno Alfonse? Que sequência o casal teria juntos? Ele, entre aspas, cresceria finalmente em companhia desta terceira? São questionamentos possíveis.
O filme tem o gosto agridoce da comédia-dramática, em meio a situações que não mais existem na contemporaneidade. Antoine trabalhando em uma gráfica, a troca de fax. Os telefonemas públicos, em cabines em locais ou mesmo na rua, como no Brasil seriam os orelhões em oposição ou semelhança a Paris. A facilidade para traições era maior? Possivelmente. Antoine que tem ações duplas, que salta para trens em movimento mesmo sem a passagem comprada. Antoine que escreve seus livros biográficos, fingindo, mesmo mentindo ser ficção. Que reconta sua vida, mas tem incapacidades às vezes por transformá-las às medidas que melhor se adequaria.
Antoine que agrada e desagrada. Agridoce. Assim, entre levezas, belezas e angústias de pontas soltas mal resolvidas está a vida de Antoine Doinel contada, mostrada pelas lentes dos filmes de François Truffaut.
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